Agronegócio se destaca nos debates da Reforma Tributária

  À medida que se aproximava o começo dos debates sobre a Reforma Tributária no plenário da Câmara Federal, por ocasião da apresentação do parecer elaborado pelo relator Aguinaldo Ribeiro, ficou evidente que a cadeia produtiva agrícola foi protagonista no grupo de trabalho criado para avaliar as propostas.

 

Após a aprovação, em dois turnos, pelos deputados, a SNA conversou com algumas das principais vozes que trabalharam para, nessa primeira etapa, defender os interesses do setor, bem como especialistas que fizeram um balanço das possíveis mudanças, que ainda precisam passar pelo crivo dos senadores.

As principais demandas, encaminhadas pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), incluíram a desoneração total da cesta básica e das exportações, bem como a não caracterização como contribuintes dos produtores. A meta foi a de obter a maior redução possível nas alíquotas, considerando a adoção do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) em substituição a outros tributos atualmente cobrados. Assim, com o corte substancial no final do sistema, isto é, nas exportações, além do fim da cumulatividade hoje vigente, a inflação não pressionará a população mais pobre.

Opiniões

Para o Professor Marcos Fava Neves, em conversa com a SNA, o essencial é simplificar o sistema, reduzindo os custos de transação e, consequentemente, aliviando o encargo oculto para as empresas que gastam tempo e mão de obra para atender à complexa malha de alíquotas e bases de incidência. Isso por si só, já traria mais competitividade, uma vez que as exportações seriam menos oneradas. Para ele, o planejamento do governo também é fundamental, pois a arrecadação está diretamente relacionada à atuação do poder público e o quanto se faz necessário para custear seu papel. Fava Neves defende que, justamente por isso, seria mais lógico pensar antes numa reforma administrativa, para reduzir o peso do Estado sobre o cidadão e as empresas, trazendo queda natural do orçamento.

O IVA também não é consensual entre especialistas. O ex-presidente do IPEA (Instituto de Pesquisa e Economia Aplicada), Erik Figueiredo, apontou estudos que analisaram o desempenho econômico de outros países que utilizam o modelo nos quinquênios anteriores e posteriores à sua adoção. Para ele, o crescimento nem sempre é garantido, apontando o exemplo da Argentina.

Ele ecoa as críticas de Fava Neves, no sentido de que a União terá pouca redução arrecadatória, em comparação aos estados e municípios, o que evidencia a dificuldade do governo federal em cortar na própria carne, renunciando a algumas fontes de receita. Figueiredo também defende a manutenção de incentivos e isenções fiscais como forma de atrair investimentos e gerar empregos, mitigando o chamado “custo Brasil”, expressão que denota a dificuldade de se empreender no País.

A CNA, Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, também atuou em conjunto com as federações estaduais para fazer valer pontos importantes, como resguardar as cooperativas agrícolas de maiores alíquotas e evitar dupla tributação de certos maquinários, que já prestam serviço fundamental à atividade rural. Esses e outros aspectos foram levados a Aguinaldo Ribeiro, que isentou os equipamentos de IPVA. O relator também incluiu um abatimento de 60% para insumos agrícolas em relação à alíquota de referência, além de manter a isenção para produtos da cesta básica.

A senadora Tereza Cristina, ex-ministra da Agricultura, declarou que “a Câmara deu um primeiro e importante passo rumo a um sistema tributário mais eficiente e justo. Ainda há muito chão pela frente. Agora, no Senado Federal, que é a casa revisora, vamos analisar com calma e aprimorar o texto. O agro, que é setor essencial para a segurança alimentar, foi atendido inicialmente. Como oposição responsável, sempre estarei disposta a votar questões de Estado, que melhorem a vida dos brasileiros. Uma reforma que é iniciativa do Congresso Nacional.”

Governadores como Romeu Zema, de Minas Gerais, e Ronaldo Caiado, de Goiás, expressaram receio com a criação do Conselho previsto na reforma, que ficaria responsável por gerenciar os recursos arrecadados. Na visão deles, isso fere o pacto federativo, pois retira de estados e municípios a autonomia de formular e aprovar orçamentos a nível local, tornando os gestores dependentes dos repasses do futuro comitê.

Zema frisou que há diferenças de população e robustez econômica entre os entes federados, o que prejudicaria o planejamento e execução de projetos e políticas públicas. A ideia do órgão foi aprovada pela votação da Câmara, mas o relator incluiu a previsão de respeitar a proporcionalidade dos estados. Cláudio Castro, do Rio de Janeiro, e Tarcísio de Freitas, de São Paulo, endossaram as críticas.

Políticos de vários partidos, inclusive representantes da FPA, na pessoa de seu presidente Pedro Lupion, comemoraram a votação histórica, apesar das preocupações manifestadas. Para eles, o momento simbolizou um acordo importantíssimo desde a redemocratização, no sentido de tornar o País mais competitivo e simples para quem empreende, investe e produz. A maior parte das demandas do setor rural foi atendida, o que também atesta o êxito dos parlamentares em comprovar o caráter fundamental do campo no Brasil. Para a CNA, a desoneração da cesta básica e das exportações foi considerada a principal vitória. A meta, agora, é preservar essas conquistas quando os trâmites forem para o Senado Federal.

O engenheiro agrônomo Fernando Pimentel, em conversa com a SNA, salientou que o IVA representará uma tributação nova sobre certos produtos, onerando o que até então vinha sem incidência. Para ele, a reforma encontra as safras de milho e soja num momento difícil, com armazéns cheios e produtores sobrecarregados. Segundo Pimentel, o momento é de ajustes para o agronegócio, o que aumenta a importância de haver pragmatismo na transição que a reforma prevê, com implementação gradual dos novos impostos, à medida que os outros sejam retirados, bem como mudança nas alíquotas.

A SNA seguirá atenta aos próximos passos dessa fase de sumo interesse para o agronegócio brasileiro, que pode afetar a pujança e competividade do setor por gerações. O foco agora passa para o Senado, onde o projeto passa a tramitar.

 

Por Marcelo Sá – jornalista/editor – (MTb 13.9290 
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