Desde o início do ano, a Lei Kandir, que isenta de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) a exportação de produtos primários, está sob mais uma ameaça de extinção. De matriz neoliberal, o ministro da Economia, Paulo Guedes, já havia anunciado que a lei “morreu”. Agora, o novo texto da Reforma da Previdência prevê formalmente o fim desta norma.
Uma série de estudos técnicos e levantamentos feitos com base em dados oficiais, no entanto, emitem um alerta: a revogação da iniciativa seria desastrosa não só ao agronegócio, mas ao próprio país. Entre os efeitos colaterais, estão o desequilíbrio da Balança Comercial, a perda da competitividade internacional, o encolhimento da renda de produtores, além da queda do Produto Interno Bruto (PIB).
Aprovada em 1996, a Lei Complementar 87/96, que posteriormente passou a ser conhecida como Lei Kandir, foi criada durante o governo de Fernando Henrique Cardoso para estimular exportações e reduzir o chamado “Custo Brasil”. Deu certo.
O mecanismo criou um ambiente tão favorável que, em duas décadas, as vendas externas do agronegócio aumentaram mais de 480%. A Balança Comercial brasileira deficitária em US$ 5.5 bilhões em 1996 registrou um superávit de US$ 58.6 bilhões em 2018, graças às exportações do agronegócio.
Um dos principais exemplos é o da soja. Desde que a Lei Kandir começou a vigorar, a produção da oleaginosa avançou 421%, chegando a 23.1 milhões de toneladas, no ano passado. Esse aumento na produção foi puxado pelas exportações, que decolaram de forma ainda mais significativa: incríveis 2.200%. Segundo a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), este mercado movimenta R$ 40 bilhões por ano.
“A Lei Kandir veio em um momento em que havia necessidade de se oportunizar aos produtores competitividade no mercado internacional. A lei criou esse estímulo, que impulsionou a produção. Hoje, nós temos um volume de produção que depende da exportação. A lei tem papel determinante nesse cenário”, disse o economista Jefrey Albers, coordenador do Departamento Técnico e Econômico (DTE) da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep).
Consequências
O fim da Lei Kandir também poderia interferir na competitividade internacional, pesando contra os produtores brasileiros.
A volta da incidência de ICMS sobre a exportação de produtos primários iria trazer impactos, de imediato, a itens negociados em bolsas de valores, como a carne suína e a celulose, por exemplo. O repasse de ao menos parte do custo dos tributos praticamente tiraria os produtos brasileiros do jogo, dando vantagem absoluta a competidores estrangeiros.
No caso da carne suína, por exemplo, se o peso da tributação fosse incorporado ao preço do produto, o Brasil perderia espaço para seu principal concorrente externo, os Estados Unidos.
Hoje, os brasileiros exportam à Hong Kong e à China, respectivamente, a um preço médio de US$ 2.161,00 e US$ 2.114,00 a tonelada. Com o fim da Lei Kandir, a incidência dos tributos jogaria os preços da tonelada para US$ 2.528,00 para Hong Kong e US$ 2.474,00 para China. Neste caso, o preço norte-americano seria bem mais atrativo: US$ 2.255,00 a tonelada.
O que vai ocorrer é que, ou o produtor absorve essa diferença e vê sua renda encolher, ou repassa esse custo do ICMS ao consumidor final e perde competitividade. Em síntese, essa dinâmica pode simplesmente inviabilizar as exportações.
O aumento do preço de venda irá comprometer a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional. Caso contrário, haverá uma redução nas margens dos exportadores, em alguns casos, inviabilizando as exportações.
Agrolink