A seca que se estende por todo o País e o ressurgimento de uma conhecida praga (a broca-do-café) vêm prejudicando boa parte do cultivo cafeeiro no Brasil, modificando os rumos das negociações externas relativas ao grão, já observadas no mês passado. Um relatório da Organização Internacional do Café (OIC) aponta que a falta de chuvas fez com que o preço do produto subisse 24,4%, somente no mês passado, registrando a maior alta desde maio de 1997.
“A recuperação dos preços, em consequência das condições climáticas adversas, tem permitido a retomada do fôlego da comercialização do café, após os extremos prejuízos observados em 2013. No entanto, as incertezas quanto ao volume de perdas quantitativas e qualitativas nas próximas safras – uma vez que a atual seca não tem precedente histórico – geram volatilidade no mercado”, avalia o presidente do Conselho Nacional do Café (CNC), Silas Brasileiro.
Ele orienta para que o produtor tenha maior controle dos custos produtivos e ainda projete suas margens, anteriormente previstas, para efetuar a venda do grão dentro das metas de lucratividade.
“O uso das ferramentas disponíveis no mercado para o hedge é uma estratégia que precisa ser mais utilizada pelos cafeicultores”, salienta. O hedge é uma operação financeira com a finalidade de proteção: um produtor de café precisa se proteger da queda de preços assumindo uma posição vendida no mercado futuro, como se estivesse comercializando sua safra antecipadamente. A intenção, com isso, é se livrar dos possíveis riscos do mercado.
De acordo com Brasileiro, é preocupante o impacto da atual estiagem prolongada nas safras futuras, pois já se observa perda de vigor vegetativo dos cafezais. “Isto pode trazer dificuldades aos produtores do País, com perdas quantitativas e qualitativas em suas próximas colheitas. Por este motivo, já estamos antecipando estratégias junto ao governo federal para amenizar os atuais danos”, informa.
Para o presidente da CNC, a recente alta dos preços ainda não foi suficiente para inverter a situação de perda de receita cambial nas exportações de café.
“Como a demanda internacional está aquecida, mesmo com maiores preços, estamos exportando mais volume”, destaca.
Ele aponta que recentes dados do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) mostram que o País embarcou 2,75 milhões de sacas em fevereiro, ante 2,21 milhões computadas em igual mês de 2013. “Esse volume equivale a um crescimento de 24,2%, mas, em termos de receita cambial (US$ 386,45 milhões), houve perda de 9,7% no mesmo período analisado.”
CONSUMIDOR FINAL
Na visão de Brasileiro, o consumidor final de café não deveria ser impactado com a alta dos preços do grão verde.
“Em função de o mercado cafeeiro apresentar baixa elasticidade, as correções de preços, frente às variações do volume ofertado, costumam ser bruscas, a exemplo da queda excessiva do valor do grão em 2013 e a atual recuperação em poucos meses”, salienta.
“Os agentes da cadeia cafeeira costumam se proteger contra essa volatilidade de mercado, por meio de contratos de longo prazo e ferramentas de hedge. Por isso, consideramos precipitada qualquer transmissão da atual elevação dos preços básicos para a xícara do consumidor.”
No recente cenário, o aumento dos preços do café só serviu para recuperar as perdas dos últimos meses, conforme o presidente do CNC. Agora, o produto tem preço comparável ao observado em novembro de 2012. De acordo com ele, a informação pode ser verificada no Brasil com a análise da evolução do indicador de preços do café arábica, elaborado pelo Centro de Estudos em Economia Aplicada (Cepea).
“Na segunda semana de março, este indicador atingiu R$ 485,62, o maior valor desde janeiro de 2012. Considerando que os cafeicultores operam com custos de produção crescentes, desde 2012, ressaltados os significativos aumentos do salário mínimo e a desvalorização do real, que tornam os fertilizantes e defensivos (agrícolas) mais caros, a recente recuperação dos preços do café não reflete em maiores lucros (ao produtor), apenas em fôlego para continuar produzindo”, pondera.
PERSPECTIVA
Após três anos consecutivos de excedente na oferta mundial de café, o mercado vem antecipando a discrepância entre oferta e demanda, influenciada pelas condições climáticas inesperadas no Brasil. “Como a demanda mantém-se aquecida, a probabilidade de preços sustentados é alta.”
Brasileiro destaca ainda que, em termos de política cafeeira, foi aprovada, em fevereiro, pelo Conselho Deliberativo da Política do Café (CDPC), uma proposta de distribuição dos recursos do Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé), no total de R$ 3,825 bilhões, em linhas de crédito para financiamento em 2014.
“Esse volume é o maior já disponibilizado para o setor cafeeiro e contempla todos os elos da cadeia produtiva, inclusive a indústria.”
O governo federal também atendeu aos pleitos no ano passado, conforme o presidente do CNC, em meio à grave crise de preços do setor cafeeiro.
“Desta forma, contamos com a prorrogação dos vencimentos da linha de estocagem da safra 2012, com a realização do programa de Opções Públicas de Venda, com o reajuste do preço mínimo do café, que estava congelado desde 2009, e com o maior orçamento da história do Funcafé (R$ 3,160 bilhões), até a definição do montante para 2014.”
BROCA-DO-CAFÉ AVANÇA
Além da seca que atinge as lavouras no Brasil, uma praga vem comprometendo vários cafezais, principalmente no Estado de Minas Gerais. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) teve de decretar, no dia 13 de março, estado de emergência nas lavouras de café mineiras, região onde se concentra a maior área plantada do grão do País.
Uma portaria publicada no Diário Oficial da União destaca o ressurgimento, nas lavouras cafeeiras de Minas, da conhecida praga Hypothenemus hampei, popularmente chamada de broca-do-café. A praga causa o apodrecimento dos grãos e compromete a qualidade do produto. O órgão, segundo nota, deve realizar uma ação emergencial para que o problema não se espalhe para outras regiões brasileiras.
De acordo com a portaria, o decreto se justificou pela “gravidade, pelo ciclo curto e grande capacidade de proliferação [da praga]; a baixa capacidade de resposta, pela ausência de alternativas eficientes para seu manejo; e os efeitos sobre a economia agropecuária”. Ainda segundo o Mapa, o estado emergencial deve durar 12 meses, a contar da data da publicação da portaria. Enquanto isso, devem ser elaboradas medidas em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e com a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais.
O presidente do CNC acredita que a declaração de estado de emergência fitossanitária em Minas Gerais foi importante, porque pode permitir o Mapa de importar e/ou autorizar, temporariamente, a produção, distribuição, venda e utilização de produtos não autorizados (defensivos agrícolas), conforme está previsto no artigo nº 53 da Lei 12.873, do ano passado.
Produtores já pediram a autorização do governo federal para que regularize defensivos agrícolas com princípios ativos Cyantraniliprole e o Chlorantraniliprole/Abamectin para o combate da broca-do-café. Na opinião de Brasileiro, esta autorização deve vir em breve, considerando a atual situação do setor cafeeiro no País.
Por equipe SNA/RJ