Por Enrique Ortega, Ana Beatriz Guimarães, Elisa Sayoko Nakajima e Jose Maria Gusman
Repensar os sistemas alimentares e sua governança é uma condição essencial para enfrentar os desafios atuais e futuros. Nas últimas décadas, os sistemas alimentares foram organizados verticalmente e passaram a fazer parte de uma rede de distribuição de energia fóssil, insumos químicos, maquinaria, sementes, novas tecnologias agrícolas e industriais que oferecem alimentos padronizados e oportunidades de emprego no espaço urbano.
Há, no entanto, a necessidade de políticas públicas e investimentos para oferecer meios de vida aos pequenos agricultores, buscar alternativas ao aumento da demanda energética devida ao aumento das cadeias de fornecimento de alimentos e cuidar dos impactos sobre a biodiversidade e o clima.
Essas preocupações precisam ser abordadas para tornar os sistemas alimentares mais eficientes (do ponto de vista holístico), inclusivos e resilientes. Todos os países são interdependentes e precisam convergir a um sistema multicultural realmente sustentável.
DESAFIOS
Um dos maiores desafios é conseguir uma governança (nacional e internacional) coerente, com objetivos claros e compromissos explícitos. A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável incorpora uma visão que vai além da divisão entre países desenvolvidos e em desenvolvimento.
O desenvolvimento sustentável é um desafio universal e uma responsabilidade coletiva de todos os países, exigindo mudanças fundamentais no modo como todas as sociedades produzem, consomem e reciclam.
Os direitos humanos devem assegurar às pessoas, independentemente de classe social e país, as condições básicas para viver com liberdade e responsabilidade, com igualdade de oportunidades, com proteção a biosfera e aos ecossistemas, com alimentação adequada, atendimento à saúde, acesso à água, à moradia, à educação, à informação e aos meios de produção para ter um trabalho de boa qualidade.
FALTA DE ÁGUA E TERRAS AGRÍCOLAS
O direito humano à alimentação adequada (DHAA) exige enfrentar a falta de água e terras agrícolas; a escassez e os preços altos dos produtos derivados do petróleo e dos minerais, e a exigência de produzir alimentos sadios.
Por outro lado, o modelo agrícola baseado em substancias tóxicas prejudica a saúde e a continuidade da oferta de alimentos. Cabe às instituições do Estado a responsabilidade de elaborar políticas públicas para garantir uma vida saudável as pessoas, de forma estruturante e sustentável.
A PRODUÇÃO DE ALIMENTOS E A SEGURANÇA ALIMENTAR
A produção de alimentos nos últimos 150 anos passou a ter relações econômicas, sociais e políticas vinculadas a um projeto de dominação mundial. O aumento da área agrícola ocorreu às custas da redução das áreas dos ecossistemas naturais e da expulsão das populações nativas.
A maior parte dos insumos industriais não é renovável e causa grande impacto no meio. A “modernização” da agricultura exigiu a substituição das variedades locais por espécies importadas; e isso coloca em risco a conservação da biodiversidade.
Na agricultura, houve, ao mesmo tempo, grande desmatamento para a expansão da área e uma intensificação no uso de recursos não renováveis, assim se chegou ao pico máximo de produção e de externalidades negativas.
A política agrícola e alimentar precisa ser reformulada, pois o tipo de agricultura adotada no mundo emite grandes volumes de gases de efeito estufa, o que agrava as mudanças climáticas (FAO, 2017). Por outro lado, os projetos da economia global afetam tanto os modos de produção quanto os hábitos de consumo.
Hoje, o sistema alimentar gera desnutrição, subnutrição, sobrepeso, obesidade, fome e doenças crônicas, a principal causa de morte entre adultos.
A condição atual é de insegurança alimentar e isso deve preocupar a universidade.
O COMPROMISSO COM A SUSTENTABILIDADE
A gestão dos ecossistemas deve garantir tanto os direitos humanos quanto os da natureza, através de modelos sustentáveis de produção, consumo, reciclagem e gestão dos recursos comuns.
A manutenção da biodiversidade só é possível com a valorização dos conhecimentos das populações tradicionais que tem mantido vivo o material genético por milhares de anos.
Há a necessidade de resgatar os conhecimentos ancestrais que propiciam a conservação da biodiversidade, para superar a fome e buscar uma interação saudável entre as populações humanas e o espaço rural agrícola e das áreas preservadas para proteger o meio ambiente.
O PAPEL DA UNIVERSIDADE
A Unicamp foi a primeira universidade da América Latina a oferecer o curso de Engenharia de Alimentos; sua referência foi o currículo da Universidade da Califórnia, baseado no uso de energia fóssil e o uso predatório de recursos naturais, no qual estão ausentes os conhecimentos sobre Mudanças Climáticas, Sustentabilidade, Resiliência, Equidade, Diversidade Cultural. Esse currículo foi implantado na América Latina inteira, sem nenhuma crítica a sua proposta epistemológica.
Convém a Unicamp, aos 50 anos de vida, revisar de forma crítica seus currículos e proceder a integração deles por meio de projetos de ensino, pesquisa e extensão transversais que atendam os direitos humanos e os da natureza.
Esta seria a forma adequada para garantir que seus profissionais possam atuar de forma consciente e proativa na transição rumo a uma sociedade global sustentável, resiliente, equitativa e poli cultural, pois as mudanças climáticas nos obrigam a mudar de rumo.
OS PESQUISADORES
A LAVOURA Nº 711: ESPECIAL ‘PERDAS E DESPERDÍCIOS DE ALIMENTOS’
Veiculada há 121 anos pela Sociedade Nacional de Agricultura, a Revista A Lavoura já debateu, em diversas ocasiões, sobre a questão da segurança alimentar no Brasil e no mundo, especialmente quando envolve as perdas e desperdícios de alimentos do campo à mesa.
Leia gratuitamente a edição nº 711/2015, clicando aqui!
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Fonte: Jornal Unicamp com informações da Revista A Lavoura