Transformação em curso na cadeia do arroz

Uma transformação estrutural está mudando para melhor a situação do segmento arrozeiro no Rio Grande do Sul, responsável por dois terços da produção brasileira do grão. Fatores como o aumento das exportações e uma distribuição mais equilibrada da oferta da matéria-prima ao longo do ano vêm garantindo boa rentabilidade aos agricultores, enquanto a indústria também trabalha sobre patamares mais firmes de preços, se profissionaliza e contribui para a estabilidade do mercado.

O quadro começou a melhorar para os produtores gaúchos no segundo semestre de 2011, quando as cotações médias da saca de 50 quilos de arroz em casca deixaram para trás o piso de R$ 19 (valor nominal) registrado no segundo trimestre daquele ano, após uma trajetória de baixa iniciada em 2009. Em agosto de 2012 os preços romperam a faixa dos R$ 30, superaram os custos totais de produção (incluindo fixos e variáveis) e chegaram, no fim de abril, a R$ 35,92, uma alta de 5,71% no mês, conforme o Cepea/Esalq.

“Estamos no patamar que sonhamos”, diz Cláudio Pereira, presidente do Instituto Riograndense do Arroz (Irga), vinculado à Secretaria da Agricultura do Estado. Segundo ele, apesar do avanço de 6,6% estimado pela Companhia Nacional do Abastecimento (Conab) para a colheita nacional na safra 2013/14, para 12,6 milhões de toneladas – depois de um incremento de 1,9% no ciclo anterior -, as cotações se sustentam porque não há excesso de oferta.

Em 2012, a média anual dos preços apurados pelo Cepea/Esalq, calculada pelo Irga, alcançou R$ 31,44 a saca, ante R$ 22,35 em 2011. Já os custos de produção para a formação das safras em questão (2010/11 e 2011/12) aumentaram de R$ 28,55 para R$ 29,19. Em 2013, segundo o instituto gaúcho, a cotação média foi a R$ 33,88, ante custo de R$ 31,40, e no primeiro quadrimestre deste ano o preço médio atingiu R$ 35,28, 8,7% acima do custo (R$ 32,45).

E a situação tende a se manter favorável na próxima safra, na avaliação do consultor Carlos Cogo. Ele lembra que, de acordo com as projeções da Conab, o estoque do cereal no país será de quase 2 milhões de toneladas na passagem para a temporada 2014/15, ante 1,7 milhão na transição para 2013/14, mas que, mesmo assim, trata-se de um patamar “historicamente baixo”.

Esses estoques, conforme Cogo, representam apenas 16% do consumo anual de 12 milhões de toneladas no Brasil, nível que desde 2007/08 só é maior que os 14% da passagem para o ano-safra atual (2013/14). Com isso, ele estima cotação média de R$ 36,67 para a saca neste ciclo e de R$ 38,50 em 2014/15 no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina – que, juntos, respondem por cerca de 75% da produção brasileira.

As opiniões dos analistas sobre os motivos para essa elevação contínua coincidem. Em primeiro lugar, aparecem as exportações, porque oferecem uma alternativa importante para os produtores, enxugam o mercado e servem de parâmetro para os preços internos. Considerando o ano civil, o Brasil é exportador líquido de arroz desde 2011, quando o superávit nas vendas externas chegou a 835,7 mil toneladas (base casca), de acordo com dados do Irga.

Em 2012 o saldo caiu para 619 mil toneladas e em 2013, para 182,3 mil. No primeiro trimestre de 2014, porém, alcançou 128,5 mil toneladas, ante 9,6 mil no mesmo período do no passado. Entre março de 2014 a fevereiro de 2015, a Conab projeta superávit de 300 mil toneladas.

Conforme Cogo, todo o segmento se movimentou nos últimos anos para elevar exportações, incluindo agricultores, cooperativas, indústrias e tradings, além de agências governamentais como a Apex. O câmbio também ajudou as vendas externas e contribuiu para conter as importações, e em 2013 o governo do Estado ampliou de 3,5% para 7%, por tempo indeterminado, o crédito presumido de ICMS para as indústrias que beneficiam o arroz gaúcho.

Além disto, mais de 95% do arroz importado pelo Brasil (praticamente todo ele beneficiado) vem do Mercosul devido à Tarifa Externa Comum (TEC) de 12% sobre o produto originário de fora do bloco. Como no Uruguai o arroz está perdendo espaço para a soja e na Argentina os agricultores estão segurando a produção à espera da desvalorização do peso, a oferta também fica contida. A exceção é o Paraguai, que está aumentando as vendas para o Brasil.

Outro fator que ajuda os arrozeiros gaúchos é o crescente plantio de soja em sistema de rotação nas áreas de várzea. A oleaginosa ocupa as lavouras arrozeiras deixadas em repouso ou utilizadas para pastagem e gera uma renda extra com a qual os produtores podem fazer frente aos compromissos do primeiro semestre sem desovar rapidamente a safra de arroz e derrubar os preços.

“Os produtores [de arroz] estão se capitalizando com a soja”, comenta o analista Antônio Sartori, da corretora Brasoja. Segundo ele, a oleaginosa se adaptou bem à região, contribui para o aumento da produtividade do arroz e já ocupa 700 mil hectares, ante 65 mil há três anos. O Irga calcula que na safra 2013/14 já tenham sido plantados 302,6 mil hectares de soja na várzea, ante 270 mil no ciclo anterior, e acredita que o Estado pode chegar a entre 800 mil e 1 milhão de hectares em dez anos.

A própria indústria está mais “enxuta, organizada e competitiva”, o que favorece a estabilidade do mercado, entende Cogo. Segundo o Irga, empresas que lideram o ranking do segmento no Rio Grande do Sul, como Camil, Josapar, Pirahy, Urbano e SLC, vêm crescendo, investindo em logística, modernizando os parques fabris e ampliando sua participação no processamento da safra gaúcha. Em 2013, as dez maiores responderam por 47,59% das 6 milhões de toneladas beneficiadas no Estado, quase dois pontos a mais do que a fatia de 45,83% no ano anterior.

 

Fonte: Valor Econômico 

 

 

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