A contratação de crédito rural continuou firme no País em março, apesar das mudanças na rotina e das incertezas econômicas impostas pela pandemia do novo Coronavírus.
Segundo dados do Banco Central compilados pelo Valor, os desembolsos somaram R$ 15.2 bilhões, 50% mais que no mesmo mês do ano passado. O número de contratos também aumentou, de 105.700 para 134.300. Em relação a fevereiro desse ano, o aumento foi ainda maior: 63% nas liberações.
Com isso, o valor desembolsado pelas instituições financeiras já alcançou R$ 140.8 bilhões desde julho do ano passado, início da safra atual (2019/20), 11 % mais que nos nove primeiros meses do ciclo 2018/19 (R$ 126.9 bilhões).
O acesso aos recursos de pré-custeio na primeira quinzena de março e a ampliação de serviços digitais dos bancos ajudaram a sustentar o ritmo, segundo fontes. No mês, os produtores rurais contrataram R$ 8 bilhões em operações de custeio.
Desde o início da temporada, foram liberados R$ 77.1 bilhões nessa frente, um aumento de 9% em relação a igual período da safra anterior. O Banco do Brasil desembolsou R$ 4.2 bilhões para custeio em março, 75% mais que em fevereiro, quando a instituição anunciou uma linha para o pré-custeio de R$ 15 bilhões.
As contratações nas demais linhas seguiram tendências que já vinham dando o tom. O acesso a recursos para industrialização aumentou 75% desde julho, para R$ 9.1 bilhões. Com relação a investimentos, o aumento foi de 19,50%, para R$ 38.6 bilhões, mas na comercialização houve queda de 16%, para R$ 15.8 bilhões.
Agricultores familiares acessaram 18% mais de recursos do Pronaf nos nove primeiros desta safra 2019/20. Foram R$ 22.3 bilhões, e quase a metade, R$ 10.3 bilhões, para investimentos. No Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor (Pronamp), o aumento foi de 45% nos desembolsos totais (R$ 20.2 bilhões), também com destaque para investimentos, cuja demanda quase dobrou e atingiu R$ 2.09 bilhões.
No caso do Moderfrota, principal linha de investimentos do Plano Safra, fundamental para o mercado de máquinas agrícolas, o ritmo não mudou em março, apesar do anúncio de adiamento das feiras agropecuárias. Mas os desembolsos continuaram mais fracos e o total nos nove primeiros do ciclo ficou em R$ 4.9 bilhões.
Os recursos obrigatórios são a principal fonte do crédito acessado pelos agricultores, seguidos por poupança rural e Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), que chegaram a R$ 18.9 bilhões de julho a março. Quase 80% do dinheiro desembolsado (R$ 102.1 bilhões) tem juros equalizados e 20% (R$ 24.8 bilhões) são livres.
Segundo Fernanda Schwantes, assessora técnica da Comissão de Política Agrícola da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), os efeitos da pandemia nas contratações de crédito rural deverão ser sentidos a partir deste mês de abril. A oferta de pré-custeio ajudou, segundo ela, a manter o acesso aquecido em boa parte do mês de março.
“Os últimos dados não refletem a crise em função disso. Mas com cartórios fechados e agências bancárias com capacidades reduzidas, a tendência é de queda da contratação”, disse Fernanda. Mas ela reforça que a entidade ainda não recebeu relatos de falta de crédito na ponta.
Os principais bancos que atuam no setor agropecuário adaptaram a rotina para ampliar canais remotos de contratação e retiraram a obrigatoriedade de registro da operação em cartório, que poderá ser entregue posteriormente. Para Roberto França, diretor de Agronegócio do Bradesco, que lidera a concessão de crédito rural entre os bancos privados, o cenário está “conturbado”, mas o setor sofreu pouco até agora.
O Bradesco mantém a oferta de crédito aos produtores, apesar de ver os financiamentos de longo prazo prejudicados, como para a aquisição de máquinas. “Os bancos estão buscando alternativas para continuar a ofertar crédito para o setor, que deve sofrer menor impacto na economia”, disse França.
José Carlos Vaz, consultor e ex-secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, prevê um cenário de normalidade na oferta dos recursos oficiais para custeio, com liquidez garantida pelas ações do Banco Central, mas com pé no freio por parte dos produtores para novos investimentos.
Fonte: Valor Econômico