São Paulo retoma o fio da meada

A constante busca por rentabilidade em pequenas áreas continua a levar agricultores do oeste paulista a apostar na criação de bicho-da-seda. Com esse movimento, o estado, que liderou a oferta nacional de casulos verdes no país na década de 1990, quando o volume nacional ainda se aproximava de 20.000 toneladas por ano, já viu sua produção aumentar 240% desde 2012.

Na safra 2018/19, a expansão só não está tendo prosseguimento por causa da seca. São Paulo deve repetir as 350.000 toneladas de casulos verdes obtidas no ciclo anterior, mas a tendência ainda é positiva. “Não fosse a seca em agosto, setembro e janeiro, o crescimento seria de até 20% nesta temporada”, disse William Aita, presidente da câmara setorial da seda do estado, para quem a escalada será retomada em 2020.

O número de produtores paulistas dedicados à atividade vem crescendo nos últimos quatro anos e deverá somar 290 em 2019, contra 215 em 2018. Em todo o país são 2.500 famílias, concentradas em São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná, sendo o último responsável por 84% da produção brasileira.

Em São Paulo, são 890 hectares dedicados ao cultivo de amoreiras e à manutenção de barracões para a criação das larvas. Na próxima safra, a área deve chegar a 1.050 hectares. Ainda é pouco perto da área dos anos 1990, mas indica que há novamente uma mudança em curso na sericicultura nacional.

A atividade voltou a atrair a atenção dos produtores paulistas por causa do aumento dos preços. Nos últimos seis anos, o preço do quilo do casulo verde (com teor líquido de 15%) pago ao produtor aumentou 45,4%, para a referência atual de R$ 16,80. Mas o valor pode chegar a R$ 25, dependendo da qualidade do fio. Na safra passada, a referência foi de R$ 16,00 o quilo, com picos de R$ 20,00.

“Como a atividade se tornou rentável, o produtor voltou a apostar na sericicultura, especialmente em São Paulo”, disse Shigueru Taniguti Junior, presidente da Bratac. A fiação, com sede em Londrina (PR), é a única do ramo no país com escala industrial e recebe quase toda a produção brasileira de casulos. A Bratac foi fundada por imigrantes japoneses em 1940, em Bastos (SP).

No Pontal do Paranapanema, extremo oeste paulista, a opção tem agradado inclusive a famílias que vivem em assentamentos. Segundo Renata Amano, presidente da Associação Brasileira da Seda (Abraseda), isso acontece porque, além dos preços mais altos, o investimento inicial é baixo e o retorno, rápido.

“É preciso entre R$ 20.000,00 e R$ 50.000,00 para um produtor começar do zero. O retorno vem em até três anos”, disse Amano. Ela calcula que o número de sericicultores está aumentando 10% ao ano no país. “O número de produtores que entram na atividade supera os que saem. Há três não registramos mais queda”.

Amano observa, porém, que os produtores mais antigos encontram dificuldade em passar o ofício para seus filhos ou dependem de mão-de-obra terceirizada, o que eleva custos e leva a desistências.

Cada produtor costuma ter área de dois a cinco hectares. No Paraná, líder nacional, a produtividade média alcança 650 quilos por hectare ao ano, mas pode chegar a 1.700, segundo Oswaldo da Silva Pádua, gerente da câmara técnica do complexo da seda do estado.

“Avanços como a mecanização da colheita da amoreira, o uso de novas variedades e a adoção de tecnologias de fertilização do solo também contribuem para elevar o rendimento e atrair o interesse dos produtores”, afirmou Pádua.

Toda evolução é bem vinda, porque a criação do bicho-da-seda não é tarefa simples. Os produtores recebem da Bratac as larvas, que têm de ser alimentadas cinco vezes ao dia com folhas de amoreira frescas. Cada caixa com 33.000 larvas consome 1.7 tonelada de ramas e folhas de amoreira nos 25 dias em que ficam sob o cuidado dos criadores. Cada produtor tem de quatro a cinco caixas por propriedade em barracões.

Quando atingem a idade certa, as lagartas formam os casulos e estes são entregues à fiação. Na indústria, eles passam por um processo de secagem em altas temperaturas (130ºC) para matar as crisálidas que permanecem em seu interior antes que se tornem mariposas. Após a secagem, é hora de limpeza, seleção por qualidade e cozimento, a partir do qual é possível encontrar o fio da meada. A etapa final é a fiação propriamente dita.

Além de abastecer o mercado doméstico, o produto dará origem a kimonos vendidos no Japão, tecidos no Vietnã e peças de luxo de grifes europeias. “Como a demanda externa está aquecida, as perspectivas para o segmento são as melhores possíveis”, disse Pádua.

Nesta safra 2018/19 (de setembro do ano passado a maio próximo), a Bratac estima que receberá 3.000 toneladas de casulos verdes (cada um tem um quilômetro de fio), 1,4% mais que no ciclo anterior. “Até dezembro, nossa projeção era de um aumento de 5% nesse volume, mas com a falta de chuvas não contamos com essa recuperação”, afirmou o presidente da Bratac.

A empresa projeta produzir 507 toneladas de fio de seda neste ano, com aumento de 3,8%. Do total, 80% serão fios de alta qualidade e 94% serão exportados. Junior calcula que a empresa tem condições de ampliar em 20% a produção sem fazer investimentos estruturais, apenas com a maior oferta de casulos.

As exportações deverão crescer 4% neste ano, para 489 toneladas. Segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), em 2018 a receita com os embarques de fio de seda subiu 2%, para US$ 32.6 milhões, e os principais destinos foram Vietnã (32%), Japão (28%), França (26%) e Itália (10%).

Por ter qualidade superior, o produto brasileiro custa de 15% a 20% mais que o chinês, seu principal concorrente. O país asiático abastece 80% do mercado mundial, e mesmo o Brasil importou cinco toneladas do produto chinês (US$ 1.2 milhão) no ano passado.

“Mas temos espaço para produzir mais porque falta no mercado internacional fio de seda de qualidade. Não conseguimos atender novos clientes por causa da falta de matéria-prima”, disse Junior, que é neto de um dos fundadores da Bratac.

Com a demanda externa firme, a empresa deve manter em 2019 o ritmo de aumento de 10% a 15% no faturamento registrado nos últimos anos. Em 2016, a fiação faturou R$ 100 milhões, mas de lá para cá não divulgou seus resultados.

 

Valor Econômico

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