Por José Roberto Mendonça de Barros
No começo de marco escrevi um artigo intitulado “O agronegócio do lado do sol”. De lá para cá, só se confirmou a posição única do setor na economia brasileira. A agropecuária deverá crescer 3% neste ano, enquanto o PIB brasileiro deverá encolher algo entre 1,5% e 2%. Nossas projeções para 2016 sugerem mais um ano de PIB negativo e outro de crescimento da agropecuária, se o clima não atrapalhar. Teremos, portanto, uma situação absolutamente inusitada: de 2013 a 2016 a variação acumulada do PIB não será maior do que 1,3%, enquanto o crescimento da agropecuária será da ordem de 15%!
Como temos insistido nos últimos anos, tal resultado não depende apenas da farta disponibilidade de recursos naturais, mas é, antes de tudo, uma construção assentada na cooperação de empresários, trabalhadores, pesquisadores e políticas públicas bem desenhadas, que permitem um sistemático crescimento da produtividade e da competitividade.
Em trabalho recente, o economista Claudio Frischtak calculou que entre 1995 e 2009/2010 a produtividade da agropecuária cresceu 20,6%, a da indústria de transformação 2,2%, a da construção civil caiu 17% e a de comércio e serviços (um setor reconhecidamente heterogêneo), também se reduziu em 22%.
E ainda há economistas que pedem a taxação de produtos agrícolas na exportação para melhorar o desempenho da economia brasileira!
Apesar deste sucesso, é indispensável continuar avançando, pois o mundo não para. Com a ajuda de meu filho, Alexandre Mendonça de Barros, imaginamos que o setor deveria construir uma agenda estratégica dividida em pelo menos quatro áreas:
1) Avanços necessários numa agenda velha:
Existe uma lista de coisas amplamente conhecida, mas que não se resolve colocando custos e impedindo o progresso do setor. Essa agenda inclui a precariedade da infraestrutura de transportes e portuária; a precariedade e a falta de recursos para uma eficiente defesa sanitária; a limitação e modéstia de nossos esforços em negociações comerciais e de abertura de mercados; o enfrentamento da oposição ideológica e, por vezes, totalmente ignorantes (como no caso da destruição de centros de pesquisa) frente ao avanço da ciência no desenvolvimento de organismos geneticamente modificados; a demora excessiva dos órgãos públicos na análise e liberação de novas tecnologias; as dificuldades e lentidão na implantação do cadastro Rural (CAR) e do Código Florestal.
2) Desafio estratégico 1:
Avanços tecnológicos no sistema de produção: a agricultura de precisão é o item mais relevante a ser considerado. Essa denominação abarca um conjunto de técnicas que estão em constante desenvolvimento na área de pesquisa, mas que já são utilizadas por um número crescente de agricultores. O resultado é uma elevação expressiva da produtividade.
Essas técnicas incluem: análise detalhada de solo que permite aplicação de fertilizantes e corretivos a taxas variadas. Também o plantio se faz de acordo com o potencial produtivo de cada área, tanto quanto acompanhamento e mapeamento de pragas e doenças, que permitem a aplicação localizada de defensivos agrícolas.
Todas essas tecnologias, em conjunto, resultam em substancial redução de custos com materiais. A colheita se faz com máquinas equipadas com sensores de produtividade que produzem informações on line. O resultado é sempre notável.
Sistemas integrados também são crescentemente utilizados na pecuária de corte e de leite, o que permite tratamento individualizado, animal a animal, com efeito sobre a produtividade e rentabilidade.
É estratégica a continuidade do desenvolvimento da integração de sistemas produtivos (agricultura, pecuária e florestas), que têm permitido duas ou três safras na mesma área. Também nessa área estão evoluindo sistemas de rastreabilidade e novos instrumentos de gestão, que permitem melhorar a qualidade e o resultado da produção.
É uma verdadeira revolução num setor que já é vencedor.
3) Desafio estratégico 2:
Existe uma gama enorme de novos produtos que deveriam ser mais desenvolvidos de forma a criar uma integração maior com a indústria. Falo aqui de biocombustíveis de novas gerações, da alcoolquímica (especialmente na linha de plásticos biodegradáveis), da nano celulose e de alimentos nutracêuticos.
Além disso, é indispensável mais atenção em investimentos na gestão da água, na elevação dos serviços ambientais e em novas linhas de sustentabilidade da produção.
4) Desafio estratégico 3:
Ao lado do desenvolvimento de novos produtos industriais, acima mencionados, é indispensável que na pauta de exportações tenhamos mais produtos industrializados que matérias primas. Parte disso acontecerá por meio da elevação da venda de carnes, a expensas de grãos, o que deverá ocorrer especialmente com a China.
Haverá também a venda de produtos de melhor qualidade, como o café verde de origem controlada, como ocorre com muitos produtos europeus, de vinhos a outros alimentos. A denominação de origem do Café do Cerrado foi aceita pelo INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial e lançada oficialmente na maior feira de cafés especiais do mundo, a da Associação Americana de Cafés Especiais, que aconteceu em Seattle, em abril passado.
Entretanto, o desafio maior é o de produzir e exportar produtos tecnicamente mais avançados e diferentes do passado. Existe uma revolução em cursos pelo crescente consumo de produtos em cápsulas e sachês, expansão facilitada pelo vencimento de patentes e barateamento das máquinas.
Para se ter uma ideia da agregação de valor, um quilo do produto torrado e moído no varejo custa R$ 15,00, enquanto o equivalente em cápsulas vale R$ 250,00. Duas fábricas estão sendo construídas em Montes Claros, MG, por grandes grupos internacionais, o que permitirá a produção em larga escala e a exportação do produto.
Outra operação fabril em Ribeirão Preto, SP, produz cápsulas em séries pequenas, que permite que mais de 60 empresas disputem o mercado brasileiro. Outros grandes investimentos e associações estão em curso no setor (agradeço Nathan Herszkowicz pelas informações aqui expostas).
Esse tema merece ser mais desenvolvido em outro momento, mas parte da exportação de matérias-primas será trocada por produtos de maior valor, após passar por processos industriais.
A cadeia do agronegócio continuará a crescer.
Fonte: O Estado de S. Paulo