Pressionado pela inflação de alimentos, governo cogita medidas temerárias; Agro reage

O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado federal Pedro Lupion (PP – PR), divulgou nota em que teceu críticas à possível adoção dessa medida, bem como à falta de habilidade do governo em lidar de forma séria com o cenário da inflação dos alimentos. Foto: Marcelo Sá

FPA se posiciona contra possíveis intervenções

Diante da alta no preço de vários gêneros alimentícios, na esteira da escalada do dólar e da desconfiança do mercado quanto à disposição do governo em cortar gastos para equilibrar as contas públicas, o Executivo cogita medidas que possam frear essa tendência e diminuir a insatisfação popular. A inflação dos alimentos em 2024 foi de 8,23%, bem acima da variação de 4,83% no índice geral do IPCA. Na prévia de janeiro, a subida já está na casa de 1%. No entanto, logo uma polêmica surgiu, evidenciando novamente a dificuldade da gestão federal em dialogar claramente com a população sobre questões importantes, além da já desgastada relação com o setor agropecuário.

O Ministro Chefe da Casa Civil, Rui Costa, após reunir-se com o presidente Lula e titulares de outras pastas no último dia 24 de janeiro, disse que não há pretensão de controlar preços artificialmente, como tabelamento ou congelamento. Deixou escapar, no entanto, que outras ações estão no horizonte, seguindo orientação do próprio presidente. As diretrizes incluiriam robustecer políticas agrícolas já existentes, sem onerar o orçamento, para estimular a produção, sobretudo de itens que fazem parte da cesta básica. Assim, as famílias com menor poder aquisitivo, que são as mais afetadas pela alta dos alimentos, poderiam experimentar um alívio, ainda que temporário.

Mal-entendidos

Num episódio malfadado, o governo cogitou até mesmo estender o vencimento dos produtos em supermercados, recuando após a repercussão negativa. Nesse caso, a expressão “Válido até”, seguida da data de vencimento, seria substituída por “Melhor consumir até”. A ideia seria espelhar prática já adotada em países como EUA e Canadá. Isso poderia abrir margem para comercialização de produtos impróprios ao consumo. A sugestão, que surgiu após reunião com representantes do setor varejista, mostra como são poucas as opções práticas em curto prazo para que o governo ajude a baixar as cotações, pelo menos sem cair na tentação de intervenções forçadas e desastrosas, como o infame leilão de arroz, após as enchentes no Rio Grande do Sul, em 2024.

Rui Costa também declarou que, apesar de medidas artificiais não serem objeto de cogitação, uma alternativa poderia incluir reduzir impostos sobre importação de alimentos que estejam mais baratos no exterior. A hipótese, no entanto, também gerou descontentamento. O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado federal Pedro Lupion (PP – PR), divulgou nota em que teceu críticas à possível adoção dessa medida, bem como à falta de habilidade do governo em lidar de forma séria com o cenário da inflação dos alimentos. Escreveu Lupion:

A medida é mais um exemplo de decisões apressadas e mal planejadas, enquanto o governo ignora questões fundamentais como problemas macroeconômicos, controle inflacionário, câmbio desajustado e gastos públicos elevados. A desconfiança do mercado e a falta credibilidade agravam a situação. Os preços dos produtos agropecuários brasileiros seguem os padrões mundiais. Anunciar que o país vai abrir importações é simplesmente jogo de cena demagógico para induzir a população a achar que estão fazendo algo prático para baixar preços.”

PT mantém retórica inflamada e dobra a aposta

No lugar de tentar uma distensão dos ânimos, a presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann, manteve a retórica desafiadora e, em postagem de suas redes sociais, acusou oposição de “fazer gritaria e espalhar mentiras, motivadas por interesses políticos, visando as eleições de 2026”. A ex-deputada se mostrou perplexa pelo fato de medidas que, segundo ela, garantirão comida na mesa dos brasileiros, enfrentarem resistência. Ao mesmo tempo em que destaca as intenções do governo em preparar um Plano Safra recorde, Gleisi insinua uma suposta ingratidão do setor agropecuário, que teria sido, em suas palavras, “financiado como nunca antes” pela atual gestão federal.

Já o presidente Lula, em visita à horta da Granja do Torto, apareceu em vídeo divulgado em suas redes sociais declarando que “quando há um crescimento da demanda, ou seja, quando as pessoas podem comprar mais, os vendedores aumentam os preços. Isso pode gerar inflação, e a gente não quer inflação porque quem paga com isso é o trabalhador”, numa sutil, mas reveladora distorção da lei de oferta e procura. Além disso, Lula mencionou fatores climáticos, queimadas e a alta do dólar como elementos que pressionam o custo dos alimentos. Ele destacou que o governo está discutindo medidas para reduzir os preços, incluindo reuniões com atacadistas, donos de supermercados e produtores.

Para agricultores, entidades representativas e bancadas em defesa do setor, o presidente e seus principais ministros apostam na continuidade dos atritos com o setor, além de negarem responsabilidade sobre a crise inflacionária dos alimentos. Com o pleito presidencial de 2026 já no horizonte, economia patinando, parece que é o governo que decidiu antecipar ânimos eleitorais a fim de politizar contestações legítimas da gestão, ao contrário do que afirmou Gleisi Hoffmann.

Por Marcelo Sá – jornalista/editor e produtor literário (MTb 13. 9290)

Veja aqui também artigo do professor Xico GRAZIANO sobre o tema

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp