O evento servirá para que o Brasil mostre que está pronto para ser um dos protagonistas mundiais em termos de produção sustentável de alimentos.
Oportunidade de criar contexto adequado
Assim como exerce a presidência rotativa do G20 durante 2024, assunto que foi abordado por este Portal recentemente, no ano que vem o país receberá a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre o Clima, em Belém do Pará. O evento servirá para que o Brasil mostre que está pronto para ser um dos protagonistas mundiais em termos de produção sustentável de alimentos, ocupando a vanguarda no uso de matrizes limpas e renováveis de energia, pesquisa científica e demais soluções da chamada economia verde. O setor agrícola, porém, anda apreensivo, pois teme que a cúpula seja usada como pretexto para que alas ambientalistas mais radicais ataquem publicamente o agronegócio, por meio de falácias há muito desmentidas.
O alarde da militância impede que o Agro divulgue com eficácia suas virtudes, muito embora elas sejam atestadas por fontes independentes e de prestígio. A própria Nasa já confirmou os dados da Embrapa, segundo os quais Brasil tem 66,3% de seu território preservado com vegetação nativa. E de todas as áreas protegidas, 25,6% estão dentro das propriedades rurais. O país também é o que mais utiliza o sistema de plantio direto, que não agride o solo, e adota em escala crescente a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF). A prática de ILPF possibilita até três safras numa mesma área e torna a atividade agrícola sequestradora de carbono, em vez de geradora de emissões.
Essa realidade ainda é desconhecida por vários países, o que dificulta a abertura de novos mercados e passa a impressão de que os principais concorrentes agrícolas brasileiros fazem mais pelo meio ambiente. Não poderia ser mais diferente: este Portal vem abordando como as exigências de nações europeias causam a indignação dos próprios produtores locais, mesmo quando lá as restrições postuladas são bem menores. Na prática, o que ocorre é uma forma de protecionismo disfarçada de preocupação ambiental, de modo a criar entraves para os produtos melhores e mais competitivos de outros lugares, como o Brasil.
Aqui, para efeitos de comparação, o percentual mínimo de preservação adotado desde o Código Florestal de 2012 é de 20%, podendo chegar a 80% na Amazônia legal. Enquanto isso, o lobby de ONGs brasileiras prega o boicote ao próprio país, afunilando o debate público para temas como queimadas, desmatamento e reservas indígenas, sem fornecer outros dados em contrapartida. Dessa forma, fica ainda mais difícil trabalhar novas áreas agricultáveis, especialmente no Cerrado, bioma que marcou a expansão produtiva nacional nas últimas décadas.
Daí a importância de não deixar o debate da COP 30 sofrer com a contaminação ideológica, sobretudo numa gestão federal que vem se mostrando cada vez mais simpática a demandas de movimentos sociais que pretendem reescrever leis sobre propriedade privada e reforma agrária, entre outras. Para isso, contam também com decisões favoráveis do Judiciário que flexibilizam até mesmo normas constitucionais, como a SNA mostrou recentemente.
Coalizão reativa para se contrapor aos detratores
Justamente para evitar a perda de foco e projeção exagerada e distorcida de assuntos alheios à cúpula, o deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania – SP), vice-presidente da FPA, propôs um pacto nacional entre governo, terceiro setor e iniciativa privada. Ele lançou a ideia durante o 23º Congresso Brasileiro do Agronegócio (CBA), que reuniu em São Paulo as principais lideranças políticas e empresariais do setor. “Não podemos ficar passivamente esperando uma demonstração pública de problemas. Temos que fazer uma demonstração vigorosa do que o Brasil tem de virtude”, disse ele na ocasião.
A preocupação com o enfoque enviesado a ser adotado na conferência de novembro do ano que vem é compartilhada pela senadora Tereza Cristina (PP – MS), que foi Ministra da Agricultura o governo Bolsonaro. Ela vem enfatizando, em pronunciamentos públicos, que tem conversado com representantes do setor agropecuário e de entidades como Embrapa e CNA, de modo a que todos colaborem para a pauta de discussões da COP 30. A senadora defende que as conversas precisam contemplar não somente a Amazônia, mas outros biomas, de modo a não reforçar estereótipos que encontram ecos no exterior.
Para ela, é importante conduzir os temas e mostrar o que o país tem compromisso com as novas diretrizes de produção, muito embora o atual governo venha privilegiando pautas ambientalistas, inclusive na última edição do evento, a COP 28, em Dubai. É muito comum escutar de empresários do setor que, uma vez conversando com potenciais compradores ou autoridades estrangeiras, descobrem que ONGs brasileiras já visitaram os mesmos interlocutores levando distorções e propaganda negativa. Segundo os gestores, é desanimador que sejam desacreditados por compatriotas.
Enquanto isso, problemas concretos como regularização fundiária e a necessidade de modernizar o licenciamento ambiental poderiam ser priorizados pelo Executivo, de modo a equiparar essas questões com a liderança tecnológica do setor, sem a imposição artificial de agendas ideológicas. Será preciso responder com mais firmeza, já que essa militância dificilmente irá desaparecer.
Marcelo Sá – jornalista/editor e produtor literário (MTb 13.9290) marcelosa@sna.agr.br