Agrometrika divulga análise de recebimento da safra de verão 2013/14

De acordo com o boletim da Agrometrika, as últimas duas safras parecem demonstrar que, apesar de menos frequentes, os ciclos de baixas no campo ainda fazem parte da vida dos produtores e demais atores das cadeias do agronegócio. Desde 2007, a agricultura brasileira vivia um ciclo virtuoso de resultados positivos na maioria das culturas, sobretudo nos grãos e, em particular, na soja. Foi um período de grande capitalização do campo, com oferta abundante de crédito, planos agrícolas robustos, programas de governo voltados para manutenção da renda e investimento, enfim, só notícia boa. Nesse contexto, muitas empresas comerciais e instituições financeiras ampliaram seu espaço no bolso dos produtores, enquanto estes ampliavam seu endividamento diante da oportunidade de investir em expansões vertical (tecnologia) e horizontal (área) da produção.

Porém, os sinais de deterioração desse ciclo começaram a ser apresentados a partir do início de 2010, com problemas climáticos associados ao mercado adverso para as culturas da cana, laranja e, mais recentemente, o café. As condições adversas de clima, associadas ao problema crônico da gestão estatal do preço dos combustíveis, “empurraram” o setor sucroalcooleiro para a pior crise da sua história recente, pós extinção do Proálcool. Dividindo a mesma geografia e problemas climáticos, a laranja, depois de uma estagnação da demanda, amarga a agonia de quem está sem perspectivas de médio prazo, abrindo uma crise de efeitos sociais importante para as regiões produtoras.

Em outra vertente, o café sofreu com preço no ano passado, mas criou uma oportunidade para os produtores mais capitalizados e estocados, sobretudo do Triângulo Mineiro e Bahia, que se beneficiaram um pouco da quebra de safra no Brasil e consequente recuperação dos preços. A região do Sul de Minas, assolada por uma seca depois de um ano de mercado ruim, sofreu um duro golpe nas suas contas, deixando algumas cooperativas e muitos produtores em situação financeira precária. A perspectiva para 2015 segue negativa, com cafezais ainda debilitados e uma planilha de contas que não fecha no positivo para a maioria dos perfis de produtores de café arábica. A pior situação ocorre nos perfis de colheita manual, que passou a ser uma prática em extinção na cafeicultura brasileira.

Agora parece que chegou a hora dos grãos sofrerem um ajuste de contas. O milho está convivendo com uma realidade perversa de sobreoferta, derivada da elevada competência dos produtores do Cerrado em aumentar a produção. Bastou o Brasil incorporar um melhor material genético na oferta de sementes para que o país assumisse importância na produção mundial, em função do aumento da produtividade e mudança no ciclo produtivo (crescimento da safrinha).

Apesar de ainda estarmos longe de desbancar os EUA nessa cultura, já incomodamos nossos vizinhos que, no passado, tinham a hegemonia da produção do cereal. Porém, essa competência colide frontalmente com a nossa incompetência logística, o que torna o milho brasileiro, nesse momento, inviável economicamente para as regiões produtoras muito distantes dos portos.

A crise do milho, marcada para 2013, foi adiada pela quebra de safra nos EUA, mas com a projeção de produção recorde para os americanos nessa safra, a coisa começa a complicar. O mercado interno está frouxo e não há um horizonte positivo no médio prazo. A CONAB já anunciou que realizará leilões de PEPRO, disponibilizando R$ 500 milhões (R$ 450 milhões apenas no Centro-Oeste) para retirar entre 7 e 10 milhões de toneladas de milho do mercado.

Na soja, depois de anos de bons resultados, a perspectiva de uma safra americana de +/- 100 milhões de toneladas soa como um divisor de águas, que vai pegar muito produtor alavancado e abrindo áreas novas, o que se traduz em baixa capacidade de pagamento junto aos credores. Para o perfil de produtores pequenos e médios no Cerrado, com elevada proporção de arrendamento e sem armazenagem própria, as contas estarão muito apertadas, não oferecendo nenhum espaço para quebra de produção. Nas regiões onde já houve problemas de quebra nas últimas 2 safras, essa questão é agravante. O risco de problema de liquidez, nesses casos, pode atingir até os produtores de maior porte.

De maneira geral, um perfil de produtor com tecnologia média no Cerrado, cultivando soja/milho safrinha na faixa de 500 a 1.000 hectares, com 50% de arrendamento e sem armazenagem, taxa de crescimento entre 10% e 15% nas últimas 3 safras na BR 163, operando em localidades que colheram dentro de um intervalo de produtividade normal na Safra Verão 2014/15, apresenta um Índice de Liquidez projetado de 5% a 10% para a próxima safra. Isso é muito pouco em face dos 20% a 25% frequentes na mesma região na safra passada, e 30% a 35% na Safra 2012/13.

 

ANÁLISE DE RECEBIMENTOS DA SAFRA VERÃO 2013/2014

Em pesquisa recente realizada pela equipe da Agrometrika(1) com instituições financeiras, fornecedores e distribuidores de insumos sobre os recebimentos da Safra Verão, foi identificada uma relativa piora na pontualidade e no recebimento das contas dos vencimentos de Abril e Maio de 2014, em comparação ao mesmo período de 2013. Conforme demonstra a Tabela 1, observa-se que para 58,8% das empresas, os recebimentos das contas foram “piores” em 2014 em relação a 2013. Para 29,4% das empresas que responderam o questionário, a situação de recebimentos foi “igual” e, para 11,8% foi “melhor”.

 

Tabela1
Tabela 1

 

Na Tabela 2, está a frequência de expectativa de inadimplência para a Safra Verão 2013/14 respondida pelas empresas:

 

Tabela 2
Tabela 2

 

Na Tabela 3, são delimitadas as regiões que apresentaram maiores problemas de recebimento na Safra Verão 2013/14. As regiões que mais tiveram problema foram o Médio Norte do Mato Grosso e o Triângulo Mineiro.

 

Tabela 3
Tabela 3

 

Na Tabela 4, são delimitadas as culturas que apresentaram maiores problemas de recebimento em 2014. Observa-se que a soja e a cana foram as que apresentam maiores frequências nas respostas.

 

Tabela 4
Tabela 4

 

Algumas rolagens para pagamentos no vencimento da safrinha, pontuadas no sistema de distribuição de insumos, carregam um elevado nível de risco diante da baixa liquidez e preços do milho, o que pode agravar um pouco mais o quadro.
Esse cenário indica um segundo semestre mais complexo, ao somarmos esses problemas com os vencimentos já complicados de Cana, Café e Laranja. A expectativa de uma safra mais do que “cheia” nos EUA apenas aumenta a preocupação com a integridade dos créditos com vencimentos em Abril/Maio 2015, apesar de a demanda chinesa seguir conferindo alguma sustentação aos preços no médio prazo.

Alguns mais pessimistas, no entanto, criam um paralelo descabido da safra atual com a safra 2005, o que seria improvável, haja vista que a conjunção de fatores que geraram o “rombo” nas contas dos produtores do RS, MS, GO e MT naquela época ainda não se alinharam. Temos reserva de caixa nas mãos dos produtores do RS, e não existe nenhuma doença ou praga que surpreenda os produtores do Cerrado, nesse momento. Se houver algum problema climático de mais severo, poderia ser um agravante importante, mas a probabilidade estatística desse evento ocorrer é pequena em ano de El Niño. Muitos não gostam da ideia de morrer com o barulho do tiro, e acreditamos que não seria o caso de tanto alarme, mas como diz o velho ditado “Cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém”.

O retardo nas vendas de insumos, bem como uma expectativa de redução de tecnologia, são sinais claros de que há uma mudança de humor no campo. Esse cenário pode exigir dos operadores de crédito um pouco mais de atenção nesse momento, optando pela venda mais segura e abrindo mão de um eventual crescimento nesse momento, sobretudo no caso de empresas que não tenham caixa para bancar uma elevada taxa de inadimplência.

Há muito tempo a gestão inteligente de recebíveis deixou de ser uma opção tática, assumindo um papel estratégico para os fornecedores de insumos e seu sistema de distribuição, em um contexto de forte demanda por operações estruturadas que visam captar recursos através da securitização de recebíveis, ou dividir o risco em operações de risk sharing junto aos agentes financeiros. Cresce, portanto, a necessidade de dar mais “corpo” para as áreas de C&C das empresas e de criar um ambiente de governança para gestão dos recebíveis.

(1) Destaca-se que a pesquisa não possui caráter estatístico, mas sim “qualitativo”, para mensurar a percepção dos players de mercado.

 

Leia também sobre as perspectivas de rentabilidade de grãos para 2013/14. Clique aqui.

 

Fonte: Agrometrika

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