A Lavoura nº 704 mostra ‘irrigação que cabe no bolso’

Em uma área da Fazenda Experimental Lageado, em Botucatu (SP), foram instalados os sistemas de irrigação alternativos com tubulação de esgoto e garrafa pet. Foto: Divulgação A Lavoura nº 704/2014

Com tubulação de esgoto e garrafa pet é possível fazer um sistema de irrigação? Se depender do professor Edmar Scaloppi, do Departamento de Engenharia Rural da Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA) da Unesp, a resposta é sim!

A partir do desejo de democratizar a irrigação, ele desenvolveu os Sistemas de Irrigação Alternativos de Baixo Custo. “A irrigação no Brasil ainda é muito incipiente, limitada, e uma das razões para esta limitação é que se trata de uma atividade elitista, uma tecnologia de alto custo”, afirma Scaloppi, em entrevista publicada na edição nº 704/2014 (páginas 19 a 21), da Revista A Lavoura, veiculada há 121 anos pela Sociedade Nacional de Agricultura (SNA).

“Se a consideramos como um insumo, certamente é o mais caro, deixando um contingente de agricultores sem acesso a esta tecnologia”, ressalta o professor.

Para tentar reverter esse cenário, ele resolveu demonstrar a eficiência econômica e prática do seu projeto. Em uma área da Fazenda Experimental Lageado, em Botucatu, interior de São Paulo, foram instalados os sistemas de irrigação alternativos. E lá estão a tubulação de esgoto e a garrafa pet.

A eficiência do projeto foi demonstrada também pela sua versatilidade. O sistema pode ser utilizado em qualquer tipo de solo e adaptado a diversas técnicas de irrigação, entre elas, irrigação por sulcos, aspersão e gotejamento.

Scaloppi explica que o preço médio para utilização deste sistema alternativo pode chegar a 300 reais por hectare (valor de 2014). “Temos demonstrado no campus universitário da Unesp, em Botucatu, um sistema em operação com sulcos de 120 metros de comprimento a um custo de 500 reais por hectare (quantia estipulada em 2014). Aumentando-se o comprimento dos sulcos, em solos e topografias mais favoráveis, o custo será proporcionalmente reduzido.”

Para se ter uma ideia das vantagens, o pesquisador calcula que o sistema convencional possa custar quatro ou cinco vezes mais.

INDEPENDÊNCIA DO PRODUTOR

Outra vantagem na utilização desse sistema, além do custo menor, é a autonomia do agricultor, no que se refere ao manejo da irrigação.

“Propositalmente, utilizamos elementos descartáveis, para que o irrigante se identificasse e pudesse estabelecer uma relação de autonomia com o sistema”, diz o inventor do projeto, lembrando que o produtor acaba tornando-se “um gestor habilitado”, comenta o professor. “Esse é o diferencial do projeto, o agricultor passa a ter iniciativa e não mais depender da assistência técnica de uma empresa, que cobra caro por isso.”

Quanto à manutenção, o produtor também pode ficar aliviado. É que o sistema funciona com baixa pressão da água, o que afasta possíveis problemas de vazamento ou rompimento da tubulação.

“Um dos primeiros experimentos, que completou oito anos de funcionamento (no ano de 2014), nunca apresentou nenhum ocorrência”, diz Scaloppi.

COMO FAZER?

Irrigação de baixo custo envolve um conceito básico de redução de custos de investimento e operacionais dos principais sistemas de irrigação, sem comprometer seu desempenho técnico e a qualidade ambiental.

* IRRIGAÇÃO POR SULCOS

Resgatando a técnica cablegation, desenvolvida nos Estados Unidos, empregando-se tubulação de esgoto sanitário para derivação de água aos sulcos. A possibilidade de trocar as perdas de água no final das parcelas por acréscimos de área irrigada, mesmo com alguma deficiência hídrica intencional, favorece a economia dos projetos e incorpora conceitos modernos de “irrigação deficiente” e “efeitos compensatórios de déficits hídricos moderados nas culturas” contribuindo para assegurar a sustentabilidade da agricultura irrigada.

Com essa estratégia, sempre haverá espaço para armazenar água de chuva e resgatar a uniformidade de aplicação, reduzindo o escoamento superficial, que poderia acelerar processos erosivos com degradação do solo e da água e agravar o assoreamento de reservatórios.

Sendo adequadamente dimensionados e operados podem revelar desempenhos comparáveis aos mais sofisticados sistemas de irrigação pressurizada, utilizando águas superficiais, que mesmo estando altamente contaminadas por substâncias orgânicas e minerais, inclusive coliformes fecais, contribuem para mitigar esse prejuízo ambiental, enriquecer o solo com nutrientes, além de assegurar a qualidade da produção, até mesmo para o consumo in natura, uma vez que a água não entra em contato com a parte da planta a ser consumida.

Além disso, utilizam a gravidade terrestre para distribuir a água na área irrigada e, portanto, podem dispensar estações de bombeamento ou reduzir drasticamente as dimensões dessas estações e o consumo de energia. Operação simples, sendo facilmente integrados às expectativas dos irrigantes que, quando adequadamente orientados, tornam-se competentes gestores em seus projetos.

“Temos demonstrado no campus universitário da Unesp em Botucatu, um sistema em operação, com sulcos de 120 metros de comprimento, a um custo de investimento avaliado em 500 reais por hectare (valor de 2014). Aumentando-se o comprimento dos sulcos, em solos e topografias mais favoráveis, o custo será proporcionalmente reduzido”, relata Scaloppi.

A facilidade operacional e a possibilidade de incorporar fertirrigação, também de baixo custo, utilizando fertilizantes comuns, e até mesmo orgânicos, tornam o sistema bastante ajustado às expectativas de agricultores descapitalizados, praticantes de agricultura orgânica ou tradicional, e satisfazendo as principais exigências que a sociedade requer de projetos agropecuários que incorporam uma reconhecida interferência ambiental.

ASPERSÃO CONVENCIONAL FIXA

A seleção adequada dos aspersores representa uma oportunidade decisiva para racionalizar o consumo de água e energia. Aspersores pequenos, dotados de bocal único com diâmetros em torno de três milímetros, podem operar satisfatoriamente quando espaçados de 12 metros, acionados por cargas hidráulicas próximas a 20 metros, com significativa redução no consumo de energia e nas dimensões das instalações de bombeamento.

Nessas condições, tubulações de PVC para aplicações sanitárias, portanto, sem especificações de resistência à pressão, poderiam integrar a rede de distribuição de água e, se enterradas a 30 centímetros de profundidade, contemplam uma estimativa de vida útil superior a 20 anos.

A intensidade média de precipitação, inferior a quatro milímetros por hora, praticamente elimina a possibilidade de ocorrência de escoamento superficial em qualquer condição topográfica ou tipo de solo. O maior período de aplicação de água pode transformar as variações na velocidade e direção dos ventos em maior uniformidade de distribuição espacial da água aplicada e facilitar uma conveniente operação noturna, usufruindo tarifas diferenciadas de energia elétrica.

IRRIGAÇÃO POR GOTEJAMENTO

Neste método, são utilizados microtubos spaghetti com 1,5 milímetro de diâmetro com carga manométrica inferior a dois metros. A derivação de água aos microtubos é realizada com mangueiras comuns ou tubulações de PVC para aplicações sanitárias e o conjunto pode ser enterrado para se evitar riscos acidentais.

Os diâmetros dos microtubos, muito superiores aos gotejadores comerciais, reduzem a possibilidade de obstruções e permitem maior flexibilidade. A reduzida pressão operacional pode eliminar a necessidade de pressurização por bombeamento ou reduzir bastante o consumo de energia.

O sistema torna-se particularmente vantajoso em culturas perenes com razoáveis espaçamentos entre as plantas cultivadas, em geral, acima de três metros.

Para aumentar a uniformidade de emissão, recomenda-se adotar tubulações com diâmetros suficientes para minimizar as perdas de carga por atrito nas tubulações que abastecem os microtubos spaghetti.

SAIBA MAIS

Clique aqui para ler esta reportagem, entre outras, na edição nº 704/2014 da Revista A Lavoura, que traz como destaques na capa: “Bovino: ações simples dão ótimos resultados”, “Café: a revolução do estresse hídrico controlado” e “Irrigação: saiba qual é a melhor para sua produção”.

Seja um assinante da nossa publicação impressa, enviando um e-mail para assinealavoura@sna.agr.br para conhecer nossas condições superespeciais.

Para acessar as edições anteriores (exceto as três ultimas, em razão do acordo com quem assina), clique em www.sna.agr.br/publicacoes/a-lavoura.

 

Fonte: Revista A Lavoura nº 704/2014

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp