Não fosse a boa surpresa da agropecuária este ano, a economia brasileira teria mais um trimestre de PIB negativo. Nos três primeiros meses de 2017, a safra recorde cumpriu a promessa de tirar a economia de um ciclo de oito trimestres seguidos de queda, enquanto a indústria cresceu abaixo do esperado e serviços estagnou.
O PIB da agropecuária cresceu 13,4% no primeiro trimestre, o maior alta em mais de 20 anos. Esse avançou puxou a alta de 1% da economia brasileira no primeiro trimestre.
O clima ruim que devastou hectares e cortou empregos em 2016 já é página virada na agropecuária. No ano passado, o setor encolheu 6,6%, a maior retração dos três setores do PIB, prejudicado pela colheita fraca de cana-de-açúcar, soja e milho. Juntas, estas culturas somam quase 60% da produção agrícola do país.
Recém-saída da crise, a agropecuária é agora o carro-chefe da expansão da economia, graças à colheita excepcional das principais culturas. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a safra agrícola deve crescer 26,2% este ano, para 233,1 milhões de toneladas. E quase metade dessa expansão é soja. E o bom resultado da agropecuária não deve ficar restrito ao primeiro trimestre.
A CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) estima em 8,5% a alta o PIB do setor em 2017. A consultoria MB Associados calcula um avanço de 8% em 2017. “A safra excepcional deve gerar retorno para o resto do ano”, diz o analista de agropecuária da consultoria MB Associados, César de Castro Alves.
CLIMA E INVESTIMENTOS
Para o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Luiz Cornacchoni, o setor foi favorecido não só pelas condições climáticas, mas também pelos investimentos do agricultor, mais otimista com a recuperação da economia e com a própria colheita.
“O produtor fez o plantio e acreditou que era momento de fazer melhorias. Houve investimentos em logística de armazenamento e aquisição de adubos e defensivos”, diz Cornacchoni.
EMPREGO NO CAMPO VOLTA A CRESCER
Números oficiais mostram que o emprego no campo já voltou a crescer. No primeiro trimestre, o país voltou a gerar postos de trabalho na agropecuária, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). As contratações superaram as demissões em 14.091 vagas de janeiro a março, uma variação positiva de 0,92%.
O Estado de Goiás foi o que mais viu subir o saldo de postos de trabalho no período, com 6.819 vagas criadas, uma variação positiva de 7,14%, enquanto Mato Grosso teve um aumento de 4,39%. Nem todas as regiões, contudo, foram favorecidas. A região Nordeste, por exemplo, perdeu 18.662 postos de trabalho.
SAFRA FAVORECE SUPERÁVIT COMERCIAL
A previsão de Andrade, da Barral M Jorge, é de que os produtores consigam escoar o grande estoque de grãos no mercado externo. “Temos uma capacidade muito deficitária de armazenamento no Brasil. O produtor acaba vendendo logo o que colhe”, diz.
Cornacchoni, da Abag, acredita que a demanda externa não será problema para a superprodução de grãos. “O que mais preocupa o setor é a precariedade da capacidade logística para escoar este volume nos portos, um gargalo que passa por investimentos em infraestrutura”, comenta.
No primeiro trimestre, a balança comercial brasileira acumulou superávit de US$ 14,424 bilhões, o melhor resultado para o período de toda a série histórica, iniciada em 1989. O superávit é resultado de US$ 50,466 bilhões em exportações e US$ 36,042 bilhões em importações.
A soja foi o principal produto exportado pelo país no acumulado do ano até abril. O volume cresceu 26,38% no período. Os embarques de açúcar saltaram 30%, acompanhando o ciclo positivo de outras commodities como o minério de ferro e o petróleo bruto. Os embarques de açúcar bruto saltaram 30%, e o refinado, quase 60%.
As exportações contam positivamente para o PIB, enquanto as importações são reduzidas das contas nacionais.
PESO DA AGROPECUÁRIA NO PIB
A agroindústria e os serviços ligados ao agronegócio não entram na conta da agropecuária medida no PIB do IBGE, embora as atividades estejam interligadas. Portanto, quando o setor cresce há reflexos positivos também para a indústria e serviços. “Quando a safra é boa ela pode beneficiar os outros setores”, considera Castro Alves.
Quando se olha toda a cadeia do agronegócio, e não só a agropecuária calculada pelo IBGE, o peso do agronegócio como um todo sobe de cerca de 5% para 22% do PIB. Esse cálculo leva em conta também a renda de todas as atividades ligadas à agropecuária, incluindo insumos, produção, agroindústria e distribuição como comércio e transporte.
A metodologia mais ampla é calculada pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), ligado à USP. Segundo esse cálculo, o agronegócio cresceu 4,48% no ano passado, quando a pecuária do IBGE recuou.
IMPACTO DA CARNE FRACA E DELAÇÃO DA JBS
Apesar da boa perspectiva para o agronegócio, os impactos negativos da operação Carne Fraca sobre o mercado de carnes e o escândalo mais recente envolvendo a delação do frigorífico JBS ainda não podem ser mensurados, avalia Castro Alves, da MB Associados. “Pode ser que o resultado da safra seja tão bom que até compense os efeitos ruins para a pecuária, mas é cedo pra dizer”, afirma.
O setor mantém a expectativa de crescimento para este ano, mesmo após o escândalo revelado pela Polícia Federal nos frigoríficos e as incertezas políticas com a delação da JBS, que colocaram em dúvida a própria recuperação da economia. “O agronegócio corre paralelo a tudo o que está acontecendo na cena política”, acredita Cornacchoni, presidente da Abag.
A expectativa é de que o impacto da Carne Fraca seja pequeno sobre as vendas no mercado externo, na visão do especialista em agronegócio e consultor em comércio internacional da Barral M Jorge, Matheus Andrade. “A carne brasileira teve queda no volume exportado após a operação, mas já conseguimos recuperar quase todos os mercados que haviam suspendido as vendas”, afirma Andrade, da Barral M Jorge.