Porto seco pode ser alternativa para logística no Brasil, defende especialista

“A alternativa mais rápida para diminuir a deficiência de logística no Brasil, especialmente na hora de escoar os produtos agrícolas, seria desburocratizar as EADIs, conhecidas como portos secos”, afirma Everaldo Barros, CEO da MAC Logistic. Foto: Divulgação
‘A alternativa mais rápida para diminuir a deficiência de logística no Brasil, especialmente na hora de escoar os produtos agrícolas, seria desburocratizar as EADIs, conhecidas como portos secos’, afirma Everaldo Barros, CEO da MAC Logistic. Foto: Divulgação

 

Desburocratizar a utilização das Estações Aduaneiras de Interior (EADIs), conhecidas como portos secos, e usá-las para o escoamento da safra pelas rodovias até os portos brasileiros seria a alternativa de curto prazo para diminuir o gargalo da logística no País, em torno dos produtos agrícolas exportados. É o que defende o executivo Everaldo Barros, CEO da MAC Logistic, empresa especializada em logística integrada de carga projeto.

“Com a desburocratização de serviços das EADIs e a instalação de novos escritórios de órgãos do governo federal dentro desses lugares, os portos secos deixariam de ser meros armazéns de itens importados para se tornarem integrantes efetivos e eficientes de todo o processo de escoamento da safra no Brasil”, defende Barros.

Para ele, desde a sanção da Lei dos Portos nº 12.815, em junho do ano passado, várias ações judiciais vêm emperrando sua efetiva implantação no Brasil, especialmente no que diz respeito aos investimentos de dinheiro público em locais privados. Como consequência, as verbas para melhorar as atividades nas zonas portuárias não têm chegado, fato que vem travando cada vez mais as exportações de produtos nacionais ao exterior, principalmente do agronegócio.

“Por isso, o problema de logística relacionado às zonas portuárias do País está bem longe de ser resolvido. Daí a necessidade de buscar soluções mais viáveis e menos caras, como é o caso do uso das EADIs. O governo deveria adotar outras iniciativas, tratando efetivamente do problema de infraestrutura que está entre o campo e o porto marítimo, ou seja, do início ao final da cadeia produtiva do agro”, reforça o executivo.

Previstas na seção II do Decreto n° 6.759, as Estações Aduaneiras de Interior são áreas alfandegadas de uso coletivo, onde são realizadas operações de depósito e aceleração da emissão aduaneira de produtos que estejam sob controle alfandegário. Foram criadas no início da década de 1990, pela então Secretaria da Receita Federal, com o objetivo de aliviar o fluxo de mercadorias nos portos, aeroportos e pontos de fronteira em todo o Brasil.

CAMINHO MAIS CURTO

Para defender sua proposta, Barros exemplifica: “Se a minha mercadoria percorre 10 mil quilômetros de uma propriedade rural do Estado de Mato Grosso até o Porto de Paranaguá (no Paraná), por que não percorrer somente 200 quilômetros até uma EADI?”

Por isso, o executivo acredita que, se o governo pensasse no porto seco como alternativa para o atual entrave logístico, poderia, por exemplo, projetar as ferrovias destas localidades até a zona portuária.

“É claro que seriam necessários investimentos nas estradas, mas o processo seria encurtado, porque teríamos a interligação do campo com as diversas EADIs, por meio de um sistema ferroviário inteligente.”

Para que os portos secos atendam ao agronegócio, Barros ressalta que seria necessário implantar uma estrutura do governo federal para liberação da mercadoria, com fiscais da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e da Receita Federal do Brasil (RFB) dentro das Estações Aduaneiras de Interior.

“O custo seria bem menor que os investimentos previstos para os portos marítimos e o resultado viria mais rápido”, resume.

Embora não tenha como obter dados concretos, até porque o valor varia conforme a carga, o executivo aponta outro fator determinante para o uso dos portos secos: o preço cobrado pelos serviços oferecidos.

“Nesses lugares, as tarifas de armazenagem e movimentação são inferiores às cobradas nos portos. E quanto maior for o volume da carga menor poderá ser a quantia paga pelo serviço, seja na importação ou na exportação.”

Para reforçar sua proposta, Barros cita uma informação importante do Banco Mundial: o agronegócio desperdiça em torno de 7% da carga de produtos agrícolas, por causa da falta de logística e da ineficiente infraestrutura do País.

“Com a utilização dos portos secos, 80% destes 7% poderiam virar lucro para o setor. No entanto, é preciso montar estruturas adequadas dentro destas unidades, capacitando seus agentes federais para exercer todas as tarefas pertinentes à exportação dos nossos produtos.”

Barros acredita que o erro estratégico do sistema logístico brasileiro está no acúmulo de atividades exercidas pelas zonas portuárias, isto porque, mesmo com a modernização daquelas unidades, o gargalo não seria totalmente eliminado.

“Hoje, um porto seco armazena basicamente produtos importados, sendo que a lógica do momento seria utilizá-lo para melhorar o sistema logístico para exportação, cada vez mais crescente após sucessivas safras recordes”, reforça.

Barros defende que, no Brasil, é importante que o governo invista em portos marítimos, mesmo naqueles privados. Mas, em seu entendimento, o governo peca ao ignorar “a centralização das atividades e a manutenção da ideia de que para ser eficiente o porto precisa ser grande”.

“O ideal seria não investir dinheiro público em portos privados, assim como ocorre em outros países, como nos Estados Unidos. Infelizmente, esta não é a realidade do nosso País. Mas é errado tratar a zona portuária como local para armazenagem, já que é de conhecimento de todos que muitos caminhões ficam parados, em filas quilométricas, à espera para descarregar suas mercadorias.”

“Os portos secos, portanto, são mais que meros locais de armazenagem; poderiam ser aliados importantes para a logística na zona portuária. Isto porque, além de desafogar os portos marítimos, eles poderiam agilizar os processos de despachos aduaneiros ao executarem as mesmas operações, em uma área operacional muito maior e com custos inferiores”, garante Barros.

BUROCRACIA NÃO É O PIOR DOS PROBLEMAS, DIZ PRESIDENTE DA ABTTC

Presidente da Associação Brasileira dos Terminais Retroportuários e das Empresas Transportadoras de Contêineres (ABTTC), Martin Aron concorda que todo tipo de organização da logística – por meio de portos secos, como é o caso – para o transporte de cargas da produção agrícola no País é positiva. No entanto, ele diz que as distâncias percorridas serão as mesmas e com os mesmos problemas.

 

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‘A burocracia, por mais que ela entrave alguns pontos da exportação da produção agrícola, não é a total responsável pelos atuais gargalos, que são de infraestrutura’, afirma o presidente da ABTTC, Martin Aron. Foto: Divulgação

 

“Para o produtor rural, talvez ficasse mais viável encaminhar sua produção até o porto seco mais próximo. Mas e a estrada até a zona portuária? Se for um curto espaço, ainda assim o caminhão que sai da propriedade rural terá de passar por estradas cheias de buracos. E do porto seco até o porto marítimo? O caminhão também passaria pelas mesmas rodovias, que estão ruins. Outra coisa: onde os portos secos armazenariam milhões e milhões de grãos, por exemplo, porque nosso País também vem sofrendo com a falta de armazéns ou silos?”, questiona Aron.

Para ele, a burocracia nem sempre é a vilã para o desenvolvimento do agronegócio brasileiro.

“A burocracia, por mais que ela entrave alguns pontos da exportação da produção agrícola, não é a total responsável pelos atuais gargalos, que são de infraestrutura. É preciso pensar a logística por outros meios também, como é o caso do escoamento da produção pela calha norte do Brasil”, salienta o presidente da ABTTC.

De acordo com ele, um dos problemas de logística é que, hoje, apenas 20% a 25% do granel, principalmente o açúcar, chegam ao porto marítimo através da ferrovia, de trem; e o restante vem por rodovias. “Por isso, é necessário que o governo continue investindo nas estradas, mas especialmente na construção das ferrovias brasileiras.”

Aron destaca que, embora os problemas de infraestrutura e logística estejam longe de serem resolvidos, alguns gargalos já estão sendo sanados.

“Atualmente, nenhum caminhão chega ao Porto de Santos, por exemplo, sem agendamento. Daí não termos tido tanto congestionamento de caminhões, em 2014, no porto. Além disso, a safra deste ano foi visivelmente menor que a de anos anteriores”, aponta o presidente da ABTTC.

De qualquer forma, Aron concorda com Everaldo Barros, CEO da MAC Logistic, no que diz respeito a ações que posam vir a desenvolver a logística no País.

“Ter melhor eficiência para escoamento da produção agrícola, seja pelos portos secos ou por outros meios, será sempre bem-vinda, porque teríamos uma organização mais centralizada, com gerenciamento mais focado. Mesmo assim, não há como escapar: o governo precisa investir nas melhorias das estradas e na construção de mais ferrovias. Só assim nosso produto poderá ser tão competitivo quanto de outros países.”

 

Por equipe da SNA/RJ 

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