As cooperativas agropecuárias estão confirmando o protagonismo em uma de suas mais tradicionais atribuições: fomentar o uso de tecnologias. Com grande capilaridade, são 1.613 grupos em todo o País, com cerca de um milhão de associados, segundo a Organização das Cooperativas do Brasil (OCB).
Esses grupos assumiram o papel fundamental de “filtrar” e fomentar soluções e ferramentas e orientar os produtores sobre as práticas mais adequadas para suas regiões e atividades, de forma a garantir os ganhos de eficiência prometidos pelas novidades que se multiplicam aceleradamente no mercado.
É mais do que uma simples ajuda. Segundo o último Censo Agropecuário, 63% dos produtores rurais vinculados a cooperativas no País contam com assistência técnica, em comparação à média geral de 20%. E essa média tem enfrentado problemas para crescer frente à redução do papel do Estado, que enfrenta restrições orçamentárias.
Por essas e outras, as cooperativas ainda são os principais vetores “para os pequenos se tornarem grandes”, segundo Leonardo Meira Reis, analista de relações institucionais da OCB.
Para ele, é papel das cooperativas baratear o custo do avanço tecnológico, ou seja, torná-lo acessível, também com o compartilhamento de equipamentos, quando é o caso – já que hoje 50% da safra de grãos vem de produtores associados a cooperativas, e a maioria deles, 70%, é da agricultura familiar.
Experiências
É assim na Coopercitrus, maior cooperativa paulista, com sede em Bebedouro, e atuação também em Minas Gerais e Goiás, que faturou R$ 4.8 bilhões em 2019. Cerca de 80% dos 38.500 associados do grupo são de pequeno e médio portes.
Dedicados à pecuária, cana, grão, citricultura e hortifrútis, eles plantam uma área total de 10.2 milhões de hectares, e se mostram animados em testar novas tecnologias.
Fernando Degobbi, CEO da Coopercitrus, disse que, no ano passado, a divisão de Tecnologia Agrícola da cooperativa atendeu mais de 4.000 produtores em 2.5 milhões de hectares. O número está crescendo em 2020 e a expectativa é que 10.000 produtores sejam atendidos em 2021, em cinco milhões de hectares. Em 2019, afirmou Degobbi, a produtividade dos assistidos aumentou de 10% a 15%.
Marisa Contreras, produtora de café arábica em Areado (MG), foi uma das que recorreram a imagens de satélites e drones oferecidas pela cooperativa para expandir em 10% seu cafezal, até então de 100 hectares, e ampliar o adensamento.
“Íamos cultivar 42.000 plantas por hectare, mas conseguimos plantar 55.000”, disse ela, que produz 3.000 sacas por ano e exporta para Alemanha, Japão, Inglaterra e Argentina.
Mapeamento de dados
No caso de Mohamad Riad Perrone, da Agropecuária Bandeirantes, de Bebedouro (SP), a Coopercitrus criou condições para que fosse adotado um serviço de mapeamento de falhas em canaviais que permitiu reduzir de 27% para 4% o índice de manchas nas suas lavouras mais antigas.
A Bandeirantes tem 6.000 hectares de cana, 1.100 de cereais, 2.500 de integração-lavoura pecuária e um confinamento com capacidade para 12.000 animais. “Analisar os dados é algo que não cabe na minha agenda e, até por isso, temos um funcionário da Coopercitrus alocado com a gente em tempo integral”, afirmou Perrone.
Em 2020, a Coopercitrus investiu R$ 40 milhões na compra de equipamentos e na ampliação de sua equipe técnica. Encerrará o ano, assim, com 27 drones e 20 caminhões para aplicação de corretivos, em comparação a seis drones e dois caminhões no ano passado. O número de técnicos subirá de 55 para 112.
Investimentos e parcerias
Na Cocamar, de Maringá (PR), que faturou R$ 4.6 bilhões no ano passado, a estratégia para atender aos 15.500 cooperados do Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul, produtores de soja, milho e trigo em 850.000 hectares no total, é alimentada por investimentos com recursos próprios (o valor deverá atingir R$ 6 milhões no ano que vem) e por parcerias.
“A janela de plantio da soja, por exemplo, é muita curta, de 20 dias. Por isso, não dará para fazermos tudo sozinhos”, disse Elizeu Santos, gerente de agricultura de precisão da cooperativa.
Apenas o trabalho nessa frente em que ele atua, que começou há cerca de um ano e meio na Cocamar, já beneficiou 386 cooperados e abrangeu uma área de 62.800 hectares, e a expectativa é avançar para cerca de 450.000 hectares nos próximos cinco anos.
Avanço gradual
No que depender de Fabrício Maestrello, de Cruzeiro do Sul (PR), que rotaciona soja e milho em 800 hectares, o projeto terá sucesso. “No primeiro ano, fiz 100 hectares de agricultura de precisão e quero ampliar para 400 na próxima safra”.
Santos afirmou que a ideia é que o avanço seja gradual, para que o cooperado dê conta de seguir as recomendações do começo ao fim.
“Acredito que a pandemia ajudou a impulsionar a adesão a novas tecnologias, mas o fato de o produtor estar capitalizado também colabora”, afirmou o gerente da Cocamar, ressaltando que no Paraná está cada vez mais difícil investir em terras e o desafio é produzir mais no mesmo talhão.
Controle de gestão
Na Coamo, de Campo Mourão (PR), maior cooperativa agropecuária da América Latina, com quase 30.000 associados no Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul e faturamento de R$ 14 bilhões em 2019, o suporte começa antes da oferta de novos serviços, com o incentivo a um maior controle da gestão por meio de um aplicativo próprio e da ampliação das redes de internet.
Hoje, a cobertura não alcança sequer 10% dos cooperados, já que 80% deles moram nas fazendas. Segundo Marcelo Sumia, gerente de assistência técnica da Coamo, uma das prioridades no momento é levar antenas às áreas mal servidas e ampliar a conectividade, ainda um gargalo importante para a adoção de tecnologias no campo brasileiro.
Fonte: Valor Econômico
Equipe SNA