Do primeiro caso da Helicoverpa armigera no Brasil, em 2013, mais precisamente no município de Luís Eduardo Magalhães, no Oeste da Bahia, para este ano, a praga causou perdas no campo, mas trouxe com ela muitos aprendizados tanto para os pesquisadores quanto para os produtores rurais. Os prejuízos às lavouras atacadas pelo problema são praticamente incalculáveis, mas estima-se que passem dos bilhões, já que somente no primeiro ano teriam lesado os agricultores em US$ 2 bilhões, de acordo com dados da Associação do Produtores de Soja (Aprosoja), divulgados naquela ocasião.
De acordo com o pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo (MG) Ivan Cruz, o inseto continua a causar danos a diferentes espécies de planta, mas não mais na mesma intensidade dos anos anteriores, como foi no primeiro caso.
“Como acontece com a maioria dos insetos-pragas, a maior ou menor incidência em determinado cultivo e em determinado local depende de fatores abióticos, como temperatura, principalmente, e fatores bióticos, como os organismos benéficos, a exemplo de insetos parasitoides e predadores, e os microrganismos, como vírus, bactérias, fungos, entre outros”, explica o pesquisador, em entrevista à equipe SNA/RJ.
“Onde há desequilíbrio, portanto, especialmente pelo mau uso de práticas agrícolas com efeito negativo sobre os agentes de controle biológico natural, a presença da praga é sempre maior”, alerta Cruz.
Em sua opinião, até por causa da grande cobertura feita pela mídia, “houve naturalmente uma supervalorização da praga em todo o País”. “Este fato, com certeza, levou à tomada de decisão para o uso de medidas de controle, mesmo em locais onde a população da praga não era suficiente para tanto. Obviamente, com o passar do tempo, começou a haver o equilíbrio biológico nas áreas produtivas, onde diferentes agentes de controle biológico começaram a atuar sobre a praga.”
Cruz lembra que, mesmo com esta atuação, a população da praga ultrapassou o nível do dano econômico, à semelhança do que ocorre com outras. “Ou seja, ela entrou para a lista de pragas importantes, mas dentro de um patamar semelhantes às outras”, reforça.
INIMIGOS DA PRAGA: CONTROLE BIOLÓGICO
Para combater sua ação no campo, a Helicoverpa armigera conta com alguns fortes inimigos naturais, ou seja, nem sempre há a necessidade de aplicar defensivos agrícolas, de forma descontrolada.
“Basicamente, muitos dos agentes de controle biológico da praga em seu local de origem ocorrem no Brasil, como é o caso do parasitoide Trichogramma pretiosum ou do percevejo Orius insidious, ambos atuando sobre os ovos da praga, e, portanto, evitando qualquer tipo de dano na planta hospedeira”, informa Cruz.
De acordo com o pesquisador, vários outros insetos benéficos generalistas também têm tido um papel importante no controle natural da praga, como é o caso de diferentes espécies de outros percevejos.
“Existem também espécies de insetos benéficos associados às lagartas e pupas. São aqueles que, em sua fase jovem, geralmente estão dentro do corpo do inseto. Seus adultos, de vida livre, são muito ágeis e de difícil visualização no campo, podendo passar despercebidos. Mas ainda é inquestionável a atuação de cada um.”
Cruz informa que, no caso específico das pupas do inseto-praga, que se encontram no solo, “é surpreendente o nível de controle biológico natural, como demonstrado em um trabalho de dissertação de Mestrado em desenvolvimento na Embrapa Milho e Sorgo, em uma parceria da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária e a Universidade Federal de São João Del-Rei, Campus de Sete Lagoas (MG).
“Estrategicamente, o controle biológico deve ser realizado de maneira aplicada, via aquisição e liberação a campo do parasitoide de ovos Trichogramma, em associação com armadilha de feromônio para detectar a chegada da mariposa na área-alvo. Mesmo se o agricultor não quiser ou não tiver acesso ao Trichogramma, o uso do monitoramento é fundamental para ter sucesso no controle da Helicoverpa com outras técnicas. Por exemplo, pela pulverização com outros agentes de controle biológico (baculovírus, Bt, etc.) ou até mesmo com uso de inseticidas químicos seletivos.”
LIÇÕES
Após dois anos do surgimento do primeiro caso, Cruz acredita que a maior lição para o setor agrícola nacional é a de que “não estamos totalmente protegidos contra as pragas e por isto temos de conhecer muito bem o ambiente produtivo”.
“O Brasil é um país muito grande, e com vizinhos tão próximos, que é praticamente impossível evitar as entradas de pragas. Mas é possível retardá-las, especialmente pelo cuidado adequado no trânsito tanto de produtos agrícolas como de pessoas.”
Para ele, isto tudo também trouxe outro aprendizado: o agricultor, em especial, deve se capacitar ao máximo para ter condições de detectar qualquer anormalidade em sua área.
“Mais um ponto importante é a necessidade de se reconhecer o potencial que existe na natureza e, em especial, na biodiversidade agrícola brasileira em termos de agentes de controle biológico natural. Muitas das espécies fitófagas presentes em baixa população na área produtiva é exatamente pela ação destes agentes de controle.”
Cruz ainda orienta: “Ambiente equilibrado, além de manter a população de muitos insetos abaixo do nível de dano econômico, com certeza responderá muito mais rapidamente a qualquer aparecimento inesperado de novas espécies de praga. E este ambiente equilibrado só será alcançado com capacitação e conscientização de todas as pessoas envolvidas na cadeia alimentar, estejam elas no processo produtivo, ou sejam consumidores finais”.
Por equipe SNA/RJ