O custo em real dos fertilizantes e defensivos usados nas lavouras de soja do país deverá superar, na safra 2020/21, o patamar observado neste ciclo 2019/20, cuja colheita está na fase final. Embora os preços domésticos do grão também estejam inflados pelo câmbio, uma vez que o Brasil lidera as exportações globais da oleaginosa, a tendência reforça a importância de o produtor adotar uma boa política de hedge e definir o melhor momento para travar vendas.
“Tudo em relação à safra 2020/21 será questão de timing. O custo de produção estava mais baixo que na temporada passada até o início do ano, mas agora subiu. Ainda temos sete meses de comercialização pela frente e o produtor tem de ficar atento para não comprometer seu resultado”, disse Daniel Latorraca, superintendente do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea). Em 2020/21, fertilizantes e defensivos deverão representar cerca de 40% do custo total dos sojicultores de Mato Grosso, maior estado produtor de grãos do Brasil.
Qualquer descuido no descasamento do câmbio usado na compra de insumos, grande parte dos quais é importada, e na venda da soja, poderá fazer do dólar, herói nas últimas temporadas, um vilão.
Segundo dados do Imea, 51% dos insumos que serão aplicados nas lavouras mato-grossenses de soja em 2020/21 já foram comprados, enquanto 30% de uma colheita prevista em cerca de 38 milhões de toneladas foi comprometida por, em média, R$ 109,16 a saca de 60 quilos. Em 2019/20, 81% das 34 milhões de toneladas estimadas foram comercializadas a R$ 82,01 a saca, em média.
No caso dos fertilizantes, a queda dos preços em dólar no fim de 2019 estimulou a antecipação de compras pelos agricultores. Mas, em março, o custo do adubo em Mato Grosso já foi estimado pelo Imea em R$ 807,63 por hectare na soja, 5% acima da média de outubro a março. Na comparação, o dólar subiu quase 15%. “E um impacto maior será sentido em abril, quando o dólar superou R$ 5,50”, afirmou Latorraca.
Marcelo Mello, consultor da INTL FCStone, pondera que os fertilizantes fosfatados poderão recuar. “Os preços em dólar subiram mais recentemente por causa do período de plantio nos EUA, mas a tendência de curto prazo é de queda em dólar”. No caso dos nutrientes derivados do potássio, porém, ele crê que a curva de baixa está perdendo fôlego.
A cooperativa paranaense Cocamar, que também atua em São Paulo e Mato Grosso do Sul, tem instruído seus associados a travarem custos, porque a relação de troca – sacas necessárias para a compra de uma tonelada de insumos, ainda está favorável.
Enquanto a soja subiu 25% nas últimas semanas, os principais insumos tiveram alta de 6%. “Este não é um ano para ficar com o negócio descasado e nem tentar acertar o olho da mosca”, disse Geraldo Amarildo Ganaza, gerente da Cocamar, que também teme problemas logísticos.
Lair Hanzen, presidente da Yara Brasil, líder em vendas de fertilizantes no mercado doméstico, concorda que a melhor estratégia é garantir que o adubo esteja dentro da porteira o quanto antes. “Até agora tivemos poucas interrupções logísticas por causa da pandemia, mas vejo com preocupação os efeitos de um possível lockdown”.
Na área de defensivos, em março houve alta de preços em real em todas as categorias de produtos em Mato Grosso. Em relação aos custos da safra 2019/20, os fungicidas ficaram 16% mais caros, os herbicidas subiram 3% e os inseticidas, 10%.
Matheus Almeida, analista do Rabobank, afirmou que no mercado internacional houve queda de preços, consumida pelo câmbio no Brasil. “Se olharmos os preços em dólar, vamos ver que o custo para o produtor está num nível bem próximo do que foi a safra passada”.
No início da pandemia, em janeiro e fevereiro, Almeida lembrou que problemas com embarques da China, que exporta parcela importante de matérias primas de defensivos, gerou dificuldades para países que necessitavam de pronta entrega, mas em março a situação se normalizou. “Não vejo problemas para a safra brasileira com relação às entregas da China, porque temos um bom tempo para receber esses insumos e fazer a distribuição interna”, disse.
Empresas do segmento como a israelense Adama, controlada pela ChemChina e focada em produtos genéricos, deverão repassar ao menos parte da alta do dólar para o mercado. “Em termos dos preços em dólar, não tivemos grande variação nos custos do glifosato e demais produtos na China. O ponto é que, com a alta do dólar, teremos um aumento dos custos para o produtor em real”, informou Romeu Stanguerlin, CEO da Adama no país.
A percepção da multinacional alemã Basf é mais ou menos a mesma. “Estamos monitorando de perto a situação e o desenvolvimento de fatores como câmbio e preço das commodities. Mas a desvalorização do real impacta nos custos e, consequentemente, na formação de preços”, disse Eduardo Novaes, diretor de Marketing da Basf no Brasil.
Para mitigar riscos, ele disse que é indicado o gerenciamento dos custos de produção via ferramentas como as operações de “barter”, com o pagamento dos insumos com parte da produção.
Valor Econômico