A Argentina acelerou suas exportações de carne bovina para a China e desbancou o Brasil como principal fornecedor externo do produto para o país asiático nos primeiros sete meses deste ano.
Dados da alfândega chinesa compilados pela publicação “Beef to China” mostram que, de janeiro a julho, os embarques argentinos alcançaram 186.000 toneladas – contra as vendas brasileiras de 180.000 toneladas – e renderam US$ 870.1 milhões, mais que o dobro em relação ao mesmo período de 2018.
O volume vendido representou 70% das exportações totais de carne bovina da Argentina no período, e 21,70% das importações da China. A participação brasileira foi de 21%.
“A diferença é marginal. Mais importante que isso é o aumento das exportações argentinas em si, porque a China é um mercado de volume importante”, disse ao Valor o presidente do Consórcio de Exportadores de Carnes da Argentina (ABC), Mario Ravettino. Pelos seus cálculos, os embarques de carne bovina da Argentina deverão atingir, no total, a 720.000 toneladas em 2019, ou US$ 4 bilhões.
Nesse patamar, destacou o presidente, a Argentina vai se manter pelo segundo ano consecutivo no ranking dos dez maiores exportadores de carne bovina do mundo. Em 2018, o país ocupou a sexta posição, com embarques de 550.500 toneladas, atrás de Brasil, Índia, Austrália, EUA e Nova Zelândia. Neste ano, poderá chegar à quinta posição.
“É preciso ver como fecharemos o ano e como será o desempenho dos competidores”, disse Ravettino. Do terceiro lugar em 2005, atrás somente de Brasil e EUA, a Argentina caiu para a 14ª posição, após a intervenção do governo no mercado com a imposição de preços internos e barreiras às exportações.
No período de queda, a Argentina ficou atrás até dos sócios menores do Mercosul: Uruguai e Paraguai. Muitos criadores converteram áreas de pastagens em lavouras de soja e o país perdeu 10 milhões de cabeças bovinas. Mais de 100 frigoríficos foram fechados e quase 20.000 pessoas ficaram sem trabalho. As medidas do então governo de Cristina Kirchner (2007-2015) tinham o objetivo de “garantir a mesa dos argentinos” – slogan que marcou o setor.
Os argentinos têm um elevado consumo per capita de carne bovina, que chegou a alcançar, em 2007, 69,4 quilos. Hoje, o consumo total por pessoa de proteínas animais no país é de 112 quilos, dos quais 51 de carne bovina, 40 de frango e 16 de suínos. O restante é dividido entre cordeiros e peixes, entre outros produtos.
Com a alta da inflação, que não dá trégua, o consumo interno caiu 11,30% nos primeiros sete meses de 2019 em relação ao mesmo período de 2018, segundo dados da Câmara da Indústria e Comércio de Carnes e Derivados (Ciccra).
Longe de entrar em crise, observa o Instituto de Estatística e Censos (Indec), a indústria argentina opera atualmente com 90% de sua capacidade para uma produção anual projetada em três milhões de toneladas, segundo Ravettino.
Entre os principais frigoríficos que operam no país estão os brasileiros Minerva, que lidera as exportações argentinas de carne bovina para a China, e Marfrig. Maior empresa de proteínas animais do mundo, a também brasileira JBS vendeu ativos para a Minerva e não atua mais na Argentina.
Se as exportações totais de carne bovina do país de fato superarem a barreira 700.000 toneladas, como prevê Ravettino, o volume será praticamente o dobro do observado no ano passado.
Desde o começo do governo de Mauricio Macri, a estratégia oficial esteve focalizada na conquista de novos consumidores e, especialmente do gigantesco mercado asiático, que compra todo tipo de cortes, diferentemente da Europa, destino dos cortes nobres.
“São mercados diferentes. Com a China temos volume e com a Europa temos preço. Mas nossa estratégia é vender para todos os países”, afirmou Ravettino. Indagado sobre se o aumento das exportações não levaria a uma escassez de oferta a preço acessível no mercado doméstico, problema similar ao que ocorreu quando o governo Kirchner limitou as exportações, o empresário disse: “Há carne para todos os mercados”.
“O mercado doméstico não corre nenhum risco de que falte carne, e o preço da carne sobe menos que a inflação”. Ravettino disse que quanto maior lucro que a indústria obtém com as exportações, mais oferta haverá no mercado interno.
O aumento das importações chinesas de carne do Mercosul, com a habilitação de dezenas de novos frigoríficos dos países do bloco (o que deverá fazer o Brasil retomar a liderança nas exportações), ocorre ao mesmo tempo em que o país sofre com a peste suína africana, que tem mudado seu padrão de consumo de carnes.
Valor Econômico