Os Estados Unidos deverão ter neste ano uma safra de soja menor que a do Brasil, marcando a primeira vez em que os brasileiros aparecerão no topo da produção global da oleaginosa, uma posição de liderança que tende a se ampliar nos próximos anos. A afirmação é da Associação Brasileira das Indústrias de Óleo Vegetal (Abiove).
A produção dos EUA deverá atingir 116.48 milhões de toneladas de soja neste ano-safra (2018/19), segundo o USDA, que estima a produção do Brasil em 2018 (já colhida) em 117 milhões de toneladas.
“Se olhar o que está acontecendo, a gente tem crescido em área plantada entre 500.000 a 700.000 hectares por ano, numa tendência dos últimos cinco anos, coisa que os americanos não conseguem fazer. Eles expandem e voltam, porque fica a competição entre a soja e o milho”, disse o presidente da Abiove, André Nassar, em entrevista à Reuters.
Numa área plantada maior, os Estados Unidos produziram um recorde de 119.5 milhões de toneladas em 2017/18 (ano calendário 2017) – um volume de produção que está ameaçado pela recente colheita recorde brasileira, de acordo com consultorias privadas.
Na safra que os EUA vão plantar e colher neste ano, a expectativa do USDA é de que a área colhida de soja caia 1,45% na comparação anual, para 88.2 milhões de acres (35.7 milhões de hectares), enquanto no ciclo já colhido no Brasil a área atingiu cerca de 35 milhões de hectares, segundo o governo.
O Brasil, que já é há alguns anos o maior exportador global de soja, deverá colher 117 milhões de toneladas na próxima safra, com plantio a partir de setembro. É o que indica a estimativa divulgada na véspera pelo USDA.
O número é modesto perto do potencial de crescimento avaliado pela Abiove e levando em consideração as condições climáticas normais. A Abiove, aliás, estima que faz mais sentido comparar a safra já colhida pelo Brasil este ano com a que os EUA vão colher em 2018.
“O americano já está no limite máximo (de área), e pode ter uma safra melhor pelo clima bom, mas estruturalmente já chegou naquilo que cabe (na área para colher)”, afirmou Nassar, ressaltando que no Brasil a disponibilidade de terras agricultáveis é maior.
“O Brasil pode expandir o plantio mais facilmente”, ressaltou o presidente da Abiove, “porque tem um grande estoque de áreas abertas para pastagens no passado, que hoje podem ser utilizadas para o plantio de soja, de forma mais rentável pelo produtor rural, sem gerar preocupações ambientais por desmatamentos”.
“Enquanto houver esse estoque de terras, esse crescimento vai acontecer. Estamos falando de 500.000 hectares no mínimo todo ano, o que representa 1.5 milhão a dois milhões de toneladas a mais todo ano, no mínimo, e os EUA não tem essa capacidade”, ressaltou Nassar.
Ele acrescentou que cerca de 90% da área nova de soja se dá em pastagens convertidas em campos agrícolas. “Em qualquer condição de mercado a gente vai ter um crescimento de área”.
O presidente lembrou que o setor de soja tem sido impulsionado recentemente por melhores condições logísticas, pelos novos canais de escoamento da exportação pelo Norte, pela expansão da segunda safra de milho, que eleva a rentabilidade do produtor, e mais recentemente pelo câmbio.
Isso deve manter forte um setor que lidera a pauta de exportação do Brasil, com divisas recordes previstas para este ano de US$ 36.5 bilhões (considerando embarques do grão, farelo e óleo), segundo a Abiove.
Enquanto isso, os EUA estão às voltas com uma disputa comercial com a China, principal importador de soja. O país ameaça colocar uma tarifa de 25% para o produto norte-americano, que também é visto como um limitador para a expansão.
Vantagem?
O sócio-analista da Agroconsult, Douglas Nakazone, avaliou a mudança no ranking global de produção de soja como algo menos importante, e considera que há alguma desvantagem nesse movimento.
“Não muda nada. Afinal, o Brasil já é o maior exportador mundial há muitos anos. E, nos últimos anos, com larga vantagem sobre os EUA (…) Isso sim representou uma mudança importante na estrutura de mercado, pois o Brasil passou a ser formador de preços”, disse o analista.
Mas a mudança no ranking de produção, segundo ele, “não é necessariamente boa, pois significa, por exemplo, que variações cambiais no Brasil passam a influenciar com maior intensidade os preços em Chicago (bolsa de referência global)”.
Nakazone explicou que desvalorizações do real costumam causar altas nas cotações no mercado interno e, consequentemente, melhora nos níveis de rentabilidade dos produtores brasileiros.
Mas, na medida em que o Brasil passa a ter mais peso na formação dos preços internacionais, as variações cambiais poderiam pressionar as cotações em Chicago, amenizando aquele efeito positivo, já que em princípio também estimulariam o escoamento de mais produto ao mercado global.
“Veja os exemplos dos mercados de café e açúcar, em que o Brasil domina as exportações mundiais”, apontou o analista.
Fonte: Reuters