“O setor agropecuário não pode falhar em ser ator principal no gerenciamento dos recursos hídricos utilizados na produção de alimentos”, alerta Julio Cesar Pascale Palhares, pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste e atual presidente da Sociedade Brasileira dos Especialistas em Resíduos das Produções Agropecuária e Agroindustrial (SBERA).
Para alcançar este objetivo, ele destaca a necessidade de “dispor de informações, desde as mais simples, como o volume de água utilizado para se produzir um quilograma de soja ou de carne bovina, até as mais complexas, como os limites hídricos de determinada propriedade, região e país. Essas informações determinarão a segurança e a independência hídricas das produções e da sociedade”.
Ele ressalta, no entanto, que não bastam somente as informações. “Estas devem ser trabalhadas para gerar conhecimentos, o que propiciará a gestão do recurso. Tendo as informações, gerando conhecimentos e fazendo a gestão, eventos extremos exercerão impactos negativos menores”, garante o pesquisador.
A produção de alimentos é uma atividade intensiva no uso da água, explica Palhares, destacando que, “por ser intensiva, depende que a água esteja disponível diariamente, caso contrário, o sistema produtivo estará em risco hídrico e econômico. Por isso, é obrigatório o uso eficaz e eficiente do recurso natural e que o seu manejo e gestão sejam, cotidianamente, exercidos”.
“Por ser intensiva, a região, país e continente que dispuserem de água em quantidade e com qualidade terão uma segurança alimentar maior e uma vantagem ambiental e econômica frente a outros que não possuem o recurso em abundância, sendo dependentes hidricamente de outros países para alimentar sua população”, salienta.
PRODUÇÃO DE ALIMENTOS
No mundo, a produção de alimentos responde por 70,2% do consumo de água que vem dos mananciais; no Brasil, segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), por 69%. Na opinião do pesquisador, o País dispõe de uma condição de conforto hídrico em comparação com outros países e com os principais produtores de commodities agropecuárias. Mas, chama a atenção para o fato de que “o conforto não é finito e sua manutenção depende das ações de hoje, as quais irão garantir as produções de amanhã”.
Palhares toma como exemplo a crise hídrica na região Sudeste. “Por mais que se queira culpar aquela figura simpática chamada de São Pedro, ele não é o responsável pelo colapso hídrico que a região vivencia. Eventos climáticos sempre existiram e sempre existirão e, segundo as projeções, serão mais frequentes e intensos. Quando há a conjunção de falta de chuva com falta de planejamento e gestão hídrica, o resultado é sabido: o caos”, afirma.
Segundo ele, eventos climáticos extremos terão muito menor impacto se o recurso natural for gerenciado dia a dia; se a redução do consumo e o uso eficiente forem instrumentos de políticas e não de campanhas de momento; se a relação disponibilidade de água e demanda dos diversos for planejada, monitorada e avaliada constantemente; se a água for entendida como recurso natural finito em quantidade e qualidade e não como recurso abundante, ofertado pela natureza, de graça, e que tem como única função satisfazer nossas necessidades e ambições hídricas.
PESQUISAS
O especialista destaca que a Embrapa desenvolve pesquisas que visam ao conhecimento das relações quantitativas e qualitativas da água com a produção de alimentos, e a partir disso propõe ações, manejos, políticas e programas para que essas relações se deem de forma mais equilibrada e eficiente.
“Os caminhos são apontados por nossas publicações técnicas, como o manual de Boas Práticas Hídricas na Produção Leiteira; em nossos eventos de transferência de conhecimentos e tecnologias, como o Simpósio de Produção Animal e Recursos Hídricos; e na nossa participação em fóruns de Associações, Federações, Ministérios, Organizações Sociais, a fim de fazermos com que o conhecimento gerado tenha aplicabilidade ambiental, produtiva e social”, ressalta.
Ele ainda manda um aviso: “sem água não existe segurança ambiental”. “A falta de água em quantidade e com qualidade nos fragiliza ambientalmente. Hoje, apesar dos problemas de escassez, nossa situação hídrica é uma vantagem competitiva que temos para produzir alimentos para nossa população e para o mundo”.
Palhares ainda acrescenta que “não devemos nos esquecer de que vantagens ambientais não são eternas, podem se tornar ameaças, de acordo com o uso que fazemos delas”.
Segundo pesquisador, “a água, hoje abundante e barata, pode se tornar limitada e cara. Se o pior cenário vai acontecer, só depende de como entendemos a manejamos esse insumo natural”.
Por equipe SNA/SP