Análise retrospectiva do mercado de leite elaborada pelo Cepea.
Equipe: Natália Salaro Grigol, Juliana Cristina dos Santos, Munira Nasrrallah e Laiane Aparecida dos Santos.
Segundo levantamentos do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP, 2019 foi um ano atípico para o setor de lácteos, marcado por sustentação dos preços no campo, em decorrência da oferta limitada e do aumento da competição entre os laticínios para assegurar mercado. E isso foi verificado num contexto de consumo retraído. O resultado: os preços ao produtor não seguiram a tendência sazonal de aumentos entre fevereiro e agosto e de quedas entre setembro e janeiro.
Segundo levantamentos do Cepea, as cotações no campo já iniciaram o ano em alta e a oferta restrita sustentou as consecutivas elevações de janeiro a junho. No período, foi verificado aumento real de 22 centavos por litro na “Média Brasil” líquida, com as cotações reais atingindo os mais altos patamares da série histórica do Cepea para um primeiro semestre.
No entanto, a estagnação econômica, a diminuição do poder de compra do brasileiro e a pressão das redes varejistas para atrair consumidores com preços baixos restringiram a valorização dos derivados lácteos. De acordo com pesquisas do Cepea, os preços médios anuais do leite UHT e da muçarela caíram de 2018 para 2019. A dificuldade das empresas em repassar a alta da matéria-prima para os lácteos sem comprometer as suas fatias de mercado espremeu as margens das indústrias. Com isso, a participação média anual do preço do leite ao produtor nas cotações do UHT e muçarela aumentou 10% e 8%, nessa ordem, de um ano para o outro.
Por esse motivo, pesquisadores do Cepea destacam que os preços do leite ao produtor registraram quedas em julho e agosto, que, sazonalmente, são períodos de picos de entressafra, apenas nestes dois meses, o recuo real foi de R$ 0,12/litro. Contudo, a competição entre indústrias para garantir a compra de matéria-prima continuou acirrada no terceiro trimestre, já que a produção não se recuperou. O desequilíbrio entre oferta e demanda levou ao encadeamento de altas nos preços dos derivados, no leite spot e, por fim, nos pagos ao produtor em setembro.
A produção de leite enxuta no que seria, sazonalmente, o início da safra acarretou em volumes mais baixos nos estoques de derivados, o que trouxe incertezas aos agentes. Assim, o intenso recuo que normalmente se observa no final do ano não foi verificado em 2019.
Pesquisadores do Cepea indicam que dois pontos explicam a oferta limitada no campo em 2019 e também o fato de a produção do 2º semestre não ter sido estimulada, mesmo com os preços favoráveis até a metade do ano, oposto ao ocorrido em 2017. O primeiro ponto é clima. De janeiro a março, as chuvas irregulares diminuíram a disponibilidade de pastagens e a produtividade das lavouras de milho; no 2º e 3º trimestres, o inverno seco prejudicou a captação leiteira no Sudeste e a produção do Sul não foi tão alta quanto se esperava. Por fim, o atraso das chuvas da primavera, que tipicamente marcam o início da safra do Sudeste e Centro-Oeste, limitou a recuperação da produção no último trimestre.
Em segundo lugar, se deve destacar que a restrição da oferta foi intensificada pela saída de produtores da atividade nos últimos anos e pela grande insegurança, verificada em anos anteriores e também em 2019, em realizar investimentos de longo prazo frente às incertezas no curto prazo. Assim, as dificuldades de 2017 e 2018 se desdobraram em efeitos de longo prazo, que impactaram negativamente a produção em 2019.
Pesquisadores do Cepea ressaltam, ainda, que o aumento dos preços dos grãos no encerramento de 2019 pode diminuir o potencial de crescimento da atividade. Ademais, as cotações atrativas no mercado de gado de corte têm incentivado o abate de vacas e podem, nos próximos meses, levar à destinação de parte da produção de leite para a alimentação de bezerros.
Fonte: Cepea