O número de pedidos de recuperação judicial no campo brasileiro deve dobrar neste ano em relação a 2019. Levantamento do escritório ERS Consultoria e Advocacia, de Mato Grosso, indica que foram apresentados 169 pedidos no ano passado, e projeta que esse número chegará a 340.
“Quando ocorre uma queda acentuada do PIB, como de 2008 para 2009, o número de recuperações judiciais no País, como um todo, dobra. Como esperamos uma queda no PIB deste ano, as recuperações judiciais seguirão a mesma tendência, e isso também se aplica ao agronegócio”, afirmou Euclides Ribeiro Junior, advogado e sócio fundador do escritório, ao Valor.
Segundo ele, nos meses de janeiro e fevereiro foram feitos oito pedidos de recuperação judicial no setor primário, dos quais sete foram deferidos. Para Carlos Deneszczuk, sócio da Dasa Advogados, os pedidos devem aumentar em ritmo mais acelerado no segundo semestre, devido aos ecos da paradeira observada desde março.
Ainda segundo Deneszczuk, a ferramenta tem sido utilizada por produtores do Matopiba (confluência entre Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) e de Mato Grosso. “Mas esperamos um movimento crescente também no sul do País, uma vez que a estiagem deste ano deixou muitos produtores em situação difícil”.
O advogado argumentou que, embora os preços de commodities como soja e milho tenham subido nos últimos meses com o dólar nas alturas, os custos de produção também aumentaram. “E muitos produtores têm dívidas antigas para quitar”, disse.
Entre os produtores que buscaram essa saída neste ano está Marco Gebert, do Grupo Gebert, de Poxoréo (MT), que teve a recuperação judicial deferida pela 2ª Vara Cível do município em 11 de fevereiro.
Com área de 4.500 hectares distribuída em três propriedades no estado, em Poxoréo, Gaúcha do Norte e em Novo São Joaquim, o grupo acumula dívidas de R$ 106 milhões. “Tentei todas as alternativas antes de entrar com o pedido”, disse o produtor de grãos e criador de suínos e bovinos.
Ele atribui o endividamento do grupo, que tem faturamento anual médio de R$ 20 milhões, às perdas com a produção de soja e milho. No caso da soja, chegaram a impedir o cumprimento de contratos. “Esperava colher 60 sacas por hectare e colhi 42, em um ano em que o custo de produção era de 50 sacas. Quantas safras de lucro eu teria que ter adiante para compensar essas perdas?”.
Gebert também teve prejuízos na suinocultura, atividade na qual mantém 1.000 matrizes, e chegou a perder R$ 100,00 por cabeça em 2016. “Não creio que foi um problema de má gestão, mas uma questão de mercado”.
A recuperação judicial também foi o caminho escolhido por Cláudio Brunetta, do Grupo Brunetta, de Balsas (MA). Focado na produção de soja e milho em uma área de 4.000 hectares, o grupo tem uma receita média anual de R$ 25 milhões e acumula dívidas de R$ 43 milhões com credores como o Banco do Brasil, Rabobank, Banco John Deere e Agrex.
Segundo Douglas Duek, CEO da Quist Investimentos, assessoria financeira que coordena a reestruturação, a recuperação foi aprovada em 13 de abril e o grupo terá até 13 de junho para apresentar um plano ao juiz e 180 dias para formalizar a negociação.
Duek informou que apenas em Balsas há cinco processos de recuperação em andamento acompanhados pela Quist. “A região tem fazendas muito grandes e produtivas que sofreram com a quebra de safra de milho em 2016”.
A Quist acompanha atualmente 13 recuperações judiciais no setor. “Haverá uma enxurrada de recuperações neste ano. Os bancos serão afetados pelas recuperações judiciais de outras áreas e devem restringir o crédito ao agronegócio, o que, por consequência, vai dificultar os negócios no campo”, afirmou Duek.
Valor Econômico