Dependente do comportamento da economia em geral pelo peso que têm os setores de alimentos e bebidas, a agroindústria do país corre o risco de patinar em 2019 e nos dois próximos anos, caso as reformas estruturais que estão na agenda do governo de Jair Bolsonaro e do Congresso permaneçam no atoleiro.
É o que aponta o Índice da Produção Agroindustrial Brasileira (PIMAgro) desenvolvido pelo Centro de Estudos em Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV Agro) e calculado com base, principalmente, nas variações do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-BR), da taxa de câmbio e do Índice de confiança do Empresário da Indústria de Transformação (ICI) da FGV.
Nos cruzamentos mais pessimistas entre esses dados – o que inclui o piso das estimativas para o PIB, com um dólar mais atraente para as exportações, o PIMAgro sinaliza crescimento de 0,22% para a agroindústria em 2019 e avanços de 0,16% em 2020 e de 0,1% em 2021. Nos cenários mais otimistas, que perdem força a cada semana de divergências em torno da reforma da Previdência, os incrementos chegam a 4,15%, 4,38% e 4,02%, respectivamente.
O professor Felippe Serigati, que liderou a criação do indicador, e a pesquisadora Roberta Possamai, que participou do processo desde o início, explicam que a agroindústria acompanha o comportamento da economia em geral mais de perto porque a participação de alimentos e bebidas em sua composição chega a quase 52% e que, nesses dois setores, a demanda é mais inelástica e atrelada à renda dos brasileiros.
“Em outros setores, como papel e celulose e carnes, por exemplo, os reflexos das exportações são maiores. Mas alimentos e bebidas dependem do crescimento da economia, e esse crescimento tem perdido fôlego em meio ao compasso de espera ligado ao ambiente político”, disse Serigati.
Da fatia de 51,6% dos produtos alimentícios e bebidas no PIMAgro, os primeiros representam 41,3% e os segundos, 10,3%. O grupo dos alimentícios é formado por produtos de origem animal (21,6%) e vegetal (19,7%), ao passo que o das bebidas se divide entre alcoólicas (5,2%) e não-alcoólicas (5,1%).
Entre os produtos não-alimentícios, que têm peso de 48,4% no indicador, o segmento têxtil é o mais importante (17,4%), seguido por produtos florestais (12,7%), insumos agropecuários (7,9%), fumo (3,8%), borracha (3,4%) e biocombustíveis (3,1%). A soja em grão, carro-chefe do agronegócio brasileiro, tem influência marcante sobretudo nas oscilações do segmento de insumos, que inclui fertilizantes e defensivos.
Os pesquisadores da FGV Agro realçam que os modestos crescimentos projetados para a agroindústria do país até 2021 virão depois de uma contração de 1% em 2018. Essa queda, afirmam, derivou dos efeitos do desgaste político do fim do governo Temer sobre o ritmo das reformas econômicas e também da greve dos caminhoneiros.
“Como a economia brasileira, durante 2017 a indústria e a agroindústria vinham recuperando o fôlego do seu crescimento, mas a trajetória mudou notadamente após a greve dos caminhoneiros”, escreveram Serigati e Possamai em sua análise. “O fato é que a greve prejudicou fortemente a agroindústria”, pontuaram.
Entre janeiro e abril de 2018 (o movimento dos caminhoneiros foi no fim de maio), o crescimento acumulado da produção agroindustrial do país chegou a 4,3% em relação ao mesmo período do ano anterior. Entre maio e dezembro, contudo, houve retração de 3,1%.
Nos quatro meses que antecederam a greve, apontam os cálculos da FGV Agro, os produtos alimentícios e bebidas acumularam crescimento de 4,1%, mas no restante do ano houve queda acumulada de 7,2%. No caso dos produtos não-alimentícios, houve ainda variação positiva no período pós-greve (1,8%) em 2018.
Com uma nova ameaça de greve dos caminhoneiros no ar, provavelmente em maio, a agroindústria instalada no país já sabe, portanto, que as projeções contidas no PIMAgro, que já não são nenhuma maravilha, poderão até piorar.
Valor Econômico