“Atraso” das exportações do País aumenta as preocupações dos produtores de milho

As tradings exportadoras de grãos do País estão postergando os pedidos de entrega do milho que será colhido este ano, conforme corretores que atuam nesse mercado. A situação preocupa os produtores, já que, por conta da necessidade de ampliação do período de armazenagem, tende a provocar um aumento de custos em um momento de maior pressão sobre os preços decorrente de uma oferta abundante no País e no exterior.

As empresas exportadoras costumam abrir a “janela” de embarques de milho entre junho e julho, mas neste ano o início das programações já está avançando para o segundo semestre. Além da maior disponibilidade do cereal, pesam nesse movimento o atraso da safra de soja e a greve dos caminhoneiros, que devem estender o período de escoamento da oleaginosa e, assim, ajudar a empurrar o do milho mais para frente.

“Temos visto compras das tradings, mas todas para [entrega em] setembro a dezembro”, disse Andrea de Sousa Cordeiro, analista da Labhoro Corretora de Mercadorias, de Curitiba (PR). Segundo Andrea, cresceu nos últimos meses a preocupação com o “timing” do mercado e com a possibilidade de que haja um estrangulamento nos embarques de grãos. “A safra de soja brasileira, por seu tamanho e pelo atraso que teve com a paralisação dos caminhoneiros, reduziu o fluxo de carregamento de cargas. Isso tudo vai alargar o período dos embarques de soja”, afirmou.

A expectativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) é que o Brasil colha 93.26 milhões de toneladas de soja nesta temporada 2014/15, 8,3% a mais que 2013/14 e um novo recorde. Para o milho, a projeção é de recuo de 2,3% na colheita total (que inclui a primeira e a segunda safra), para 78.2 milhões de toneladas – ainda assim um patamar elevado, tendo em vista o tamanho dos estoques.

Os armazéns cheios reforçam um horizonte de maior “conforto” para os compradores e de pressão sobre os preços pagos ao agricultor – mas, em contrapartida, poderão reduzir custos para empresas de aves e suínos e coibir picos inflacionários nessa frente, ainda que o câmbio seja positivo para a remuneração do produtor/exportador. A perspectiva da Conab é que os estoques finais de milho cresçam 22,5% no ciclo atual ante o passado, para 17.47 milhões de toneladas.

Ainda nos cálculos da autarquia, o Brasil exportará 20.5 milhões de toneladas de milho na atual safra. O volume é significativo, mas já distante das 26.2 milhões de 2012/13, quando uma quebra de produção nos EUA redirecionou compradores para o Brasil. Mesmo os chineses, que alimentavam expectativas de ampliar as importações, já dão sinais de que levarão um pouco mais de tempo para sair ao mercado como um comprador mais expressivo.

Como o apetite da China segue voraz pela soja (o país é destino de 70% da oleaginosa exportada pelo Brasil), os embarques do produto têm prioridade sobre os do milho na primeira metade do ano. Na sequência, ganham ritmo as exportações de milho, na medida também em que a segunda safra (safrinha) do grão começa a sair dos campos, principalmente em Mato Grosso. Nos primeiros meses de 2015, já houve embarques expressivos de milho – em janeiro e fevereiro, foram 4,3 milhões de toneladas, contra 4 milhões no mesmo período de 2014, segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex/Mdic) -, mas oriundos da safra passada. É o cereal da temporada atual que tende a sofrer com a maior lentidão na movimentação da soja.

A greve dos caminhoneiros na segunda quinzena de fevereiro, pico da colheita de soja, atrapalhou a movimentação da produção. E o calendário do atual ciclo já vinha mais apertado pelo atraso na semeadura da oleaginosa entre o fim de setembro e o início de outubro do ano passado, devido à estiagem que afetou importantes regiões produtoras.

“Há um atraso e uma dúvida se haverá um retorno da greve [dos transportadores]. Então, o comprador está numa situação delicada”, disse Rui Prado, presidente do Sistema Famato/Senar, que representa os produtores de Mato Grosso. Segundo ele, nos dez dias mais graves da paralisação, o Estado deixou de movimentar cerca de US$ 44 milhões por dia.

Ocorre que, jogando os embarques de milho para frente para escaparem também a alguma nova eventualidade logística, muitas tradings tendem a fazer o agricultor “carregar estoques”, conforme Cleida Zilio, gerente comercial de um condomínio de produtores em Campo Novo do Parecis (MT). “O produtor pode ter que ficar mais com o grão no armazém, com um custo que não é barato”, disse.

Nos cálculos de Cleida, estocar 1.000 toneladas de milho na região custa pouco mais de R$ 2.800,00 por mês. Aos preços atuais, o agricultor de Campo Novo do Parecis venderia essas 1.000 toneladas por cerca de R$ 275.000,00, tomando-se por base a cotação de R$ 16,50 a saca, para embarque em novembro. Diante disso, o custo da armazenagem pode parecer pequeno, ainda mais se levando em conta que o produtor vem capitalizado após três boas safras de grãos. Mas não deixa de ser um componente adicional para espremer as já apertadas margens desta safra – e aumentar as incertezas sobre o destino dos fartos estoques à disposição.

O Valor procurou a ADM, a Bunge, a Cargill e a Louis Dreyfus, as maiores tradings agrícolas que atuam no país. As três primeiras preferiram não comentar, enquanto a Louis Dreyfus, por meio de sua assessoria de imprensa, disse que “não prevê nenhum tipo de atraso nos embarques do milho”.

Por ora, a mudança de cronograma que está sendo percebida por produtores e corretores não está refletida nos “line-ups” (programação para o carregamento de grãos) dos portos. Em geral, dados sobre a previsão de chegada dos navios se tornam públicos de 30 a 40 dias antes do embarque.

 

Fonte: Valor Econômico

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