O ano passado foi marcado por discussões e turbulência no mercado de fretes rodoviários, diante da espera pelo julgamento sobre a validade da tabela de preços mínimos, que não ocorreu no Supremo Tribunal Federal (STF), e do descontentamento de produtores, tradings e caminhoneiros quanto aos valores praticados.
A incerteza perdura neste início de 2020, e com o andamento dos trabalhos de colheita de mais uma safra recorde de grãos no País, o transporte das cargas pelas rodovias deverá aumentar, em média, pelo menos 5% nos próximos meses, pouco acima da inflação. Em algumas regiões de maior concorrência, as altas poderão superar 10%. E o pico de demanda será em março, e não em janeiro e fevereiro, como foi em 2019.
Esse é o cenário traçado pelo Grupo de Pesquisa e Extensão em Logística Agroindustrial (ESALQ-Log), que acompanha de perto esse mercado e foi contratado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para destrinchar os custos dos caminhoneiros e bolar uma tabela de preços mínimos capaz de apaziguar os ânimos na cadeia produtiva.
Abner Matheus João, pesquisador da Esalq-Log, lembra que os grãos foram semeados nesta safra no período tradicional, e não antecipadamente, como no ciclo 2018/19, de forma que a colheita ganhará força a partir de fevereiro na maior parte dos polos, e não coincidirá com o escoamento de açúcar para exportação, o que aconteceu no ano passado. “Voltaremos a uma normalidade de demanda por caminhões”.
Em Mato Grosso, maior Estado produtor de grãos do País, de Sorriso ao terminal de Rondonópolis o preço médio do frete rodoviário foi de R$ 117,60 a tonelada em janeiro de 2019, caiu para R$ 116,97 no mês seguinte e para R$ 104,52 em março. Em 2020, o cenário traçado pela ESALQ-Log indica médias de R$ 105,58 neste mês, R$ 118,26 em março, 10,10% acima de janeiro do ano passado. Em outras rotas importantes para os grãos, o comportamento deverá ser semelhante (ver infográfico abaixo).
No Paraná, segundo maior Estado brasileiro produtor de grãos, a variação de preços médios poderá ser maior, de até 12%, porque o plantio da safra foi mais tardio. “Quando o Estado começar a colher soja, não haverá muitos caminhões disponíveis porque eles terão se deslocado para os Estados do Centro-Oeste, então as empresas terão que pagar mais caro para ter transporte, disse Abner.
Segundo o pesquisador, todos os preços praticados atualmente no mercado de fretes remuneram os caminhoneiros e estão acima dos indicados pela tabela de preços mínimos em vigor. “Pelos nossos cálculos, mesmo no período de baixa os motoristas estão recebendo o suficiente para pagar os custos, apesar de o cálculo de lucro ser controverso”. Uma nova tabela com preços corrigidos está sendo finalizada pela ESALQ-Log e deverá ser publicada pela ANTT até 20 de janeiro.
Mas essa não é a visão de grande parte dos caminhoneiros. “No período de colheita, conseguimos realmente os valores da tabela ou até acima, porque há muita demanda. Mas, durante o resto do ano, é um salve-se-quem-puder. Aceitamos qualquer coisa para não ficarmos parados, e muitas vezes temos prejuízo”, disse um deles ao Valor.
No segmento de fertilizantes, o chamado frete de retorno deverá subir apenas em linha com a inflação, ou entre 4% e 5%. “A normalidade da safra permitirá uma maior disponibilidade de caminhões no período certo, e os caminhões poderão ficar dois ou três dias nos portos para receber os fertilizantes antes de voltarem”, disse Abner Matheus João.
Durante a colheita de 2019, em algumas rotas o frete de retorno chegou a subir mais de 30% devido à necessidade de caminhões no campo ao mesmo tempo em que eram demandados nos portos para transportar os insumos. Na ocasião, tradings chegaram a pagar para os veículos voltarem vazios mais rapidamente.
Valor