Com oferta recorde de milho, Brasil pode tirar proveito de safra ruim nos EUA

Um atraso histórico no plantio de milho nos Estados Unidos, os maiores produtores e exportadores globais do cereal, provavelmente irá impactar de forma negativa a safra norte-americana, trazendo demanda adicional para o Brasil neste ano. A afirmação é da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e de especialistas de empresas privadas.

As exportações do Brasil, segundo exportador global, estimadas em níveis recordes de 31 milhões de toneladas pela Conab antes mesmo dos problemas com chuvas excessivas nos EUA, possivelmente crescerão ainda mais em relação às 24.8 milhões de toneladas da safra anterior, com o país ganhando mercado dos norte-americanos.

Além de abocanhar espaço dos EUA no cenário internacional, em último caso o Brasil teria até potencial na possibilidade de exportar para os próprios norte-americanos, como nos raros negócios realizados entre 2012 e 2013, quando os embarques de milho brasileiro aos EUA somaram 1.7 milhão de toneladas, complementando a oferta do país após uma seca severa.

Exportações brasileiras fortes, ainda, são fundamentais para reduzir uma oferta recorde do cereal, que outrora estava pressionando os preços no Brasil.

“Iniciamos a safra com necessidade de exportar pelo menos 30 milhões de toneladas. Agora a exportação se tornou uma necessidade maior, dado o grande volume que vamos colher”, disse a analista da consultoria Céleres, Daniely Santos, ao comentar estimativas de uma produção brasileira histórica, em torno de 100 milhões de toneladas.

As expectativas de uma histórica produção de milho, com uma boa janela de plantio após uma colheita antecipada de soja, já sinalizavam uma safra volumosa do cereal, mas o clima chuvoso tem elevado a produtividade. Nesta sexta-feira (31/5), a Agroconsult divulgou um aumento em sua estimativa de cerca de dois milhões de toneladas, para 100.4 milhões de toneladas.

Mas essa conjuntura baixista para os preços não está se confirmando na prática, apesar do início da colheita da segunda safra, uma vez que o dólar oscilou acima de R$ 4,00 recentemente e as cotações na bolsa de Chicago dispararam cerca de 20% ao longo do mês, com os problemas na safra dos EUA. No mercado brasileiro, a alta é de 14% no período, segundo o indicador Esalq/BM&FBovespa.

“Apesar de esperarmos um aumento do consumo local, pelo crescimento da produção de proteína animal, a necessidade de exportar é grande. Vai sobrar muito milho para exportar. Esse cenário de grande excedente exportável faz com que os preços caminhem para a paridade de exportação”, afirmou o analista sênior de Agronegócios do Itaú BBA, Guilherme Bellotti.

“Antes os preços tinham um desconto em relação à paridade de exportação, e agora com esse atraso histórico do plantio dos EUA, isso mostra que, diferentemente do que o mundo esperava, vai ter um aperto na oferta dos EUA”.

Venda para os EUA?

Daniely, da Céleres, disse inclusive acreditar que o Brasil exportará milho para os EUA, para complementar a oferta norte-americana, o que ocorreria na entressafra no Hemisfério Norte, que vai se prolongar por mais alguns meses. “Com certeza vamos exportar algo para eles, e eles vão produzir menos…”, afirmou.

Um corretor experiente que atua no Paraná lembrou, ao ser consultado pela Reuters, das exportações brasileiras aos norte-americanos no passado. Mas disse que, por ora, não há movimentações nesse sentido.

A safra dos EUA foi estimada no início do mês em 381.78 milhões de toneladas, mas essa estimativa, que apontava para uma das maiores colheitas da história, não deve mais se confirmar, na medida em que as chuvas estão atrasando o plantio, e o mercado teme que produtores não arrisquem plantar fora da janela que se encerra em maio, algo já refletido nos preços.

“Até o início da semana, produtores dos EUA haviam plantado apenas 58% da área projetada de milho, versus um índice de 90% cultivado pela média histórica para esta época do ano, a poucos dias de 1º de junho – prazo para as lavouras conseguirem cobertura do seguro”, observou o gerente de produtos agropecuários da Conab, Thomé Luiz Freire Guth.

“O seguro deles é muito claro: o plantio é dentro da janela e ponto final. Não sei se eles vão arriscar um plantio junho adentro”, disse Guth, analista de mercado de milho, acreditando que os EUA conseguirão plantar cerca de 80% da área até o final deste mês.

Nessas condições, o analista da Conab avalia que os EUA deixarão de colher dezenas de milhões de toneladas de milho. “O cereal plantado mais tarde fica sujeito à seca ou mesmo neve, se sofre muito atraso”, destacou Guth, lembrando que em julho e agosto será possível saber o real potencial da safra.

Além do Brasil, acrescentou o analista, outros países como Argentina e Ucrânia também estão com safras boas e deverão disputar os mercados que os EUA deixem eventualmente de atender. Hoje, contudo, o milho brasileiro está altamente competitivo.

“Hoje eu mantenho exportação em 31 milhões, mas não duvido ter um incremento com o cenário a partir de julho”, disse Guth, ao falar sobre a projeção da Conab, que também trabalha com suprimentos brasileiros recordes de 110 milhões de toneladas em 2018/19, considerando os estoques da safra passada.

A Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec) estimou recentemente exportações de milho para este ano em 30 milhões de toneladas.

 

Reuters

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