Operação Carne Fraca: setor do agro apoia investigações de fraudes em frigoríficos

Ao lado do presidente da Abiec, Antonio Jorge Camardelli (à esquerda), o presidente da ABPA, Francisco Turra, diz que “é preciso separar o joio do trigo, pois se tudo for feito de maneira generalizada, massificada, como tem sido em relação a essa operação, poderemos ter problemas ainda maiores, não só em nosso setor, mas também no agronegócio como um todo”. Foto: Divulgação ABPA

A Operação Carne Fraca, deflagrada na sexta-feira, 17 de março, mobilizou governo e a iniciativa privada no apoio às investigações de irregularidades no controle sanitário das carnes e o envolvimento de algumas empresas no esquema de comercialização ilegal desses produtos nos mercados interno e externo.

Além da adulteração de produtos e venda de carne estragada e com data de validade vencida, a investigação apontou um esquema de corrupção envolvendo fiscais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e produtores de carnes. De acordo com o Mapa, 33 servidores públicos da Pasta foram afastados de suas atividades por suposto desvio de conduta.

Francisco Turra e Antônio Jorge Camardelli, respectivamente presidentes da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), reuniram a imprensa na segunda-feira (20), na sede da ABPA, em São Paulo, capital, para se posicionarem sobre a Operação Carne Fraca.

“Transparência e verdade, é com isso que estamos comprometidos. Este um momento em que todos os nossos esforços estarão direcionados na recuperação da imagem do setor”, disse Turra, que também é membro da Academia Nacional de Agricultura, da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA).

O presidente da ABPA usou uma expressão muito conhecida para definir a situação. “É preciso separar o joio do trigo, pois se tudo for feito de maneira generalizada, massificada, como tem sido em relação a essa operação, poderemos ter problemas ainda maiores, não só em nosso setor, mas também no agronegócio como um todo”, completou.

 

QUESTIONAMENTO

O vice-presidente da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA) Hélio Sirimarco, que também apoia as investigações, questiona a forma como a operação foi conduzida. Ele lembra que a Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal e a Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais divulgaram notas nesse sentido.

Segundo Sirimarco, o presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, o delegado Carlos Eduardo Sobral disse que a forma como a operação foi divulgada foi um erro.

“Sobral acredita que, se esse procedimento tivesse sido diferente, não causaria tanto impacto e haveria um entendimento entre a Polícia Federal e o Ministério da Agricultura, não para evitar que essas providências fossem tomadas e que as pessoas envolvidas fossem afastadas, mas para dar dimensão real aos fatos”, destacou.

 

Vice-presidente da SNA, Hélio Sirimarco ressalta que o presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, o delegado Carlos Eduardo Sobral, admitiu que a forma como a operação foi divulgada foi um erro. Foto: Arquivo SNA

PROCEDIMENTOS RIGOROSOS

Em relação aos países que importam os mais diversos tipos de carne do Brasil, o vice-presidente da SNA afirma que os procedimentos são muito rigorosos. Conforme explica, a China, por exemplo, para permitir que um frigorífico exporte carne, envia representantes para verificar, inspecionar e dar autorização. Além disso, o produto, quando chega ao país, é reanalisado.

“O Brasil conseguiu entrar no mercado internacional por oferecer produtos de qualidade e também por ser competitivo nos preços. Portanto, conquistar espaço e, de repente, encaminhar um produto de qualidade duvidosa, é dar um tiro no pé. Não faz muito sentido. É correr o risco de perder esse mercado.”, argumenta.

O vice-presidente da SNA lembra que são 21 unidades produtivas sob suspeita (18 no Paraná, duas em Goiás e um em Santa Catarina) e que estão impedidas de exportar, mas que continuam vendendo no mercado interno, que absorve 85% de produção brasileira de carne.

Segundo Sirimarco, algumas empresas citadas na operação “têm mercados muitos grandes e não vão fazer esse tipo de coisa, sob o risco de perder esses mercados”.

 

PROBLEMAS ISOLADOS

De acordo com a Abiec e a ABPA, a luta pela excelência em qualidade é uma constante e não se pode contaminar a imagem do setor em razão de problemas isolados. “Esses eventuais desvios de conduta nas fábricas nacionais de derivados de carne representam uma fração mínima da produção brasileira de proteína animal, devendo ser repudiados e combatidos”, argumentou Turra e enfatizou que os padrões sanitários da indústria de proteína animal brasileira sempre foram um modelo internacional.

“O que nos causa grande preocupação são os funcionários que atuam no setor”, observou Turra lembrando que mais de 7 milhões de brasileiros trabalham na cadeia produtiva de bovinos, suínos e aves. O presidente da ABPA acrescentou que indústria de proteína animal embarca, anualmente, 262 mil containers para 160 países, volume equivalente a 15% da receita total das exportações brasileiras.

Para Turra, a Operação Carne Fraca é uma iniciativa positiva, no sentido de defender a qualidade, a sanidade e os preceitos legais durante todo o processo produtivo, porém, ele afirmou que a forma como foi deflagrada a operação não foi a ideal. “Infelizmente, a informação e a ‘desinformação’ geradas sobre essa operação nos deixam fragilizados”, lamentou.

“Não tenho dúvida de que houve um grande equívoco ao disseminar essas informações de maneira negativa”, avaliou o vice-presidente e diretor Técnico da ABPA, Rui Vargas. Em sua opinião, o governo está tomando medidas “muito severas” para preservar o segmento.

Vargas questionou a possibilidade de se ‘maquiar’ as carnes, como foi denunciado pela operação. “Quem conhece um pouco do assunto, sabe perfeitamente que ácido ascórbico nada mais é do que vitamina C. Além do mais, não há nenhum produto químico que seja capaz de mascarar o estado de deterioração de uma carne”, explicou.

“É absurda a denúncia de que papelão tenha sido utilizado na produção de carne, já que o custo do papelão é muito superior ao da farinha, o que inviabilizaria uma redução nos custos de produção”, completou.

 

MERCADOS

Na visão do presidente da Abiec, Antônio Jorge Camardelli, “a forma como foi divulgada a operação, prejudica não só o mercado interno como, principalmente, as exportações e a abertura de novos mercados, algo que estamos há tempos trabalhando para conseguir”.

O executivo lembrou que, segundo dados da associação, que representa 91% das exportações brasileiras de carne bovina, a receita da cadeia produtiva, estimada no último ano, foi de R$ 458 bilhões. “Essa crise, gerada desnecessariamente, macula um trabalho árduo que realizamos em busca desses novos mercados.”

O presidente da Abiec informou ainda que havia uma expectativa de várias missões neste ano para a abertura do mercado dos Estados Unidos, mas essa certeza já não existe mais.

“A única certeza, agora, é que temos que trabalhar e, como disse o ministro da Agricultura, em reunião no domingo, precisamos pegar a mala, colocar debaixo do braço e retomar esses contatos”, citou.

Mesmo diante do novo cenário, o executivo acredita que a possibilidade de o Brasil perder o mercado externo para outros países é muito pequena. “A alta capacidade da produção brasileira, aliada à baixa competitividade dos outros países, é o que nos deixa um pouco mais tranquilos em relação a tudo o que está acontecendo.”

 

Presidente da Abiec, Antonio Camardelli acredita que a possibilidade de o Brasil perder o mercado externo para outros países é muito pequena: “A alta capacidade da produção brasileira, aliada à baixa competitividade dos outros países, é o que nos deixa um pouco mais tranquilos em relação a tudo o que está acontecendo”. Foto: Divulgação ABPA

SUSPENSÕES

Segundo o secretário-executivo do Mapa, Eumar Novacki, os órgãos competentes nos Estados Unidos e na União Europeia (UE) fizeram contato com o Brasil para questionar as fraudes.

A União Europeia suspendeu a importação de carne de quatro plantas brasileiras. Já China e Coreia do Norte, interromperam temporariamente as importações de carne bovina do Brasil. Vale lembrar que, juntos, China e Hong Kong representam o maior mercado de exportação de carne brasileira.

 

POSIÇÃO DO MAPA

Sobre a Operação Carne Fraca, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e a Polícia Federal (PF) emitiram o seguinte comunicado:

“1. A reunião ocorrida hoje (21) entre o secretário executivo do Mapa, Eumar Roberto Novacki, e o diretor geral da PF, Leandro Daiello Coimbra, teve como objetivo fortalecer a relação entre as instituições e reafirmar o compromisso de ambas em elucidar os fatos investigados.

2. A operação deflagrada na última sexta-feira (17) tem como foco a eventual prática de crimes de corrupção por agentes públicos;

3. Embora as investigações da Polícia Federal visem apurar irregularidades pontuais identificadas no Sistema de Inspeção Federal (SIF), tais fatos se relacionam diretamente a desvios de conduta profissional praticados por alguns servidores e não representam um mau funcionamento generalizado do sistema de integridade sanitária brasileiro. O sistema de inspeção federal brasileiro já foi auditado por vários países que atestaram sua qualidade. O SIF garante produtos de qualidade ao consumidor brasileiro.”

Dia 17 de março, em entrevista coletiva, transmitida pelo Facebook do Mapa, Novacki disse que “essa ação nos preocupa porque somos grandes players no mercado internacional e nossos produtos chegam com qualidade e bons preços a esses mercados”.

Na ocasião, Novacki orientou a população, no sentido de observar, nas prateleiras dos supermercados, se os produtos têm algum aspecto que não está de acordo, como aparência e cheiro. “Em caso de problemas, deve acionar o sistema de vigilância sanitária do Ministério, que tomará providências de forma enérgica”, orientou.

 

Por equipe SNA/SP

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