Muitas informações veiculadas em diferentes mídias têm gerado confusão e estremecido a confiança dos consumidores em relação à qualidade e à segurança de vários produtos alimentícios, principalmente no que dizem respeito às suas composições. Como resultado, surgem mudanças no comportamento e no perfil de muitos deles que, em uma tentativa de minimizar os riscos à saúde e obter outros benefícios, têm se afastado gradativamente dos alimentos tradicionais, abrindo espaço para o nicho dos “alternativos”, como orgânicos, zero lactose e sem glúten, por exemplo.
De acordo com Raul Amaral Rego, pesquisador da plataforma de inovações tecnológicas do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), vinculado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA), “o problema é que muitas destas informações não têm base científica consistente, para fundamentar tanto os riscos atribuídos aos produtos tradicionais como os benefícios alegados aos alimentos alternativos”.
O pesquisador afirma que todo ingrediente, substância, processo ou embalagem de um produto tradicional, que seja colocado sub judice, por qualquer motivo, tende a gerar um mercado alternativo bastante atrativo.
“Produtos alternativos representam um mercado lucrativo para empresas, uma vez que os consumidores, atraídos pelos pretensos benefícios, costumam pagar preços premium”, afirma ele, acrescentando que, além dos produtos naturais e orgânicos, nas gôndolas dos supermercados estão se multiplicando as opções sem glúten e sem lactose.
Conforme pesquisa realizada nos Estados Unidos, as razões mais frequentes alegadas para a compra de produtos gluten-free (sem glúten) são referentes a benefícios que não têm evidência científica suficiente para garantir sua eficácia, entre eles a melhoria da saúde digestiva, maior valor nutricional, perda de peso, saúde da pele, “limpeza” do organismo, alívio de estresse e depressão, dentre outros.
Em relação à pesquisa citada, Rego diz que “somente 5% dos entrevistados afirmaram optar por produtos livre de glúten devido à doença celíaca”. “À revelia da ciência, este mercado já atinge um volume considerável, com mais de 10% dos norte-americanos seguindo dietas livres de glúten. O Brasil parece estar indo na mesma rota em relação ao glúten”, avalia.
“A rejeição crescente à lactose é outro caso crítico de desconsideração da ciência, em favor de produtos com promessas infundadas. Além de diversas opções de lácteos com o termos “baixo teor de”, “livre de” ou “zero lactose”, verifica-se o lançamento de substitutos do leite. Além do tradicional leite de soja, o mercado brasileiro já dispõe de outros leites vegetais de arroz e aveia, aproximadamente dez reais mais caros que o bom e barato leite de vaca”, exemplifica.
COMIDA “DE VERDADE”
Segundo Rego, há profissionais que gostam de recomendar aos consumidores que só comprem comida “de verdade”, “sem rótulo” e sem ingredientes desconhecidos.
“De fato, uma pessoa que concorde em refutar alimentos que contenham, por exemplo, etil butanoato, fenilananina e ácido oxálico, entre várias outras substâncias químicas estranhas, então, não deveria comer mais bananas. Todos os alimentos são compostos por químicas, apesar de os leigos não saberem”, comenta.
Ele também afirma que, há décadas, os ingredientes alimentícios têm sido desenvolvidos pelos profissionais da área de ciência e tecnologia de alimentos, sempre com qualidade e segurança para o consumo, atestados pelas agências regulatórias, a partir de pesquisas.
IMPORTÂNCIA DO RÓTULO
De acordo com Rego, o rótulo é necessário porque os consumidores têm direito de saber o conteúdo daquilo que estão comprando. Produtos processados e comercializados como doce, polpa, sorvete ou bala de banana, por exemplo, precisam apresentar sua composição na rotulagem. “Daí deixam de ser comida de verdade?”, questiona.
Ele ainda acrescenta que “a crença netsa afirmação tem fomentado o mercado de produtos naturais, muitos deles processados, porém com a alegação de não utilizarem aromas, corantes, adoçantes ou conservantes artificiais”.
“É importante frisar que não há base científica consistente para poder afirmar que algum destes ingredientes sintetizados cause mal à saúde. Em determinados casos, existe alguma evidência, mas que não foi comprovada por meio de pesquisas com maior abrangência e rigor científico. Mesmo assim, muitos consumidores seguem optando por produtos sem conservantes, com corante e adoçantes naturais, entre outros apelos, naturalmente pagando mais caro por isso.”
Em relação à segurança, Rego afirma que os alimentos tradicionais são condenados pelo uso de produtos químicos na produção, apesar de, assim como os ingredientes alimentícios, também serem aprovados pelas agências regulatórias.
MELHORIA NA COMUNICAÇÃO
Na opinião do pesquisador, é necessário melhorar a comunicação com a sociedade, de modo a oferecer uma visão mais abrangente do agronegócio, “por meio de dados técnicos e científicos capazes de contrapor mitos, preconceitos e acusações arbitrárias, que transitam de forma arbitrária e teimam em contradizer uma realidade fundamentada em alimentos nutritivos produzidos, processados e distribuídos com qualidade, de forma segura e sustentável”.
Rego também destaca a necessidade de uma ação em grupo, visando a uma comunicação mais positiva. Neste sentido, ele conta que o Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital) está desenvolvendo o estudo “Brasil Processed Food 2020”, com o apoio de várias entidades representativas do agronegócio, instituições de C&T (Ciência e Tecnologia) e empresas, com o objetivo de gerar informações sobre a importância dos alimentos processados para a sociedade brasileira.
APOIO DA SNA
Para apoiar o setor no País, o Centro de Inteligência em Orgânicos (CI Orgânicos), mantido pela SNA em parceria com o Sebrae-RJ, lança o “Guia do Consumidor Orgânico – Como reconhecer, escolher e consumir alimentos saudáveis” (clique aqui e baixe o download gratuito).
A cartilha, desenvolvida por Moacir Roberto Darolt, engenheiro agrônomo e doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento Área de Difusão de Tecnologia do Iapar (Instituto Agronômico do Paraná), em parceria com o CI Orgânicos, apresenta informações sobre a agricultura orgânica, dicas práticas, além de sugestões para uma alimentação saudável.
O consumidor, desta forma, é orientado de forma consciente como e o que deve consumir. Leia também reportagem sobre o setor e o lançamento do novo guia em https://sna.agr.br/?p=25386.
Por equipe SNA/SP