Por Fernando Mendes Lamas *
No Brasil, falar sobre a importância dos agricultores familiares é algo que chega a ser redundante. Muitos dos produtos que chegam à mesa da população brasileira, tanto sob o ponto de vista quantitativo quanto da diversidade, têm origem na agricultura familiar. Alguns deliciosos exemplos, são: o queijo da Serra da Canastra, o moranguinho, a amora, a uva, o feijão, as verduras, a mandioca, dentre vários outros alimentos.
Talvez, o maior desafio dos agricultores familiares, especialmente daqueles que estão localizados em regiões de pouca tradição com agricultura familiar, é desenvolver atividades que lhes assegurem renda. Sem renda, não é possível ter acesso aos bens necessários para a sobrevivência das pessoas com condições mínimas de dignidade e, muito menos, aos recursos tecnológicos indispensáveis para assegurar a competitividade do negócio.
Portanto, é necessário promover esforços no sentido de melhorar a geração de renda dos agricultores familiares. Mas, como isso pode ser feito? A geração de renda pode se dar por meio de alguns fatores, tais como: melhorias no processo de comercialização, pela redução dos custos de produção, pelo aumento da produtividade, dentre outros.
Em artigo intitulado “Pequenos Estabelecimentos também enriquecem? Pedras e tropeços”, publicado na Revista de Política Agrícola, nº 3, 2015, Alves explica que o grande desafio para aqueles que se dedicam a prestar orientações aos agricultores familiares consiste em mitigar os efeitos das imperfeições do mercado.
Devido às imperfeições de mercado, a pequena produção é vendida por preço muito inferior ao da grande e, ainda, seus insumos são adquiridos por preço mais elevado. Tais imperfeições inibem a adoção de tecnologia para pequenas produções e, por isso, os pequenos produtores, em volume de produção, não se livram da pobreza, o que os impede de crescer e se transformarem em médios ou grandes produtores de alimentos.
Desta forma, se as imperfeições do mercado inibem a adoção de tecnologia, nada mais lógico do que trabalhar para a superação dessas imperfeições. A tecnologia é fundamental para o crescimento da produção e da produtividade e, consequentemente, para a melhoria do nível de renda.
Ela possui um papel importante na determinação do desempenho econômico-financeiro dos estabelecimentos agropecuários, pois, além de permitir a elevação da produtividade do trabalho e do total dos fatores, também estabelece elos, que têm importante efeito (negativo ou positivo) sobre a sustentabilidade das atividades, como reforça Souza Filho, em seu artigo intitulado “Condicionantes da adoção de inovações tecnológicas na agricultura”, publicado no Cadernos de Ciência & Tecnologia, volume 28, de 2011.
Como o agricultor familiar pode vender melhor a sua produção? Para essa pergunta existe uma única resposta: Organização! Portanto, há necessidade de um esforço integrado no sentido de melhorar o nível organizacional dos agricultores familiares.
É preciso trabalhar muito fortemente a questão do cooperativismo, como meio para mitigar os efeitos das imperfeições do mercado. Um exemplo emblemático de como a organização dos produtores em cooperativas é fundamental, é o caso da avicultura de corte no Estado do Paraná. Hoje, o Paraná é líder isolado na produção de frangos de corte e todo o processo está ancorado em um sistema cooperativo que integra dezenas de agricultores familiares.
Organizados em cooperativas e/ou associações, os produtores vão comprar os insumos necessários para a produção por preços bem menores que comprariam isoladamente. A partir da organização da produção, eles também irão conseguir melhores preços pelos seus produtos em função da escala, resultante do processo organizacional.
Algumas políticas públicas, como o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), a compra antecipada e a preferência à agricultura familiar na compra de alimentos para a merenda escolar, por exemplo, têm como objetivo central lutar contra as imperfeições de mercado. No entanto, os resultados dessas políticas serão tanto maiores quanto melhor for o nível organizacional dos produtores.
Parece simples, mas trabalhar de forma organizada, utilizando metodologia adequada, considerando todas as variáveis envolvidas no processo de educação, em que a visão do todo deve ser predominante em relação à visão individual, é algo que exige muito daqueles que se propõem a trabalhar nessa direção.
É muito mais um trabalho intelectual do que um esforço físico. De nada adianta o conhecimento e as recomendações técnicas se não estiverem dentro de um contexto maior, onde a visão de produto deixa de existir, passando a predominar a visão de processo de forma coletiva.
Em resumo, só haverá o crescimento dos agricultores familiares ou pequenos agricultores, quando efetivamente forem envidados esforços para a superação das imperfeições do mercado, especialmente na organização dos produtores. Caso contrário, os esforços não serão traduzidos em resultados, em que o principal deve ser a geração de renda para assegurar a capacidade de modernização dos processos e a melhoria da qualidade de vida.
* Fernando Mendes Lamas é pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, engenheiro agrônomo, mestre em Fitotecnia (Produção Vegetal – Manejo do Algodoeiro) e doutor em Agronomia (Produção Vegetal – Reguladores de Crescimento)
Fonte: Embrapa Agropecuária Oeste (MS)