Estudo mapeia ação das tradings no Cerrado

Pela primeira vez, as maiores tradings de soja do mundo, incluindo as “ABCD”, a chinesa Cofco e a americana Glencore, apresentaram dados sobre sua atuação nos 25 municípios do bioma Cerrado que mais sofreram com a expansão do cultivo de soja em áreas de vegetação nativa desde 2014.

Segundo dados de relatório divulgado pelo Soft Commodities Fórum (SCF) neste mês, o grão adquirido por essas companhias nesse conjunto de municípios em 2017 resultou do desmatamento de 90.200 hectares.

Quase toda essa área desmatada (88.500 hectares) está na região de Matopiba – confluência entre Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Dos 25 municípios considerados “críticos” quanto ao desmatamento do Cerrado provocado pela soja, 23 estão em um desses estados.

A produção de soja do Matopiba representa 12% da safra nacional, enquanto a do Mato Grosso, onde estão os outros dois municípios do grupo, responde por 25%. Mato Grosso, porém, é uma fronteira agrícola consolidada há mais tempo que o Matopiba. Por isso, menos municípios do estado apresentaram desmatamentos críticos desde 2014, uma vez que o avanço da soja foi anterior.

Os municípios selecionados estão totalmente inseridos no bioma Cerrado, e neles o plantio de soja supera 5.000 hectares. Foi onde o cultivo do grão mais avançou sobre áreas de vegetação nativa após 2014, segundo dados da Agrosatélite e do Prodes, e onde há maior combinação de áreas de conversão para soja e presença das tradings pertencentes ao SCF.

O Soft Commodities Forum é uma plataforma ligada ao Conselho Empresarial Global para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD). Seus participantes – as americanas ADM, Bunge e Cargill, a francesa Louis Dreyfus Company, Glencore e Cofco, também compõem o Grupo de Trabalho do Cerrado (GTC).

O município em que, proporcionalmente, a maior expansão da área de soja em 2017 ocorreu nas regiões que tinham vegetação nativa foi Mirador (BA), onde 30% da área foi plantada com a oleaginosa naquele ano, após desmatamento. Também se destacam as cidades de Pium (TO), Goiatins (TO) e Carolina (MA), nas quais a retirada de vegetação do Cerrado respondeu por 27%, 20% e 19% da área plantada com soja naquele ano, respectivamente.

No Matopiba, Tocantins tem a maior concentração de municípios considerados críticos no que se refere ao plantio de soja em áreas desmatadas. Dos 25 municípios, dez estão em território tocantinense. Dos demais, cinco estão na Bahia, quatro no Maranhão e quatro no Piauí.

Apesar de o Matopiba concentrar as áreas onde a soja está mais associada ao desmatamento do Cerrado, a retirada de vegetação nativa representou, na média dessas 25 cidades, apenas 4% da área plantada com o grão em 2017. Naquele ano, o cultivo alcançou 2.4 milhões de hectares. Ficaram abaixo dessa média sobretudo as cidades baianas do Matopiba: Formosa do Rio Preto Correntina Riachão das Neves Jaborandi e São Desidério, além de Campos de Júlio (MT) e Ribeiro Gonçalves (PI).

Cada trading divulgou o peso desses 25 municípios no volume de soja adquirido no Cerrado e o quanto da soja que compra no Brasil vem do bioma. A Bunge é a que mais originou soja nesses 25 municípios dentro do volume total adquirido no país. Do montante originado em 2017 (direta e indiretamente), 15% veio dessas cidades. Em seguida ficaram Cargill (9%), ADM (7%), Cofco e Glencore (5%) e LDC (0,3%).

Dessas companhias, as únicas que informaram até o momento que estão direcionando recursos para ações contra o desmatamento foram Bunge e Cargill. A primeira lançou em 2018 um fundo de US$ 50 milhões em parceira com o Santander e a ONG The Nature Conservancy para financiar a expansão da soja sem desmatamento. No início do mês, a Cargill anunciou um fundo de US$ 30 milhões com o mesmo propósito.

Os dados do relatório compõem a primeira fotografia sobre a atuação das tradings nas regiões do Cerrado mais afetadas pelo desmatamento. A partir de agora, as companhias deverão divulgar números atualizados sobre esses 25 municípios a cada seis meses e em outras cidades que forem identificadas como prioridade.

 

Valor Econômico

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