O otimismo que as indústrias processadoras de trigo demonstravam no início do ano desapareceu. Com o semestre quase encerrado, os moinhos brasileiros preveem agora um ano de margens mais apertadas diante da combinação de aumento do custo do trigo importado e persistente redução do consumo doméstico.
Diferentemente do que se esperava, o consumo de farinha de trigo continuou em queda ao longo do semestre por causa do alto nível de desemprego no país, afirmou Christian Saigh, presidente do Sindicato da Indústria do Trigo (Sindustrigo), que representa as indústrias paulistas, a jornalistas durante evento na sexta-feira (23).
Nos quatro primeiros meses do ano, a moagem de trigo em São Paulo – cuja indústria é voltada principalmente para atender à panificação – já caiu cerca de 5%, ou oito mil toneladas a menos por mês em comparação ao ano passado. Normalmente, o estado processaria 150 mil toneladas por mês. Como mesmo as melhores projeções econômicas não indicam uma reação expressiva do mercado de trabalho neste ano, o processamento no estado pode ser reduzido em 96 mil toneladas no ano, com queda de 5,3% em relação a 2016.
Essa percepção é compartilhada por executivos do segmento. Em apresentação realizada no evento na Fiesp, Edson Csipai, executivo do negócio de trigo da Bunge no Brasil, afirmou que até agora se acreditava que a demanda por farinha era estável. “Mas não é”, observou. Segundo ele, “pela primeira vez, a indústria se preocupa mais com a farinha do que com o trigo”.
Sem uma demanda que sustente as receitas dos moinhos, o controle dos custos passa a ser determinante. E, para uma indústria que depende da importação de matéria-prima, a disparada do dólar no último mês não foi uma boa notícia.
Nos cinco primeiros meses do ano, os moinhos importaram 2.6 milhões de toneladas de trigo – aumento de 18% na comparação com igual período de 2016, conforme dados do Ministério da Agricultura. Segundo Saigh, as importações se deram porque o trigo estrangeiro, oriundo principalmente do Mercosul, estava mais barato do que o cereal vendido no mercado interno durante a maior parte do tempo, quando o dólar estava entre R$ 3,10 e R$ 3,20.
Mas após a revelação dos detalhes da delação da JBS ao Ministério Público Federal (MPF), o dólar se aproximou de R$ 3,40, encarecendo as importações. Essa alta ocorreu em um momento em que os preços do próprio trigo também começaram subir, refletindo receios com a produção em algumas regiões do mundo.
“Neste momento, as indústrias já moeram o trigo barato e agora estão com trigo mais caro em estoque”, disse Saigh. Os armazéns das indústrias paulistas estão, em média, com trigo para garantir a moagem por 45 dias. “E não estamos conseguindo repassar esse custo”, observou. Segundo um executivo do setor, que não quis se identificar, os moinhos estão com uma margem “extremamente apertada”, o que já gera preocupações para financiar o caixa das indústrias, podendo inclusive levar a cortes de gastos.
A perspectiva é de que as margens do setor sejam ruins ao menos até o fim do ano. Já no início de 2018, a Argentina começará a colher uma safra estimada em 20 milhões de toneladas, com capacidade de exportação de 13 milhões de toneladas, o que deve elevar a oferta de cereal aos moinhos brasileiros. A alta do dólar após a delação dos donos da JBS elevou os preços do cereal importado, e aumentou os custos dos moinhos.
Fonte: Valor Econômico