Estudo aponta dificuldades para adoção da Integração Lavoura-Pecuária

Integração Lavoura-Pecuária no Rio Grande do Sul. Foto: Joseani Mesquita Antunes

Pesquisadores mapearam os principais desafios para adoção dos sistemas de Integração Lavoura-Pecuária (ILP) em quatro estados: Acre, Pará, Mato Grosso e Rondônia.

Fatores como a falta de mão de obra capacitada, a necessidade de elevado investimento inicial, a dificuldade de acesso a crédito, problemas estruturais de logística e obstáculos ligados ao mercado estão entre as principais dificuldades relatadas por produtores rurais e profissionais ligados às cadeias produtivas. O trabalho também mostrou quais os caminhos para que os sistemas integrados possam ser mais adotados.

Os resultados vão subsidiar a construção de cenários futuros para ampliar a adoção de sistemas de produção integrada, considerando as condições de mudanças climáticas e as variações de preços de insumos nessas localidades.

Desconhecimento das vantagens

Segundo a pesquisa, embora haja entendimento entre os produtores que adotam a tecnologia sobre seus benefícios, a maior parte dos que não fazem ILP desconhecem as vantagens dessa estratégia de produção.

“Conhecer a percepção dessas pessoas em relação às motivações e dificuldades da produção integrada e entender suas perspectivas quanto aos benefícios e impactos desses sistemas é essencial para internalizar a importância dessa forma de produzir e criar mecanismos eficazes para vencer os desafios para adoção dessa tecnologia”, disse a pesquisadora Rachael Garret, professora da Universidade de Boston (BU) à época da pesquisa, e atualmente vinculada ao Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (ETHZ).

Desafios para a adoção

Os resultados também mostraram que os produtores, sobretudo aqueles que já fazem a Integração Lavoura-Pecuária, reconhecem como benefícios da tecnologia o aumento da competitividade e da renda, a maior produtividade do gado e a redução de riscos de mercado. Porém, muitos obstáculos também foram relatados.

Entre os principais desafios para a consolidação da ILP em localidades amazônicas, apontadas pelo estudo, destacam-se as pendências em relação à regularização fundiária e ambiental das propriedades rurais, aspecto que limita o acesso a linhas de crédito, a ausência de assistência técnica continuada, o alto investimento inicial necessário para a aquisição de máquinas e implementos agrícolas e a falta de informação sobre esses sistemas.

Infraestrutura é fundamental

Além disso, o estudo mostrou que os elevados preços dos produtos agropecuários e problemas na logística da produção, ocasionados pela precariedade ou ausência de estruturas de armazenamento e pela má condição das estradas para escoamento da produção, também dificultam a adoção da ILP. Os entrevistados mencionaram ainda as limitações agroclimáticas de algumas localidades amazônicas, como a baixa capacidade de drenagem e encharcamento dos solos e o excesso ou escassez de chuvas.

Outro ponto relevante é a questão cultural. Muitos produtores, principalmente os pecuaristas, preferem permanecer em uma única atividade e não assumir o risco de novos financiamentos para iniciar uma atividade incerta.

“Percebemos, nesses atores sociais, certa relutância para adotar sistemas mais complexos como ILP e ILPF. Entretanto, isso não ocorre com produtores com espírito mais inovador. Para incentivar esses perfis de produtores inovadores, muitas barreiras precisam ser quebradas”, informou Joice Ferreira, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental (PA).

Inovação na troca de gerações

A pesquisa mostrou que uma questão-chave para driblar essa dificuldade tem sido a sucessão familiar. De acordo com o relatório final, os filhos que assumem as propriedades tendem a ser mais abertos às novidades. Entre elas, a adoção da Integração Lavoura-Pecuária. Além disso, o acesso à informação e à assistência técnica é fundamental para a maior adoção.

A proximidade com centros de pesquisa e Unidades de Referência Tecnológica também foi apontada como fator motivador para uso da ILP. Os pesquisadores destacam ainda que, de modo geral, no Acre e no Pará as dificuldades para adotar sistemas de produção integrada são semelhantes. Já em Mato Grosso, por ser um estado com forte tradição agrícola e melhor infraestrutura de fornecedores de insumos, armazenagem e transporte, há maior tendência de uso dessa tecnologia.

Mas ao mesmo tempo em que existe um contexto favorável ao uso dessa alternativa de produção, regiões mato-grossenses que se destacam pela tradição agrícola também apresentam limitações para adoção da ILP, devido à garantia de retorno financeiro em monoculturas de soja, milho e algodão.

Segundo o pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril, Júlio César dos Reis, os resultados obtidos com pecuaristas de Acre, Mato Grosso e Pará podem servir de parâmetro para toda a Amazônia. Porém, ele acredita que o cenário poderia ser um pouco diferente se abordasse agricultores, ou mesmo pecuaristas de outras regiões.

“No caso de agricultores, o ranqueamento das dificuldades e benefícios poderá divergir daqueles identificados na pesquisa, por serem mais ligados à questão da produção como negócio. Sendo assim, o aspecto cultural importaria menos. Se eles percebem a possibilidade de aumento de ganhos com a ILP, ficam mais propensos a mudar o sistema. Perfil semelhante pode ser encontrado com pecuaristas da Região Sul”, avaliou o pesquisador.

Fatores que podem aumentar uso da ILP

Segundo a pesquisa, a ampliação da adoção da Integração Lavoura-Pecuária passa pela intensificação de ações de pesquisa e transferência de tecnologia e, sobretudo, por medidas no âmbito político e financeiro.

Entre as alternativas recomendadas pelos pesquisadores está a regularização da situação fundiária de um grande número de propriedades rurais; a disponibilidade de crédito mais barato, com maior carência e segurado; aumento no número de Unidades de Referência Tecnológica com ILP e ILPF; capacitação de extensionistas para ampliar os serviços de assistência técnica no campo; melhoria na infraestrutura de estradas rurais e silos; melhor acesso a maquinários e silos públicos; modernização das cadeias de valor, com recompensas aos produtores pela produção sustentável; e fornecimento de incentivos por meio do pagamento por serviços ecossistêmicos e estímulo à mudança de cultura.

“Tínhamos o entendimento de que a deficiência de assistência técnica e o distanciamento da pesquisa científica eram as maiores limitações para uso da tecnologia. Mas o estudo evidencia que contar com linhas de financiamento adequadas é tão importante quanto os demais pontos”, disse Reis.

Segundo o especialista, os resultados da pesquisa servirão como indicadores da necessidade de mudança nas linhas de crédito existentes, como o Programa ABC, ou de criação de novas modalidades de apoio financeiro à produção.

“Em sistemas ILP e ILPF, o retorno financeiro é gradativo e a capacidade de pagamento do produtor aumenta aos poucos. Seria interessante, então, disponibilizar alternativas de crédito com maior prazo de carência e com parcelas maiores a partir de três ou quatro anos”, declarou o pesquisador.

 

Embrapa

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