O Pará está entrando no período de safra do açaí (euterpe oleracea), que inicia em julho e se estende até dezembro. Mas é na entressafra – de janeiro a junho – que o retorno financeiro ao produtor rural é maior, especialmente para aqueles que já utilizam a irrigação nos plantios de terra firme. A Embrapa Amazônia Oriental vem desenvolvendo pesquisas com o melhoramento genético e práticas de irrigação e adubação de açaizeiro de terra firme para produção na entressafra. Os primeiros resultados são apresentados a técnicos extensionistas em área de produtor no município de Igarapé-Açu, nordeste do Pará.
O pesquisador João Tomé de Farias Neto explica que aumentar e padronizar produção de açaí no Pará são desafios que a pesquisa agropecuária vem enfrentando há muitos anos. A Embrapa já lançou o Manejo de Açaizais Nativos e a cultivar de açaí de terra firme BRS Pará, importantes passos da pesquisa para melhorar a cadeia produtiva dessa palmeira. Mas é a produção na entressafra que hoje representa o maior desafio da pesquisa.
“Nos meses de julho a dezembro é que o Pará produz de 70% a 80% do seu açaí, e a pesquisa ainda não conseguiu diminuir essa diferença. Mesmo produzindo mais de 600 mil toneladas de frutos ao ano, essa produção ainda é pouca frente à demanda regional, nacional e internacional”, afirma o pesquisador. Além disso, a produção hoje ainda apresenta alta variabilidade genética, ou seja, diferenças de coloração do fruto, diferenças entre rendimento de polpa, tamanho de plantas e cachos, produtividade, e outros fatores que são obstáculos a uma produção em larga escala e com padrão de qualidade.
A primeira premissa para mudar essa realidade, segundo o pesquisador, é a impossibilidade de produzir açaí em terra firme sem irrigação, visto que a palmeira é nativa das áreas de várzea, onde passa a maior parte do tempo em solos inundados pelo movimento das marés. Ele diz que praticamente todos os produtores de açaí de terra firme do Pará já utilizam a irrigação, ainda que de forma empírica e sem medidas exatas para a melhor produtividade do plantio e rentabilidade da atividade.
Prova disso é o produtor rural Alexandre Machado, 39 anos, do município de Castanhal, nordeste paraense. Ele iniciou seu plantio há sete anos e hoje conta com 10 mil pés de açaí em uma área equivalente a 50 hectares. Ele produz em área de terra firme e iniciou a irrigação depois de um ano e meio de plantio. “A irrigação aumentou bastante a produção mesmo na entressafra, mas o custo de irrigar e adubar ainda é alto”, esclarece o produtor.
No município de Igarapé-Açu, o pesquisador João Tomé da Faria Neto mostrou as técnicas de irrigação por micro aspersão que vêm sendo testadas em áreas de produtor. “O custo de implantação de um hectare de açaí irrigado ainda é alto, em torno de 7 a 11 mil reais, mas o salto de produção é impressionante”, diz o pesquisador. Ele cita o exemplo de um produtor do município de Tomé-Açu, que tem uma área de 30 hectares plantados de açaí em terra firme e iniciou a irrigação no plantio a partir do 2º ano de safra: “no primeiro ano ele colheu cinco toneladas de frutos, ainda sem irrigação. No segundo ano, com a irrigação do plantio, saltou para 100 toneladas e no 3º ano para 180 toneladas de frutos”.
Ao definir os parâmetros exatos de irrigação e adubação, a pesquisa define com exatidão a relação entre custo e benefício da atividade. É por isso que é preciso monitorar todas as etapas da produção e a quantidade de água em diferentes fases do plantio, desde sua implantação até a primeira safra e nos anos subsequentes. Com a micro aspersão, a pesquisa chegou a estimar que seria necessário de 100 a 120 litros de água por dia por touceira, “mas esse indicador ainda é baseado na literatura e o que estamos fazendo agora é testando no campo com as características de clima e solo da nossa região”, completa o pesquisador.
Em termos produção, já é possível afirmar que em área de várzea a produtividade média de açaí está em torno de seis toneladas por hectare ao ano, com o manejo. E em área de terra firme com adubação e irrigação, o produtor consegue fazer de 15 a 17 toneladas de frutos por hectare ao ano. João Tomé Neto diz ainda que a pesquisa ainda tem muitos refinamentos a fazer e a parceria com o produtor é fundamental nesse processo.
INTERCÂMBIO REÚNE EXTENSÃO E PESQUISA
Além do custo elevado, outro entrave para a irrigação do açaí de terra firme é o acesso a insumos e equipamentos para a atividade, de acordo com o agrônomo Deusdete Fontes, do escritório da Emater de Ourilândia do Norte, sul do Pará. Ele diz que no município onde atua, acessar insumos, como adubos, fertilizantes, além de equipamentos é difícil e o custo do transporte desses materiais deve ser levado em conta na produção.
Já para o técnico agrícola, César Augusto, do escritório de Água Azul do Norte, os solos da região são bastante propícios ao cultivo do açaí, não é á toa que produtores já plantam comercialmente a BRS Pará, lançada em 2007 pela Embrapa Amazônia Oriental. “O grande entrave mesmo é a irrigação, pois temos um grande período de estiagem, e as técnicas apresentadas aqui são plenamente aplicáveis desde que o produtor tenha recursos para investir”, explica. O trabalho dele é levar essa informação técnica aos 500 produtores com quem trabalha na região.
Eles e outros extensionistas do sul do Pará e de outras regiões, cerca de 30 pessoas, participaram do intercâmbio técnico sobre a cultura do açaí promovido pela Embrapa em Igarapé-Açu, na última sexta-feira (18), sob a coordenação do núcleo da instituição no nordeste paraense, conhecida como região Bragantina.
O supervisor do núcleo, João Paulo Castanheira Both, explica que intercâmbios com esse reafirmam o importante papel da Embrapa, atuando diretamente junto ao público que vai levar nossas tecnologias ao produtor rural. “A gente tem que fazer com que as nossas tecnologias possam chegar aos técnicos e extensionsitas, serem aprimoradas por eles com toda a experiência que têm no campo, para depois serem levadas aos produtores”, completa o supervisor. O intercâmbio técnico com a extensão é uma atividade permanente do Núcleo da Bragantina.
MELHORAMENTO GENÉTICO DEVE RESULTAR EM NOVA CULTIVAR DE AÇAÍ
Desde 2002, o pesquisador João Tomé de Farias Neto trabalha com o melhoramento genético da cultura do açaí para a produção na entressafra. O trabalho é de longo prazo, pois envolve desde mapeamento de plantas em diferentes regiões do Estado até a análise do comportamento das plantas por cinco ou mais safras anuais.
Para lançar a cultivar que produzirá na entressafra, o pesquisador mapeou no estado do Pará os municípios que apresentavam boa produtividade de açaí o ano inteiro. Desse mapeamento, a pesquisa selecionou 500 plantas nos municípios de Afuá, Chaves e Anajás considerando duas características importantes: alta produtividade e o tamanho dos frutos, visto que “batedores” de açaí indicaram durante a pesquisa que os frutos pequenos são melhores, pois têm mais rendimento de polpa.
As 500 plantas foram avaliadas individualmente durante cinco safras, ou seja, cerca de nove anos, visto que o açaí começa a produzir com 3,5 anos e as safras são anuais. Das avaliações, o pesquisador chegou a 45 matrizes de plantas, que apresentam alta produtividade o ano todo e maior rendimento de polpa (tamanho de fruto pequeno).
As matrizes estão sendo cultivadas no campo experimental da Embrapa em Tomé-Açu, onde a pesquisa está avaliando o comportamento delas em terra firme e a quantidade de agua necessária ao longo das safras. “Lá a irrigação, adubação e o desenvolvimento das plantas são avaliados em condições totalmente controladas”, diz o pesquisador. É a partir do cruzamento das melhores plantas que sairá a nova cultivar de açaí da Embrapa Amazônia Oriental. “Será uma cultivar para terra firme que produz na entressafra, com todas as orientações de manejo e irrigação”, finaliza João Tomé Neto.
Fonte: Embrapa