A produção de soja do Brasil na temporada 2019/20 deverá ser recorde, com aumento de 6,60%, na medida em que analistas estimam uma recuperação da produtividade média após uma safra menor em 2018/19, apesar de um tempo mais seco em setembro, quando produtores em geral dão a largada no plantio.
Segundo pesquisa da Reuters com 12 consultorias e instituições, a safra de soja do Brasil 2019/20 foi estimada em recorde de 122.6 milhões de toneladas, em média, praticamente estável em relação ao levantamento realizado no início de agosto, com alguns participantes mantendo as suas previsões.
Embora as estimativas variem de 119.70 milhões a 125.70 milhões de toneladas, todas elas superam com folga as 115 milhões de toneladas da estimativa oficial do governo (Conab) para 2018/19, ficando também acima da máxima histórica obtida em 2017/18 (119.3 milhões de toneladas).
A recuperação das produtividades em 2019/20 seria o principal fator de aumento da safra, já que a pesquisa também aponta um aumento médio de 2,30% na área plantada, para 36.70 milhões de hectares, em linha com a da safra anterior. Porém, bem abaixo da média da última década, de aumento de mais de 5%, com o setor cauteloso em relação aos custos e à possibilidade do fim da guerra comercial EUA-China, que tanto beneficiou os brasileiros em 2018/19.
“Deu um veranico em dezembro do ano passado e pegou uma parte da área de soja do Brasil, o que pelas minhas contas fez com o Brasil deixasse de colher pelo menos 10 milhões de toneladas”, disse o chefe de grãos da consultoria Datagro, Flávio França Júnior.
Assim, a Datagro, que tem uma das maiores estimativas da pesquisa – 125.30 milhões de toneladas, avalia que o Brasil poderá voltar a registrar recorde, apesar de previsões de tempo mais seco neste início de plantio, que atrasará o começo dos trabalhos na comparação com 2018/19, quando o ritmo inicial foi fora da curva.
Com o plantio em velocidade histórica na temporada passada, o Mato Grosso, maior produtor brasileiro, registrou 4,30% de área plantada até 28 de setembro em 2018. Mas neste ano essa situação não deve se repetir, segundo especialistas, pois as chuvas só devem voltar no final do mês. Situação semelhante é vista no Paraná, com a maior parte das regiões registrando déficit de umidade até o final do mês, segundo dados da Refinitiv.
Entretanto, isso não está sendo visto como um problema para a soja por ora. Segundo França Júnior, a lógica deste ano é de que o plantio não seja tão rápido, voltando a ter um ritmo dentro da média, e que, quando as chuvas retornarem, elas sejam mais regulares, possivelmente garantindo boas produtividades. Contudo, o analista ressaltou que anos de clima neutro costumam trazer mais nervosismo para o mercado, já que é mais difícil prever uma tendência de chuvas.
“Tivemos La Niña fraca (em 2016/17), depois clima neutro (em 2017/18), e foi a nossa melhor safra, e depois El Niño fraco (2018/19). A rigor, estamos indo para a quarta safra seguida em clima dentro da neutralidade”, disse França Júnior.
Para a consultoria ARC Mercosul, o atraso da chegada das chuvas deverá acarretar problemas pouco relevantes para a soja, “uma vez que a janela ideal de plantio se estende até o início de dezembro para a maioria dos estados centrais do País”.
Se a safra tiver chuvas razoáveis, é muito provável que o Brasil, maior exportador global de soja, supere com folga os Estados Unidos também na produção, já que os norte-americanos estão com a colheita 2019/20 estimada em 98.87 milhões de toneladas, após problemas no plantio.
Uma das consultorias que elevou sua estimativa em relação à previsão de agosto, a Cogo, citou uma reavaliação do prognóstico climático como garantia de melhores produtividades.
“Chuvas adequadas no Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), baixo risco de secas extremas no Sul e encerramento do El Niño”, disse Carlos Cogo, ao explicar o aumento de mais de dois milhões de toneladas em sua previsão, para 125.70 milhões de toneladas, a maior obtida pela pesquisa da Reuters.
Guerra comercial e peste
Enquanto o setor de soja no Brasil torce para que as melhores projeções climáticas se confirmem, as incertezas geradas pela guerra comercial China-EUA e a menor demanda chinesa pelo devastador impacto da Peste Suína Africana (PSA) no rebanho asiático, mantêm o produtor na defensiva para maiores avanços de área plantada.
“Há receio sobre aumentar porque, se os EUA fizerem acordo com a China, poderá sobrar alguma soja no Brasil. Por outro lado, se não fizer, tudo o que se plantar será pouco, é uma loteria”, afirmou o analista Luiz Pacheco, da T&F Agronômica.
Enquanto isso, a China dá sinais que pode atenuar as tensões da guerra comercial antes de uma nova rodada de negociações para encerrar as disputas, ao excluir alguns produtos agrícolas dos Estados Unidos, como a soja, de tarifas adicionais, segundo informação da agência oficial Xinhua.
“A expectativa de margens de rentabilidade apertadas em 2019/20, a incerteza no cenário internacional com as negociações sino-americanas ainda indefinidas e a perspectiva de queda na demanda mundial, puxada pelo surto de PSA na China, desestimulam o produtor brasileiro a aumentar de forma significativa a área a ser plantada”, disse Daniely Santos, da consultoria Céleres.
O analista sênior de Agronegócio do Itaú BBA, Guilherme Bellotti, explicou que esse ambiente de incertezas com guerra comercial EUA-China, além da tabela do preço mínimo do frete rodoviário, traz dificuldade “para quem oferta preço futuro ao produtor”.
“Dificulta a tomada de posição da trading. O que fica na mão do produtor, que ele consegue gerenciar, é o câmbio, que tem apresentado oportunidade para garantir bons negócios”, afirmou Bellotti, em referência ao dólar, que apesar de queda recente, está acima de R$ 4,00.
Reuters