Amazônia e a agricultura

“A Amazônia é nossa grande riqueza, é capital a ser rigorosamente preservado para a exploração soberana brasileira, se soubermos bem zelar por sua realidade”, afirma o embaixador Flávio Perri. Foto: Neil Palmer/CIAT

Por Flávio Perri*

A crítica internacional a respeito da nossa política florestal, que inclui especialmente a Amazônia, existe justamente porque detemos a mais significativa extensão de cobertura florestal remanescente no mundo e tornamo-nos centrais nas considerações da influência da floresta no clima no planeta. Se pouco nos restasse, atenções seriam menores e críticas menos relevantes.

Ocorre que o fato de sermos detentores de grande extensão florestal dá-nos uma vantagem que não soubemos até hoje explorar. Ao invés de nos abespinharmos com a crítica, deveríamos nos organizar para dar tratamento impecável a esse capital entesourado que detemos e compartilhamos com oito países vizinhos e potencialmente solidários.

O valor desse capital só tende a aumentar exatamente à medida que as menores coberturas florestais em outras partes do mundo forem descuidadamente se reduzindo.

Valor absoluto

Seja qual for a relativa distribuição de florestas no planeta, esta tem para nós um valor absoluto, pois o clima do centro-sul do Brasil e do continente é consequência da umidade de floresta e rios do norte do país. Chuva e seca, no sudeste ou no sul ou mesmo no leste, onde se concentram grandes cidades, indústrias e população considerável, são produto da evaporação da umidade e seu transporte pela atmosfera para estas regiões.

Isso para não falar da grande agricultura do Brasil, hoje atividade responsável pela maior riqueza do país, no centro e sudoeste, cuja produtividade está vinculada ao mesmo fenômeno das chuvas (e das secas) carregadas pela atmosfera desde a Amazônia.

Não fosse essa regularização do clima no país, de que a floresta é agente, nosso sucesso como potencial maior produtor agrícola e pecuarista no planeta não ocorreria ou teria um custo de investimento proibitivo.

Capital

Trata-se de olhar a Amazônia, cobertura florestal e rios, como capital entesourado. Trato também aqui do papel de extrema riqueza, no volume de água doce no mundo, escassa em outras grandes e habitadas regiões do planeta. É naturalmente parte de nossos cuidados com a região preservar mais esse potencial.

O futuro está próximo de uma escassez da água doce, tanto pelo aumento populacional quanto pelo seu uso na irrigação, que será gota a gota em regiões mais secas ou mesmo áridas em outros continentes. Antevejo grandes navios-tanques se abastecendo nos rios amazônicos em horizonte temporal não muito distante.

Pesquisa e conhecimento

E termino tratando da biodiversidade, não dos frutos e produtos, vegetais e animais, que a floresta encerra, mas do conhecimento genético e molecular que da pesquisa aí se pode obter. É o potencial cobiçado e já conhecido, em parte, pelo grande capital. O desenvolvimento da tecnologia digital/cibernética favorece essa pesquisa e seu uso algures, em laboratórios científicos, no desenvolvimento de novos produtos por grandes empresas cada vez mais agudamente.

A Amazônia é nossa grande riqueza, é capital a ser rigorosamente preservado para a exploração soberana brasileira, se soubermos bem zelar por sua realidade tal qual hoje se apresenta.

A agricultura continuará crescendo e se desenvolvendo com a inteligente gestão da agropecuária nacional. Certamente o mundo dependerá de nossa produção, que ainda crescerá exponencialmente em território suficiente. Não há que disputar espaços com a Amazônia, mas de conviver harmoniosamente. A relação feita no plano do capital e do investimento poderá ser estreita entre os dois setores, o agropastoril e o florestal.

Segurança

Regular juridicamente a propriedade particular, titulá-la, é passo essencial. Fixar a população e as fazendas de maneira estável em áreas reconhecidas, facilitar o transporte com infraestrutura retificada nos eixos já conhecidos de trânsito pela região, dar segurança a essa sociedade, que inclui também pequenos produtores, é chave para o tranquilo desenvolvimento agropastoril e florestal.

Meu resumo faço com a indicação de que a crítica deve ser tomada sem reações agressivas, mas com a tranquilidade de um país que se conhece e que pratica a política correta para o desenvolvimento sustentável das atividades humanas de valor econômico-social na Amazônia.

Desculpe a palavra, mas é burrice argumentar agressivamente. Temos de demonstrar, sem preconceitos, nossa capacidade organizacional e nossa decisão de desenvolver a região de maneira equilibrada e sustentável. Agredir os que nos criticam prejudica a imagem do país, afasta atuais e potenciais parceiros comerciais e empresariais e assusta o investimento. Sem complexos por conta da crítica, trabalhemos.

 

*Flávio Miragaia Perri é embaixador e membro da Academia Nacional de Agricultura da SNA.

 

Equipe SNA

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