A companhia sucroenergética UISA, localizada em Nova Olímpia (MT), vai gerar créditos de carbono de suas áreas de vegetação natural que estão dentro de suas reservas legais (RL) e das áreas de preservação permanente (APP), na primeira operação de créditos de carbono relacionados à preservação florestal (REDD+) emitidos pelo setor de cana-de-açúcar no País. Apesar de se tratarem de áreas que a companhia já é obrigada a proteger, a UISA entende que existe demanda para dar “mais uma garantia” de proteção a essas áreas.
Os créditos serão gerados a partir de 20.900 hectares de áreas preservadas distribuídas em cinco fazendas da companhia. O projeto de contabilização e comercialização dos créditos no mercado voluntário está sendo feito pela Future Carbon Group, que atua na originação desses ativos, certificação e venda aos clientes finais.
Expectativa de crédito de carbono
A quantificação ainda está sendo feita, mas a expectativa é gerar cerca de 1 milhão de toneladas de créditos de carbono, que serão registrados na Verra, o principal padrão global de créditos de carbono no mercado voluntário.
Nesse mercado, cada crédito equivale a uma tonelada de carbono de emissão evitada, e no caso de projetos de manutenção de floresta em pé, é preciso um compromisso de não desmatamento por 30 anos. O preço pode variar conforme as características do projeto.
Prêmio
No caso da UISA, a Future Carbon acredita que o crédito possa ser negociado com “prêmio” em relação aos créditos negociados no mercado físico de carbono, já que se trata de um projeto de preservação florestal. Além disso, a usina e a consultoria comprometeram-se a destinar 10% de suas receitas com as vendas dos créditos ao Instituto Florescer, da própria UISA, que faz trabalhos de desenvolvimento social com as comunidades locais.
Essas duas “externalidades positivas” adicionais costumam render prêmios no mercado voluntário de carbono. Nas contas da Future Carbon, o projeto pode render US$ 10 milhões ao longo de 30 anos.
Desgaste
Recentemente, projetos de crédito de carbono do tipo REDD+ sofreram desgaste depois que o jornal britânico “The Guardian” publicou reportagem afirmando que a maior parte dos projetos do tipo registrados na plataforma da Verra estariam “inflando” a conta de emissões evitadas. Segundo o jornal, muitos projetos estariam incluindo áreas com vegetação nativa que não estariam sob risco de desmate, o que estaria ferindo o princípio de “adicionalidade”.
Esse princípio determina que o crédito só pode ser gerado se de fato impedir a emissão de carbono na atmosfera, em comparação a um cenário em que ele não existisse.
Críticos dos projetos de REDD+ afirmam ainda que créditos de carbono para evitar o desmatamento podem significar uma “licença” para que compradores continuem emitindo gases de efeito estufa.
Barreira financeira
Fábio Galindo, CEO da Future Carbon, defende que projetos como o da UISA que emitem créditos de áreas cuja preservação já é obrigatória não ferem o princípio da adicionalidade por causa das altas taxas de desmatamento legal e ilegal no Brasil. “O REDD+ vira uma barreira financeira para um controle adicional destas florestas, para que elas sejam protegidas do desmatamento legal e ilegal”, disse.
Além disso, ele observa que a própria lei ambiental é passível de mudanças. “Pode ter ameaça de uma mudança da lei e por si só a floresta fica ameaçada”, afirma. “Pelo fato de ter APP e reserva legal, parece que o Brasil é Noruega, que só porque está na lei é respeitado”, critica.
Agentes que operam no mercado voluntário de carbono afirmam que, depois da reportagem, a demanda por esses ativos teria “esfriado”. Mas Galindo disse que não sentiu alteração nos projetos que comercializa. “Apesar do mercado do carbono commodity, spot, ter tido queda, temos percebido um aumento do preço nas negociações do crédito de carbono ‘premium’, que é o que a Future Carbon coloca no mercado”, disse.
Mercado físico
Enquanto no mercado físico os créditos vêm sendo negociados por US$ 4,00 a US$ 6,00 por tonelada de carbono, a Future Carbon já chegou a vender neste ano um projeto com créditos a US$ 16,50 a tonelada do carbono.
Os créditos da UISA serão relativos a áreas inscritas parte no bioma amazônico, mas com vegetação de Cerrado, nas áreas de “transição”. Os créditos ainda precisarão passar pelo processo de registro na Verra e verificação por segunda parte. A expectativa é que comecem a ser vendidos no 1º trimestre de 2024.
Expansão do projeto
Com as primeiras operações, a UISA pretende expandir o projeto às áreas preservadas de seus fornecedores de cana, com o plano de criar um “corredor ecológico”. “Na medida em que o projeto evolua, vamos mostrar para os produtores. Tendo um incentivo econômico, as coisas fluem bem”, disse José Fernando Mazuca, CEO da usina.
Outras possibilidades
A empresa já está também explorando outras possibilidades de originação de créditos de carbono. Uma em estudo é calcular o quanto de carbono suas lavouras de cana já capturaram no solo no passado, comparando-as com o solo de áreas que nunca tiveram cana.
A empresa já gera hoje outros tipos de crédito ambientais, como os I-RECs, de energia renovável, os Créditos de Descarbonização (CBios) do RenovaBio, os créditos do programa Low Carbon Fuel Standard (LDFS) da Califórnia, e os certificados da Bonsucro.