Soja: momento é ou não de venda?

Vender soja ou esperar? Fazer negócios com a safra nova ou atual? Vale a pena, financeiramente, carregar essa soja para novos negócios mais adiante? Essas são perguntas que produtores no Brasil inteiro estão se fazendo neste momento e buscando garantir uma boa estratégia de comercialização diante de tantas variáveis em aberto.

O cenário é, de fato, bastante incerto e exige profissionalismo, cautela e um planejamento detalhado.

O Brasil já tem aproximadamente algo entre 44% e 45% de sua safra 2019/20 de soja comercializada, contra uma média dos últimos cinco anos para este período de 54% a 55%, e isso quer dizer que os negócios estão atrasados. E a comercialização vinha caminhando bem lentamente nas últimas semanas até começar a sentir os impactos do câmbio.

Nas últimas duas sessões, a moeda americana disparou frente à brasileira e voltou a se testar a casa dos R$ 3,90, acumulando um ganho de mais de 2% na última semana. O movimento puxou os preços no Brasil, algumas localidades viram as referências subirem até R$ 2,00 por saca, e alguns negócios foram fechados.

Entre todas as pontas soltas que ainda podem ser observadas no mercado e que, quando amarradas, poderão mudar a direção das cotações, estão:

Guerra comercial China x EUA

Uma nova rodada de conversações, pessoalmente, acontece no final desta semana em Pequim com uma delegação americana a caminho da capital chinesa. Na semana seguinte, é a vez dos chineses irem a Washington. Segundo especialistas, um acordo efetivo poderia ser divulgado somente em junho.

Além disso, os analistas explicam ainda que no tocante do agronegócio, os pormenores já estariam resolvidos, mas a questão da tecnologia e da propriedade intelectual ainda são um ponto de grande desacordo entre os dois países.

Em 8 de março, o conflito comercial, um dos mais sérios da história recente, completou um ano.

Safra 2019/20 dos EUA

No final desta semana também, o USDA divulgará o seu primeiro relatório com as intenções de plantio para a safra 2019/20. Era consenso entre as consultorias privadas norte-americanas, e também as brasileiras, que ocorreria uma expressiva redução para a soja, com os produtores optando mais por milho e trigo.

No entanto, as recentes inundações que severamente prejudicaram, e ainda prejudicam o Meio-Oeste americano, com previsão de estenderem até maio, colocaram essas estimativas em xeque. O mercado ainda está observando se toda essa umidade pode vir a atrasar o plantio do milho e fazer o produtor tenha de rever sua estratégia e adequá-la a esse novo quadro.

Segundo analistas e consultores, ainda é prematuro, portanto, tentar entender como será dividida a área norte-americana.

Demanda da China

A demanda chinesa por soja também é uma incógnita nesta temporada. Depois de iniciada a guerra comercial com os EUA, as compras da nação asiática se mostraram mais limitadas, com os chineses buscando alternativas para o uso da soja e focando todas as suas importações no mercado da América do Sul, especialmente o Brasil. E ainda segue direcionada por aqui as compras de maior volume do maior importador mundial da oleaginosa.

Entretanto, o país foi acometido por um severo surto de peste suína africana que tem castigado seus planteis, promovendo muitos abates e reduzindo o consumo de ração internamente, apertando as margens de esmagamento e mostrando que, mesmo ativa, a demanda da China pela commodity estaria, ao menos, comprometida.

Safra da América do Sul e participação do Brasil como maior fornecedor mundial

A safra 2018/19 da América do Sul está sendo concluída, com a colheita ainda em desenvolvimento, principalmente no Brasil e na Argentina, e o mercado quer conhecer o número real dessa temporada. Mais do que isso, porém, o mercado precisará entender qual será a participação do Brasil neste mercado como o atual maior vendedor de soja do mundo.

As certezas que são conhecidas neste momento são a de que o saldo exportável do Brasil será menor este ano, por conta da quebra ocasionada pelas adversidades climáticas, e que o país terá de racionar sua demanda no segundo semestre. Dessa forma, o protagonismo brasileiro no comércio global da commodity passou a ser mais uma variável para o mercado e para a formação das cotações.

Câmbio no Brasil

O futuro da economia do Brasil está nas mãos da Reforma da Previdência. No Congresso Nacional, como já era esperado, o texto enfrenta uma série de obstáculos e precisa de uma união política ainda mais forte para que seja aprovada sem que sofra grandes mudanças no projeto original.

As incertezas, porém, pesam mais agora e, aliadas a fatores externos, foram direta e rapidamente refletidas pelo câmbio, que somente na última semana somou uma alta de mais de 2%, alcançando seu mais alto patamar em 22 semanas. Os preços da soja no Brasil sentiram esse efeito imediatamente.

Fundos

Os “hedge funds” seguem carregando uma posição vendida recorde nos grãos, não só de soja, e esperam a definição de algumas dessas variáveis para começar a desfazê-la.

Diante disso, vender ou não vender soja agora? Seis especialistas responderam ao Notícias Agrícolas.

Marcelo De Baco, De Baco Corretora de Mercadorias

“Com esta situação de clima nos EUA e a indefinição de acordo (China x EUA), creio que vamos ter bastante procura pela soja do Brasil em abril. Eu não venderia hoje, ficaria atento de hoje até o próximo dia 10, com as trocas de posição de embarques nos EUA para cá. Podemos ter tradings buscando abastecer seus compromissos, precificando melhor do que o mercado indica de prêmio”, afirma De Baco.

“Temos de ficar atentos aos movimentos dos chineses, mas mesmo que não tivesse o problema de inundações nos EUA, eles precisam vir para cá, os volumes são muito grandes. Não acho que o céu é o limite, mas é preciso estar dia a dia no mercado. Temos lotes com preços de objetivo marcados e se a bolsa ou outra variável dá a conta, fechamos na hora. Com isso, o produtor pode ficar mais focado no operacional da lavoura”.

Ênio Fernandes, Terra Agronegócios

“Eu venderia se o dólar chegasse a R$ 4,00, o que poderia levar o porto a se aproximar dos R$ 84,00 por saca, o que é um ótimo preço. R$ 79,00 já é margem, mas porque vender abaixo dos R$ 80,00 neste momento? Somente na necessidade”.

Para o consultor em agronegócios, as melhores chances de venda para o produtor brasileiro deverão vir pelo dólar. “Com poucas chances de grandes altas em Chicago, não acredito em um acordo saindo agora em abril”. Fernandes diz ainda que a partir de setembro a janela de oportunidades poderia se estreitar. “A partir daí, teremos que observar os ‘lineups'”, disse.

Camilo Motter, Granoeste Corretora de Cereais

“Acredito que o produtor tem de ir aproveitando as oportunidades. Está muito incerto pela frente. EUA e China, como fica; questão da peste suína africana; plantio e evolução da safra dos EUA. Em face de tantas incertezas, acho que tem de ir participando”.

Assim como os demais especialistas, Motter afirma ainda que o câmbio, recentemente, tem sido o principal diferencial e que é um fator de extrema importância neste momento. “O câmbio abriu uma boa oportunidade nestes dias e o mercado teve um dinamismo maior nestes dias”.

Matheus Pereira, ARC Mercosul

Sobre as vendas da safra atual, Pereira diz que o melhor “é esperar a pressão de colheita passar. Há espaço para novas altas, mas ideias de estocar em silo-bags não vemos como rentáveis”. E também completa citando a questão cambial. “R$ 3,90 é uma ótima oportunidade de venda, só altera o cenário se a reforma ganhar movimento”.

Entretanto, para a safra 2020, a orientação é de que o produtor “venda dentro dos próximos 40 dias, pelo menos pra travar os custos esperados”.

Luiz Fernando Gutierrez, Safras & Mercado

Para o analista de mercado da Safras & Mercado, o câmbio de fato traz um momento interessante para os preços, mas o que chama a atenção agora é a safra nova. “A safra 2020 já está marcando entre R$ 84,00 e R$ 84,50 nos portos”. E para a safra atual, “o produtor tem na mente o patamar dos R$ 80,00 e alguns já conseguem isso”.

Gutierrez explica ainda que, para a temporada atual, salvo o câmbio, os demais fatores agora são negativos, com poucas chances de ganhos em Chicago ou nos prêmios. “Com um acordo, a situação muda. Chicago sobe, e os prêmios respondem negativamente aqui, sem acordo, os prêmios voltam a subir no Brasil”.

Andrea Cordeiro, Labhoro Corretora

“Se você prospectar que os EUA estão indo para uma safra de soja e milho, com ajustes de área, possivelmente uma área de soja menor, mas não muito e não visualiza um entendimento entre China e EUA no curto prazo, os preços não teriam razão para subir. Por outro lado, no Brasil, temos um diferencial que é uma valorização do prêmio e a questão comercial. Assim, sempre orientamos que o produtor trabalhe com vendas, fazendo médias, e não assuma totalmente um risco de esperar para um entendimento (entre chineses e americanos)”, diz a analista.

Ela acrescenta que este é, de fato, “um risco muito grande para o produtor brasileiro assumir, e por isso a orientação é de que ele faça vendas fracionadas, de acordo com suas necessidades, e quando estiver descoberto que se posicione comprando opções em Chicago ou na BM&F”. Ainda como parte da estratégia para a safra nova, ela explica que é importante que sejam observados os prêmios para a nova temporada.

 

Notícias Agrícolas

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