“Diversificação” tem sido um dos conceitos mais relevantes na construção de finanças robustas pelas sucroenergéticas.
Para extrair o potencial máximo da cana, os gestores das usinas têm buscado novos produtos e mercados, como hidrogênio verde, biogás, biometano, etanol de segunda geração (E2G), bioinsumos, leveduras, SAF e muitos outros caminhos.
Segundo a União da Indústria de Cana-de-açúcar e Bioenergia (Unica), dentre as rotas para a descarbonização da matriz energética brasileira, a contribuição do setor sucroenergético tem crescido e diversificado a oferta de renováveis para além do etanol e do bioeletricidade.
A entidade cita o crescimento do setor de produção de biogás que, por sua vez, é fonte para o biometano, combustível equivalente ao gás natural, mas com uma pegada de carbono bastante inferior.
Segundo levantamento da Associação Brasileira do Biogás (ABiogás), nos próximos cinco anos, 65 novas plantas de biometano devem começar a operar; outras 750 plantas de biogás já estão em funcionamento.
A Cocal, por exemplo, recebeu incentivo fiscal de R$ 14,45 milhões para a sua segunda planta de biometano. O grupo já produz o biocombustível em Narandiba (SP) e deverá construir outro empreendimento em Paraguaçu Paulista (SP). A companhia está investindo R$ 216 milhões na unidade.
Outro tipo de aposta feita pelas empresas vai além de diferentes tipos de energia. A Uisa, por exemplo iniciou a operação da sua fábrica de leveduras para o setor de nutrição e saúde animal. A produção é feita a partir do tratamento de leveduras usadas no processo de fabricação do etanol para que sejam vendidas como aditivo nutricional na produção de rações.
Para tratar deste assunto e comentar as iniciativas da companhia no mercado de carbono, na captação de financiamentos e relacionadas à economia circular, o NovaCana conversou com exclusividade com o gerente de sustentabilidade da empresa, Caetano Grossi.
Grossi será um dos palestrantes na sexta edição da Conferência NovaCana, que acontece em São Paulo nos dias 4 e 5 de setembro. Ele participará do painel “Economia circular: extraindo o potencial máximo da cana”, dedicado a expor as mudanças e necessidades de diversificação por parte das usinas e o espaço para novos produtos.
O painel também será integrado pelo diretor agrícola da Cocal, Jurandir de Oliveira Júnior, e o CEO da Granbio, Bernardo Gradin.
A programação completa da Conferência NovaCana 2023 já está disponível. Clique aqui para se inscrever.
A seguir, confira uma entrevista exclusiva realizada com Grossi sobre alguns dos temas que devem marcar presença no evento.
Recentemente, a Uisa iniciou a operação da sua fábrica de leveduras, anunciada em novembro do ano passado. Quais são as perspectivas da empresa com o empreendimento?
A Uisa, com a intenção de sempre fortalecer os seus pilares de ESG, vem buscando, através da circularidade de seus bioprodutos, uma alternativa para agregar o máximo de valor e produtos possíveis na sua cadeia de produção de cana-de-açúcar. A companhia investiu aproximadamente R$ 53 milhões na indústria, capaz de produzir 9,6 mil toneladas por ano. A planta é a maior de Mato Grosso no segmento de produção de leveduras e deu origem à Uisa Bionutrition, divisão especializada da empresa. Estamos enxergando muito potencial na cadeia de nutrição animal e estamos entrando nesse segmento com a nossa levedura. Fizemos um investimento importante na unidade e vamos buscar produzir com a melhor qualidade possível para atender os clientes desse segmento com um produto diferenciado.
Em janeiro deste ano, a Uisa também recebeu um financiamento de R$ 80 milhões do BNDES para construir uma unidade industrial de produção de biometano e biogás. Como está o andamento deste projeto?
A planta está localizada em anexo ao nosso complexo industrial em Nova Olímpia (MT). É resultado de uma joint-venture entre o a Uisa e a Geo Biogás & Tech. É um projeto pioneiro no estado, contando com uma capacidade instalada de 5 megawatt de energia elétrica e 31,2 mil normal metro cúbico ao dia de biometano. As matérias-primas da planta incluem, além de vinhaça e torta de filtro da Uisa, uma fonte de biomassa adicional, o que denota o caráter inovador do projeto. As Licenças Prévia e de Instalação já foram emitidas pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) e o projeto está em fase de instalação, devendo iniciar a produção de biogás no início de 2025.
Quais outras ações de economia circular a Uisa têm implementado em seu dia a dia, no campo e na indústria?
Nosso olhar está voltado para regeneração dos sistemas naturais, redução de poluentes, reutilização e reciclagem dos resíduos derivados de nossas atividades agrícolas e industriais. Atualmente, aproveitamos 100% da cana-de-açúcar e seus derivados, nossa principal matéria-prima. Além dos impactos positivos ao meio ambiente, ao reutilizarmos resíduos no processo de produção e na fabricação de novos produtos, conseguimos ampliar o número de empregos e gerar renda aos trabalhadores. E, como resultado, temos melhoria na qualidade de vida da população, fomentamos o desenvolvimento social e o crescimento econômico em nossa região. Nós estamos em melhoria contínua na implementação de boas práticas ambientais, sociais e de governança. Na Uisa, os resíduos gerados na industrialização do etanol, açúcar e saneantes se transformam em insumos para fabricação de novos produtos. Reutilizamos e reciclamos 92% dos resíduos gerados em nossas operações agrícolas e industriais, agregando valor a nossa cadeia produtiva. Em 2022, tivemos um aumento de 21% da reciclagem de nossos resíduos. Os resíduos são transformados em bioenergia, biofertilizantes, biomassa entre outros produtos e subprodutos. Praticamos economia circular em cada etapa.
Etanol celulósico e SAF, por exemplo, são produtos que estão no radar da Uisa?
Sim. Atualmente, estamos olhando e estudando atentamente produtos, principalmente sob a ótica de fornecimento e etanol celulósico e avançado, com baixo teor de carbono para atender a produção de SAF através das rotas tecnológicas aplicáveis. Inclusive, a Uisa possui a Certificação Low Carbon Fuel Standard do California Air Resources Board (LCFS-CARB), tendo toda a produção de etanol alinhada ao Padrão de Combustível de Baixo Carbono.
O que você considera que falta no setor para destravar negócios relacionados à economia circular e verde? Como eles podem se desenvolver com mais velocidade?
O principal desafio é o de agregar valor ao negócio, de forma que o produto carregue consigo uma maior rentabilidade. Na outra ponta, temos o mercado consumidor, que ainda está aprendendo a valorizar as iniciativas. As gerações mais jovens estão mais aptas a comprar produtos de segunda mão e alugar em vez de possuir – como aluguel e compartilhamento de veículos, por exemplo. A pegada de carbono dos produtos é um grande diferencial, que pode refletir uma nova tendência da moda e poder econômico desse novo público consumidor.
O que levou a Uisa a diversificar os seus produtos para além do etanol, açúcar e energia?
Produtos mais sustentáveis, originários de fontes limpas e renováveis, têm surgido graças à aliança entre sistemas biológicos, recursos naturais e utilização de novas tecnologias. O conceito de biorrefinaria é central neste processo, como ecossistema capaz de transformar a biomassa em uma infindável variedade de produtos. A Uisa se posiciona como biorrefinaria, estrutura que visa ao aproveitamento de todos os materiais presentes em nosso processo produtivo, alinhando a preservação do meio ambiente à prosperidade do negócio. Esse conceito permite a construção de um portfólio mais diversificado, integrando diferentes cadeias produtivas e matérias-primas, e a agregação de valor a subprodutos e resíduos do processo produtivo, como a vinhaça, torta de filtro, palha e o bagaço. Estamos buscando aproveitar melhor nossos resíduos e subprodutos.
Quais são as visões e planos da Uisa referentes ao mercado de carbono?
Em relação ao programa RenovaBio, a Uisa vem melhorando a sua Nota de Eficiência Energético-Ambiental tanto para o etanol anidro como para o etanol hidratado. Assim, podemos agregar valor na emissão de CBios e melhorar a nossa pegada de carbono. O aumento da nota está relacionado principalmente às boas práticas de agricultura regenerativa, garantindo a saúde e o bem-estar do solo. O mercado de carbono está em plena expansão, não somente no valor da tonelada de carbono como também em novas iniciativas para geração desses créditos.
Para além do RenovaBio, a empresa possui projetos nessa área?
A Uisa tem trabalhado em outras fontes de geração de carbono. Recentemente, anunciamos a geração de créditos de carbono de nossas áreas de vegetação nativa que compõe a nossa reserva legal e das Áreas de Preservação Permanente (APP), na primeira operação de créditos de carbono relacionados à preservação florestal (REDD+) emitidos pelo setor de cana-de-açúcar no país. A companhia já está explorando outras possibilidades de originação de créditos de carbono. Dentre os novos projetos, podemos destacar: a quantificação do carbono estocado no solo nas nossas lavouras de cana-de-açúcar e o BECCS que é a captura do CO2 biogênico da fermentação alcoólica para posterior utilização e/ou armazenagem. Além disso, a Uisa já gera outros tipos de crédito de carbono, como os I-RECs, de energia renovável, os créditos do programa Low Carbon Fuel Standard (LCFS) da Califórnia e os próprios Créditos de Descarbonização (CBios) do RenovaBio. Acreditamos que cada vez mais os créditos de carbono serão parcela relevante da receita dos nossos produtos, seja a partir da venda de créditos ou da agregação de valor ao transformar nossos produtos em itens com baixa pegada de carbono. Com isso em mente, estamos buscando trabalhar com os melhores parceiros em termos de certificação e transparência para que haja muita segurança em relação aos nossos impactos. Um exemplo disso é a nossa iniciativa do blockchain, que mostra aos nossos clientes todas as informações referentes a origem do produto que eles estão comprando.
A Uisa tem planos de expandir sua produção adquirindo ou construindo uma nova usina? Há apostas no etanol de milho?
A Secretaria de Estado Meio Ambiente (Sema) já emitiu as licenças prévia e de instalação da nossa planta de etanol de milho. Nossa previsão é iniciar as obras da nossa planta integrada a cana-de-açúcar entre 2024 e 2025. Com a nossa localização privilegiada para a originação de milho, entendemos que teremos uma usina muito competitiva e rentável.