Política de estoques de grãos da China na berlinda

A TV estatal chinesa jogou luz sobre o assunto tabu que envolve a baixa qualidade dos grãos mantidos nos abarrotados armazéns governamentais, em um dos primeiros reconhecimentos oficiais de que os amplos estoques de produtos agrícolas do país podem estar bastante degradados.

Imagens secretas transmitidas pela emissora estatal CCTV no último fim de semana, em reportagem intitulada “Ratos no celeiro”, mostraram autoridades de armazéns estatais de grãos do nordeste da China comprando grãos velhos ou de qualidade inferior por preços com desconto, enquanto preenchiam documentos que mostravam que estavam adquirindo grãos novos ao preço fixado pelo governo e substituindo estoques velhos. Os preços dos grãos são subsidiados pelo governo chinês, que garante um valor mínimo.

Os estoques de arroz mostrados na reportagem já tinham germinado, mudado de cor ou cheiravam a mofo. “Com esse tipo de manipulação, é difícil garantir a qualidade. Se isso ocorrer, a conta será paga por todos nós”, conclui a reportagem da CCTV.

A verdadeira qualidade dos estoques de grãos da China tem importantes implicações sobre os preços mundiais das commodities. Se os estoques incluírem grandes quantidades de grãos não apropriados para o consumo, a China poderá ser obrigada a aumentar significativamente as importações, elevando os preços internacionais.

No entanto, se as reservas forem de boa qualidade, os esforços de Pequim para reduzir seus estoques, desovando-os no mercado, derrubarão os preços.

Os estoques de grãos da China ficaram inflados graças à política de preço mínimo do governo, que visa a garantir a renda dos produtores rurais e estimulá-los a cultivar grãos. Estima-se que a China detenha cerca de 40% dos estoques mundiais de milho.

Os planos de mudar a política de fixação de preços enfrenta a oposição de grupos respaldados pelo governo que se beneficiaram dela, como o órgão semimilitar Xinjiang Production and Construction Corps.

Um relatório da Câmara de Comércio dos Estados Unidos divulgado no início deste ano afirmou que a política de preço mínimo resultou em “enormes custos” para a Sinograin, a gestora dos estoques de grãos chineses.

As autoridades de planejamento central reconheceram que a China tem extensões de terra e volumes de água insuficientes para produzir a quantidade de grãos necessária para abastecer sua população de 1.4 bilhão de habitantes. A poluição generalizada do solo, principalmente no cinturão de arroz, no sul do país, reforça o argumento de que a China se sairia melhor cultivando produtos agrícolas intensivos em utilização de mão de obra e importando grãos, que requerem grandes quantidades de água.

Uma das propostas é reduzir o excesso de estoques acumulado nos últimos anos, afastando-se lentamente da política de autossuficiência em grãos, da era maoísta. Essa transição pode se revelar mais difícil do que parece se ficar patente que os estoques estão em avançado estado de degradação.

Os repórteres chineses testemunharam agricultores coagindo armazéns locais a pagar o preço mínimo por trigo que já ostentava brotos – produto que as processadoras não aceitariam.

 

 

Fonte: Valor Econômico

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp