Teto dos gastos põe setor rural em estado de alerta

Apelidada de “PEC dos Gastos” quando ainda tramitava no Congresso, a Emenda Constitucional 95, que limitou o aumento dos gastos públicos no Brasil, só foi promulgada há uma semana, mas já vem tirando o sono de muitos produtores rurais pelo impacto que pode causar, no médio prazo, ao financiamento ao agronegócio.

O temor no segmento é que esse novo dispositivo constitucional, que impede os gastos públicos de um ano de crescerem mais do que a inflação do ano anterior, leve a uma redução drástica nos subsídios pagos pelo governo para o crédito rural a cada safra. A percepção é de que o setor também pode ficar sujeito a tetos de gastos que podem restringir a oferta de crédito rural subsidiado.

O Valor apurou que técnicos do Ministério da Fazenda e do Banco Central já têm sinalizado que o volume de recursos subsidiados pode minguar a médio e longo prazo. Os dois órgãos já marcaram para o fim de janeiro de 2017 a primeira reunião de governo para tratar do próximo Plano Safra – o 2017/18. Geralmente, essas discussões acontecem no mês de abril.

Apesar de o governo ainda não ter se posicionado abertamente sobre o assunto, entidades de produtores encabeçadas pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), analistas de mercado e a bancada ruralista do Congresso já entendem que a emenda constitucional forçará o Executivo a definir prioridades para as suas despesas, que podem deixar de fora os gastos com equalização das taxas de juros do Plano Safra, feitos pelo Tesouro Nacional para que essas taxas sejam menores que as de mercado.

 

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“Com a PEC agora aprovada, o governo terá de mexer nos subsídios agrícolas, e isso faz com que o Tesouro redimensione seus gastos e decida se“ vai financiar lavouras de soja ou arroz, pequenos ou grandes, porque bancar tudo será improvável”, disse o consultor Ademiro Vian, ex-diretor da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban).

Para Vian, os gastos do governo com subsídios ao crédito rural não devem sofrer mudanças na próxima safra, a 2017/18, pois o orçamento para o ano que vem já foi aprovado pelo Legislativo. Mas ele acredita que, a partir da temporada seguinte (2018/19), a nova regra constitucional vai acabar com a liberdade que o governo tem para aumentar os gastos com subsídios à agricultura.

Um levantamento feito por Vian, com base em dados do Ministério da Agricultura, aponta que o volume de crédito para custeio agropecuário, com juros subsidiados, na safra 2014/15 aumentou 15%, patamar superior ao IPCA (índice oficial de inflação) registrado em 2014, que foi de 6,41%. O problema, afirma Vian, é que em 2017 a inflação tomada por base pela PEC, de 7,2%, será bem menor do que esse aumento real de despesas observado nos últimos ciclos.

Já André Nassar, ex-secretário de Política Agrícola, avalia que a realidade dos subsídios agrícolas depende do comportamento da taxa básica de juros, a Selic. E, se ela continuar caindo, a tendência é que os gastos com equalização de crédito rural também caiam e mirem cada vez menos médios e grandes produtores de commodities agrícolas que têm outros meios de se financiar.

“O que vemos é que a produção agrícola tem crescido significativamente, mas o crédito rural não consegue mais acompanhar esse movimento. E aí o crédito privado ganha mais relevância”, disse Nassar.

Em meio às incertezas sobre o futuro do crédito oficial, o setor já promete reação. O Ministério da Agricultura já começou a colher propostas das entidades do setor para o próximo Plano Safra. O ministro da Agricultura Blairo Maggi confirmou ao Valor que há na equipe econômica técnicos defendendo a redução de recursos para a agricultura.

“Estamos de olho e não vamos deixar o setor perder recursos”, disse, acrescentando que ficará atento a “qualquer discussão para redução de subsídios”.

Diante desse cenário, Frederico Azevedo, gerente de Política Agrícola e Logística da Aprosoja Mato Grosso, disse que os agricultores já estão buscando cada vez mais acessar fontes de financiamento privado. “O teto de gastos já nos preocupa bastante, até mesmo porque a agricultura virou um dragão que precisa se auto-alimentar.”

 

Fonte: Valor Econômico

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