Mobilizar os jovens para a modernização do agronegócio brasileiro é um dos objetivos do Comitê de Liderança e Juventude, da Sociedade Rural Brasileira (SRB), lançado na noite desta terça-feira, 27 de outubro, em São Paulo.
“Esta ideia traz a responsabilidade de liderar, de ter a capacidade de ouvir, de fazer a ligação entre as gerações, de mostrar que o caminho está sendo sempre adaptado e, portanto, as ideias precisam ser atualizadas”, argumentou Gustavo Diniz Junqueira, presidente da entidade.
Junqueira também citou o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, o qual mencionou na segunda-feira, 26 de outubro, em entrevista no programa Roda Viva, que as opiniões precisam se adaptadas às circunstâncias do momento, sem perder os valores dos princípios que as pessoas acreditam.
O lançamento foi marcado pelo debate de temas políticos, econômicos e sociais a cargo, além de Junqueira, do presidente do Conselho de Administração do Banco Santander, Sérgio Rial, e futuro CEO da instituição no Brasil; e André Roth, chairman da Louis Dreyfus Commodities Brasil, com mediação do cientista político Christian Lohbauer, diretor da SRB.
O presidente da SRB convidou as pessoas a tomarem posse daquilo que será obrigação e responsabilidade de todos, num futuro próximo, e afirmou que, hoje, uma pessoa comum, a exemplo de um atleta de alta performance, tem que começar muito mais cedo, ter determinação e obstinação e, de fato, fazer a diferença na sociedade.
“Junqueira representa a virada institucional na Rural (SRB), que é uma instituição de 95 anos, e está fazendo uma transição muito boa entre a experiência, o conhecimento e a tradição e o que está acontecendo no Brasil, hoje. Isso vai ocorrer no País todo, ou por inteligência ou por colapso”, previu Lohbauer.
“O que está acontecendo, aqui, é o embrião de um movimento que também ocorre, de forma desorganizada, em todo o Brasil”, comentou o cientista político. Para ele, o País e o agronegócio são grandes potências, “mas há a necessidade de movimentos mais rápidos, de renovação, inclusive na representação política, além de transformações na tecnologia com foco na inovação do processo”.
COMPETITIVIDADE
Mesmo com o cenário atual de crise, Rial, do Santander, ressaltou as vantagens competitivas do agronegócio brasileiro. “Se existe um setor em que o Brasil é competitivo, é bom e tem espaço para crescer, este é o agronegócio, o único do País que compete globalmente, e vai continuar competindo, até porque, em boa parte dos outros setores a gente nada mais é que um mercado de consumo”, salientou.
Para ele, essa não é uma questão de recursos naturais (água, solo e terra), mas de capital humano. Neste sentido, Rial mencionou o papel dos catarinenses, paranaenses e gaúchos, que ele considera os novos bandeirantes do século 20.
“O Sul recolonizou o País, nos últimos 20/30 anos, e isso gerou uma grande dicotomia do Brasil urbano que desconhece o potencial, a realidade e a fortaleza Brasil do interior, que é jovem, empreendedor, que necessita de financiamento, mas não depende tanto do Estado como outros setores”, ressaltou.
“Além disso, é inteligente, moderno e terá de se posicionar política e economicamente e continuar a agenda produtiva do Brasil como um país democrático, então as oportunidades são extraordinárias.”
Segundo Rial, o País está bem posicionado, mas os próximos 10 anos serão desafiantes para as commodities em geral. “Qualquer movimento, como a alta do preço do petróleo, é corrigido pelos Estados Unidos, pela base de xisto que ele tem. Além disso, hoje, desenhos demográficos de alguns países são assustadores, mas o mundo vai continuar crescendo e tem muita base alimentar ainda no carboidrato”, exemplificou.
Rial lembrou que cada país tem uma agenda específica e estratégia no setor agrícola. Nos países mais ricos, ele apontou a tendência de movimento de volta à terra (ao interior), menor consumo de alimentos e privilégio à produção local. “Vivemos em um mundo de batalha econômica competitiva contínua e a crise vai forçar o Brasil a olhar para fora”, ponderou.
COLAPSO
“A gente não pode pensar que a agricultura está fadada a ser um sucesso definitivo, ela precisa dar um salto de tecnologia para continuar sendo a estrela do agro mundial, ou perderemos a nossa capacidade produtiva e a nossa vocação competitiva. Isso também se aplica ao Brasil, que está em um momento crucial e terá um crescimento negativo de 3%, esse ano, e mais 2,5%, em 2016, em cima de menos 3”, alertou Lohbauer.
Ele lembrou que em 120 anos de República este é o primeiro biênio negativo do País, o que não aconteceu nem na crise do café dos anos 1929/193. “É um colapso econômico, político e moral”, sentenciou.
“Temos de pensar globalmente e agir localmente, e o agronegócio é uma oportunidade para o Brasil, mas tenham em mente que os próximos anos serão mais difíceis que os dez últimos”, avisou Rial.
“Estamos em uma baita enrascada, talvez a maior dos últimos cem anos, mas é uma crise passageira e uma das soluções é o agro, como todos aqui mencionaram”, arrematou Lobauer.
PLANEJAMENTO E INFRAESTRUTURA
“Até o momento, as estrelas estavam alinhadas, mas agora entramos no ciclo de commodities com preços mais baixos”, disse Roth, que citou as mudanças muito rápidas, a evolução de tecnologia, o papel dos transgênicos, além de outras transformações do mundo moderno, como crescimento da população, urbanização, aumento da demanda por alimento e o adventos dos biocombustíveis.
“O Brasil é um país que não planeja nem o dia de amanhã, além disso, os gargalos de infraestrutura são gritantes. Quando foi a última licitação que tivemos de portos e de ferrovias?, questionou o chairman da Louis Dreyfus Commodities Brasil. “Faltam visão e planejamento”, argumentou.
De acordo com Roth, atualmente a competição ocorre em escala global, ou seja, “para ganhar mercado, é necessário acompanhar de perto (a propriedade e o mundo), ter eficiência em custo e produtividade, além de infraestrutura adequada e resolver a questão tributária”.
O executivo da Dreyfus mencionou alguns investimentos que vão fazer com que a logística brasileira mude de forma significativa, na próxima década, como alguns corredores que estão caminhando para o Norte do Brasil e permitem exportar soja e milho através do sistema intermodal (hidrovia e ferrovia).
“A gente estima que, em cerca de 10 anos, 30 milhões de toneladas de produtos, que seriam escoados pelo Sul, subirão em direção ao Norte, por um modal mais competitivo, com frete mais barato por quilômetro transportado”, disse. “Também há grande potencial para armazenagem, existe dinheiro, mas o custo é desafiador”, completou Rial do Santander.
Há ainda espaço para todas as commodities em que o Brasil é líder, mas, segundo Junqueira, falta infraestrutura. “Precisamos viabilizar as PPs ou o setor vai ter um colapso.”
Junqueira afirmou que a Rural tem atuado junto ao Ministério (da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) e uma das mudanças, ocorridas esse ano, é que o órgão deixou de ser apenas um ouvinte de todas as discussões sobre infraestrutura realizadas no âmbito do governo.
“A ministra Kátia Abreu tem trabalhado de maneira bastante incisiva para que o Mapa seja atuante na discussão de projetos de infraestrutura”, contou.
URBANO X RURAL
“Nossa mobilidade social geográfica é muito ruim, é uma questão cultural, mas, naturalmente, a integração Brasil urbano e Brasil rural vai acontecer”, disse Rial. Segundo ele, hoje, as pessoas se orgulham de estarem no mundo rural que se profissionalizou e conhece tecnologia.
“O nível de formação acadêmica dessa nova geração é absolutamente melhor do que o dos seus pais e dos seus avós e, obviamente, estão em um mundo muito mais fácil de você ler e entender”, comparou o executivo do Santander.
Na análise de Junqueira, a percepção de que o urbano não reconhece o rural é mais negativa entre o próprio agro. “Queremos ser bajulados, porém, o reconhecimento virá do nosso conhecimento, do fato de entregar mais, e essa percepção vai ser reconhecida quanto mais tecnologia e gestão a gente trazer para o campo. O trabalho nosso é daqui para diante”, enfatizou.
INOVAÇÃO
O presidente da SRB lembrou que o agro brasileiro foi o único setor da economia que de fato inovou. “Descobrimos o cerrado, a agricultura tropical, fizemos o etanol, e uma série de outras conquistas que hoje nos colocam no primeiro pedaço da riqueza que só vem com quem inova e faz diferente.”
Segundo Junqueira, a Rural participa de todas as Câmaras Setoriais do Mapa e há espaço para discutir as commodities das quais o Brasil é líder e precisa do apoio de gente jovem no trabalho de repensar sempre o País vários anos adiante. “O Comitê vai se reunir periodicamente e tudo aquilo que move o agronegócio pode participar.”
O COMITÊ
Segundo João Adrien, diretor da SRB e responsável pelo projeto do Comitê de Liderança e Juventude, a iniciativa tem como objetivo despertar o olhar das novas gerações para a dinâmica do agronegócio no século 21, basicamente em duas linhas principais. A primeira é incentivar os jovens ligados ao campo, que vão estudar nas cidades, em grande maioria.
“Queremos mostrar que a atividade tem espaço para esses profissionais e que o setor necessita desse conhecimento, afinal de contas, o agro moderniza-se a cada dia e somente a renovação constante do conhecimento, da gestão e das técnicas produtivas poderão dar sequência ao crescimento da atividade”, salienta.
As ações, explica, pretendem dar continuidade aos trabalhos dos produtores que vivem do agronegócio e realizar a sucessão familiar.
“Percebemos que ela só ocorre quando há uma transformação na gestão. Ou seja, demonstrar, não somente para os jovens, mas também para outras gerações que estão no comando das propriedades, que a modernização na gestão é necessária para atrair as novas gerações e dar continuidade para o produtor ter competitividade, eficiência e sustentabilidade no campo.”
A segunda vertente em que o Comitê pretende atuar é na promoção do agro dentro dos centros urbanos, principalmente nas universidades, demonstrando aos estudantes que o setor não se resume à atividade agrícola ou é restrito apenas aos proprietários rurais.
“O agro, hoje, é formato por uma ampla e extensa cadeia produtiva onde qualquer indivíduo capacitado pode construir sua carreira profissional e fazer parte”, comenta. Além disTo, o novo grupo SRB busca fomentar a discussão do empreendedorismo, incentivando novas empresas, investimentos, criação de start-up’s, e assim por diante.
“Devemos lembrar, por exemplo, que menos de 40% dos produtores rurais acessou a internet nos últimos 30 dias, o que mostra a existência de um grande potencial de crescimento, ao passo que mais produtores passam a conectar-se na rede e, portanto, serão possíveis demandantes de serviços distintos envolvendo o setor”, argumenta.
“Acreditamos que as ações propostas pelo Comitê podem contribuir, ainda, para a melhoria da imagem que o público urbano tem do agro, à medida que passa a enxergar o setor como oportunidade profissional”, pondera.
EVENTOS
Também fará reuniões mensais, na sede da SRB, com transmissão para todo o Brasil, trazendo sempre algum profissional ou produtor referência para que os jovens conheçam melhor a atividade, os desafios e as oportunidades.
Paralelamente, o Comitê, sendo uma transformação do grupo Rural Jovem, realiza hoje o encontro Rural Jovem na ExpoZebu, este ano sua 6°edição, além do curso de Formação Agroempresarial Internacional, com três encontros ocorridos em países do Mercosul: Paraguai, Argentina e Uruguai, pois a SRB integra a Federação das Associações Rurais do Mercosul-FARM.
Também realiza a Feira de Carreiras do Agro brasileiro, evento organizado dentro das universidades urbanas, levando a realidade do agronegócio para os novos profissionais. O ano passado o evento aconteceu na FGV-SP e, este ano, será na INSPER, dia 9 de novembro.
Por equipe SNA/SP