A disparada de preços dos grãos usados na ração animal encolheu a margem de lucro da avicultura brasileira. No curto prazo, a situação é mais delicada para as granjas dedicadas à produção de ovos, que passaram a trabalhar no vermelho.
As agroindústrias de carne de frango ainda tentam se escorar no câmbio favorável às exportações para equilibrar as contas, mas a fraca demanda do Oriente Médio e a resistência em ajustar a oferta de aves no campo tornam o cenário nebuloso.
“Tudo caminha para ficar mais apertado do que imaginávamos”, disse César Castro Alves, analista da consultoria de agronegócios do Itaú BBA. Pelos cálculos do banco, a margem bruta da criação de frangos piorou em agosto, e está 4% negativa.
Segundo Alves, as agroindústrias voltaram a ampliar a oferta de pintinhos para engorda nas granjas, o que pode representar mais oferta de frango nos próximos meses, tornando um reajuste de preço, para compensar os custos, mais difícil. Além disso, não há sinal de queda de preços dos grãos.
Nas granjas de postura, o quadro é ainda pior porque, além da ração mais cara, o preço dos ovos caiu fortemente nos últimos meses.
A Mantiqueira, maior produtora de ovos do país, passou a operar com margem negativa de 20%. No ano passado era positiva, entre 10% e 12%. “Vai ter um ajuste porque o prejuízo é insustentável”, disse ao Valor o empresário Leandro Pinto, que comanda a companhia.
Para recompor as margens, um movimento de redução da oferta de ovos já está em curso na Mantiqueira. Segundo o presidente da empresa, galinhas poedeiras que produziriam até outubro foram descartadas antecipadamente. “Todo lote que não gera margem de contribuição vai ser reduzido”.
O movimento, iniciado há duas semanas, deve reduzir a oferta de ovos da Mantiqueira em cerca de 20% a partir de setembro, calculou o empresário. Trata-se de um ajuste apenas para atravessar o curto prazo.
Pinto confia que a situação deve se normalizar no médio prazo e, por isso, está repondo as galinhas, mas as substitutas só começarão a botar ovos em 120 dias. A expectativa é que, com o ajuste da produção, o preço do ovo possa se recuperar.
Desde abril, quando a cotação do produto bateu recorde em meio ao consumo aquecido do início da quarentena, o preço médio da caixa com 30 dúzias de ovos brancos recuou 23% em Bastos (SP), um importante polo produtor do País, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea).
Enquanto o ovo ficava mais barato, o preço da ração, responsável por cerca de 65% dos custos de produção da avicultura, só subia. Em agosto, o preço médio da saca de milho está em R$ 56,14, segundo o indicador Esalq/BM&FBovespa.
Trata-se de um aumento de 6% na comparação com a média de abril e de 54% em relação a agosto do ano passado. No caso da soja, a valorização média foi de 27,80% e 54,40%, respectivamente.
Na cooperativa paranaense C. Vale, cujos associados criam frangos e suínos, a ração está 22% mais cara mesmo com a estratégia de manter estoques para um ano.
“Estocamos, normalmente, milho suficiente para o consumo de um ano. Temos de nos prevenir de quebras pelo clima, já que a maior parte do cereal é produzida no outono-inverno, sempre sujeito a geadas”, disse Alfredo Lang, presidente da C.Vale, que origina o grão com os próprios cooperados.
Na avaliação de Castro Alves, do Itaú BBA, as agroindústrias de frango teriam de seguir o mesmo caminho dos produtores de ovos. “No entanto, não é isso o que está ocorrendo”, argumentou o analista. Segundo ele, os dados mais recentes indicariam uma aceleração no ritmo de produção.
A estimativa da Associação Brasileira dos Produtores de Pintos de Corte (Apinco) para os alojamentos de pintinhos em junho (uma espécie de indicador da produção futura de frango), é de 568.1 milhões de aves, com aumento de 11% na comparação anual e de 8,30% em relação as 524.4 milhões de aves estimadas para o mês de maio.
Para Wagner Yanaguizawa, analista do Rabobank, a provável extensão do auxílio emergencial, ainda que em valor inferior aos atuais R$ 600,00, ajuda a manter a demanda interna firme e, com isso, a disposição das agroindústrias de produzirem frango. Mas também há razões estratégicas para isso.
Segundo um executivo da indústria frigorífica, as empresas aceitaram trabalhar no “zero a zero” no mercado brasileiro para manter a participação de mercado desde que as exportações, sobretudo para aqueles que acessam o mercado chinês, continuem dando bom resultado.
Defensor da isenção temporária da tarifa de importação de milho para aliviar o custo, o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin, avaliou que, se o preço da ração continuar elevado, será inevitável repassá-lo ao consumidor ou reduzir a produção.
Valor Econômico