Por Alessandra Mello e Alexandre Melo
A Argentina aumentou as compras de soja brasileira em janeiro e poderá importar até 2 milhões de toneladas métricas de seu vizinho em 2023, uma vez que enfrenta um déficit de safra e menor oferta doméstica.
Participantes do mercado de ambos os países disseram que nas primeiras semanas de janeiro, de 300.000 a 400.000 toneladas de soja brasileira para embarque em fevereiro-março foram negociadas para a Argentina. Eles estimam que 1 milhão de toneladas da oleaginosa foram negociadas para o ano e que os embarques podem chegar a 2 milhões de toneladas em 2023.
O maior volume de soja que o Brasil exportou para a Argentina foi de 657.000 toneladas em 2018, mas os embarques não passaram de 300.000 toneladas nos últimos anos.
O aumento das importações foi impulsionado por uma quebra de safra na Argentina atingida pela seca. A produção de soja deve totalizar 41 milhões de toneladas no ano-safra 2022/23, uma queda de 7 milhões de toneladas em relação à previsão anterior, segundo a última estimativa da Bolsa de Cereais de Buenos Aires (BCBA).
Isso ainda é muito maior do que a estimativa da Junta Comercial de Rosário (BCR), que foi recentemente reduzida para 37 milhões de toneladas, de 49 milhões de toneladas estimada anteriormente.
A Argentina tem uma indústria robusta de farelo e óleo de soja. Assim, as esmagadoras aumentam a importação de grãos dos países vizinhos, principalmente do Paraguai, quando a produção nacional cai.
Rota cênica
A soja brasileira costuma chegar à Argentina por via fluvial, com embarques a partir de Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul. A Argentina também faz fronteira com o estado do Rio Grande do Sul, um dos maiores produtores de soja do Brasil.
Mas ambos os estados ainda não tinham soja disponível para exportação em janeiro por causa de seus calendários de safra. Portanto, uma logística atípica teve de ser adotada para garantir o abastecimento de soja aos argentinos.
A maior parte dos negócios fechados em janeiro para embarque até março utilizou o porto de Santarém, no Pará, a cerca de 4.500 quilômetros de Buenos Aires. Os exportadores podem embarcar a soja colhida entre o final de dezembro e o início de janeiro, especialmente do Estado de Mato Grosso pelo Arco Norte e portos do Atlântico Norte do Brasil.
Importação
As margens de esmagamento na Argentina daqui para frente definirão os volumes de importação do Brasil, já que comprar a oleaginosa do país vizinho para depois esmagá-la e continuar exportando farelo e óleo de soja globalmente pode ser economicamente vantajoso, disse Daniele Siqueira, analista da AgRural.
A safra argentina é plantada em outubro e novembro e colhida em março e abril. Então, os padrões climáticos futuros ainda podem afetar a produção. A situação pode se normalizar ou piorar se o tempo seco continuar prevalecendo.
A demanda chinesa também tem sido mais fraca, enquanto a produção de soja do Brasil deve registrar um novo recorde, acima de 152 milhões de toneladas. O País deve ter mais soja disponível para exportar para a Argentina.
Negócios
A indústria teria perdido US$ 75,00/tonelada se optasse por comprar soja argentina em vez do produto brasileiro em meados de janeiro, quando foram divulgados os negócios de exportação de soja de Santarém, segundo Siqueira.
Pelo menos três tradings fecharam negócios para exportar soja para a Argentina por Santarém, confirmaram participantes do mercado à Argus.
As empresas não revelaram o preço que foi pago nessas transações, mas estima-se que, no auge da necessidade do setor, em meados de janeiro, os negócios fecharam com um prêmio de US$ 1,10 por bushel sobra a cotação do vencimento março em Chicago, que na época correspondia a cerca de US$ 590,00 a tonelada.
Os compradores argentinos ainda consultavam soja nos portos do Norte do Brasil na semana passada, mas o movimento desacelerou na segunda quinzena do mês.
As exportações de soja por Porto Murtinho podem aumentar com o avanço da colheita no Centro-Oeste brasileiro. A rota poderia embarcar 600.000 toneladas este ano, disseram fontes à Argus.
Cumprimento de contratos
Segundo elas, as esmagadoras argentinas estão comprando matéria-prima de fornecedores brasileiros e paraguaios, enquanto seus produtores estão retendo os negócios de soja desde que a política do “dólar soja” do país terminou no final de dezembro.
Vários exportadores de óleo de soja que tinham embarques previstos para fevereiro e março precisarão importar o grão. Com o início da colheita paraguaia em meados de fevereiro, abre-se uma janela para a soja brasileira na Argentina, onde as tradings buscam cumprir suas obrigações contratuais.
O país é líder global em vendas de óleo de soja e importante exportador de biodiesel para a União Europeia (UE). Para que os exportadores argentinos cumpram seus contratos, a soja brasileira deve chegar aos portos de Rosário até a primeira quinzena de fevereiro.
Pelo menos três navios não foram carregados ou ainda estão para sair de Santarém, o que preocupa os produtores de soja argentinos. Um possível atraso nos embarques não protegidos aumenta o risco para os compradores, já que as perspectivas econômicas podem mudar quando a soja chegar ao destino.
Tempos de viagem prolongados podem prejudicar a competitividade da carga com os embarques paraguaios. “Para os argentinos, é melhor comprar soja do Paraguai”, disse Anilbagani Bagani, chefe de pesquisa de commodities do Sunvin Group. “É muito mais barato que o produto brasileiro e é transportado pelo rio Paraná.” O frete do Arco Norte é mais caro em comparação com o Paraguai.