Os primeiros resultados de um estudo sobre gestão financeira da propriedade rural, realizado no Acre, foram divulgados na quarta-feira (8), durante reunião técnica com pesquisadores, extensionistas, produtores e estudantes de graduação em administração, na sede da Embrapa, em Rio Branco. O trabalho desenvolvido pela instituição visa validar ferramentas simples e de fácil adoção que permitam ao agricultor familiar realizar o acompanhamento e controle das despesas e investimentos nas atividades produtivas e mensurar as receitas provenientes da produção.
Os testes com o sistema de gerenciamento financeiro do negócio rural iniciaram há um ano com agricultores do município de Acrelândia, que têm como principal atividade produtiva a pecuária leiteira. O trabalho consiste em registrar, semanalmente, em um conjunto de planilhas eletrônicas, informações relacionadas aos investimentos, despesas operacionais e receitas decorrentes da execução da atividade rural.
Segundo o analista Francisco Silva, coordenador do estudo, essas ferramentas ajudam o agricultor a compreender que na condução do trabalho rural, além dos custos de aplicação direta, como insumos e mão-de-obra, é preciso considerar gastos com manutenção da estrutura física da propriedade e despesas compartilhadas entre as atividades produtivas e a família, como consumo de combustível, energia elétrica e manutenção de veículo, que normalmente não são computadas no balanço econômico do negócio rural.
“Os registros sistemáticos dessas informações geram indicadores de desempenho econômico da atividade como receita total, renda líquida anual, custo unitário de produção e relação benefício/custo, aspectos que mostram se o negócio rural é rentável. Internalizar procedimentos de gestão como prática habitual é importante não só pela necessidade de avaliar periodicamente o desempenho econômico da atividade produtiva, mas também porque contribui para a tomada de decisão em relação ao negócio rural”, afirma.
Idealizado para facilitar o acompanhamento da atividade pecuária, o sistema de gestão em processo de validação é flexível e permite tanto a inclusão como exclusão de informações, o que possibilita a sua aplicação no gerenciamento financeiro de múltiplas atividades produtivas no contexto da agricultura familiar.
Resultados econômicos
A análise econômica realizada com os agricultores participantes do estudo revelou aspectos financeiros da atividade produtiva, mas também gargalos na gestão da propriedade. Segundo o pesquisador Claudenor Sá, para cada real investido na pecuária leiteira, retornam para o agricultor R$ 1,27. Em termos práticos, isto corresponde a um lucro líquido de 27% em relação ao total de recursos investidos na atividade.
Esse resultado, de acordo com Sá, indica bom desempenho econômico do negócio rural, mas o retorno financeiro pode ser potencializado com a adoção de procedimentos para reduzir custos de produção.
“Embora os indicadores econômicos mostrem que a pecuária leiteira se mostra economicamente viável, com ganho real para o agricultor, também indicam a necessidade de intervenções estratégicas com foco no aumento da rentabilidade financeira do negócio rural. Neste caso, o descarte de matrizes improdutivas permitirá adequar a taxa de lotação das pastagens, com melhorias na alimentação e no desempenho produtivo do rebanho leiteiro e reflexos positivos no retorno financeiro da atividade”, disse.
Importância da gestão
Gerir uma empresa implica planejamento, organização, acompanhamento de custos e conhecimento da atividade desenvolvida e de mercado. Segundo Francisco Silva, essa dinâmica de gestão também se aplica à propriedade rural, uma vez que, de modo geral, o gerenciamento de uma empresa inclui um sistema de entrada, processamento e saída de bens, produtos ou serviços, além do fluxo de capital.
Embora o gerenciamento de gastos e receitas seja um aspecto importante no contexto produtivo, geralmente é desconsiderado, o que torna a estruturação dos processos de gestão no campo um desafio para a maioria dos agricultores, especialmente no tocante ao controle financeiro da atividade.
Pesquisas comprovam que na agricultura familiar o hábito de registrar sistematicamente dados econômicos da atividade rural praticamente inexiste, seja por desconhecimento da funcionalidade dessa prática ou por resistência a inovações. Com o propósito de mudar essa realidade, desde 2014 a Embrapa tem investido na capacitação de profissionais da extensão rural como multiplicadores de conhecimentos no processo de adoção de mecanismos de gestão financeira da propriedade rural por agricultores familiares.
“A gestão financeira do negócio rural permite conhecer os custos, a rentabilidade da atividade produtiva e estimar as perspectivas de lucro. Além disso, possibilita visualizar onde estão os gastos mais expressivos da atividade e oferece subsídios para possíveis intervenções visando reduzir custos para aumentar a rentabilidade financeira do negócio rural”, explica Francisco Silva.
Na propriedade da agricultora Lidiane Morais, moradora do Ramal Nova Integração, a família está descobrindo, na prática, a importância do registro de informações sobre a atividade.
“No começo foi difícil porque não costumava fazer anotações, mas, aos poucos, junto com minha filha, estou aprendendo a organizar e preencher as planilhas. Sempre trabalhamos com pecuária de leite e antes a gente não tinha noção do quanto gastava nem dos ganhos financeiros porque as informações relativas às compras e à renda ficavam apenas na memória e depois eram esquecidas. Hoje sabemos que a atividade gera lucro e podemos pensar em investir mais no negócio”, disse.
Segunda etapa
Após a validação do sistema o esforço será no sentido de disponibilizar a ferramenta de gestão para o maior número possível de agricultores familiares e a extensão rural terá importante papel neste processo. Para o engenheiro agrônomo Ricardo Dantas, diretor da Consuplan, prestadora de serviços de ATER que atende cerca de 2.500 famílias rurais de cinco municípios acreanos (Brasileia, Assis Brasil, Porto Acre, Mâncio Lima e Rodrigues Alves), a gestão da propriedade rural pode direcionar o uso de tecnologias para melhorar o desempenho produtivo.
“Dispor de mecanismos de gestão que permitam avaliar o retorno econômico da atividade rural para o produtor possibilita também medir a efetividade das ações de Assessoria Técnica, Social e Ambiental (ATES). Neste aspecto, o sistema desenvolvido pela Embrapa vem atender a um antigo anseio das empresas que atuam neste segmento”, afirma Dantas.
A segunda etapa do trabalho será realizada por meio de um projeto aprovado recentemente pela Embrapa. O objetivo é avaliar o uso da ferramenta de gestão na pecuária leiteira em propriedades familiares com reduzido nível tecnológico e com adoção de tecnologias recomendadas pela pesquisa, comparando a rentabilidade da atividade nas duas situações.
Fonte: Embrapa