Os novos canais logísticos em implantação no Pará estão impulsionando o plantio de grãos no Estado, historicamente voltado ao setor de pecuária bovina. Seja pela demanda de mercado ou pelos incentivos fiscais criados pelo governo, a expectativa é de que o plantio mantenha o ritmo atual de expansão, de 15% a 20% ao ano, e chegue a 5 milhões de hectares até 2023.
O governo diz que a intenção é aproveitar as áreas já desmatadas para avançar com a lavoura, e reitera que o crescimento não se dará às custas da Amazônia. “Temos 25 milhões de hectares abertos, ou seja, tem área de sobra sem precisar entrar na floresta”, diz o secretário de Agricultura, Hildegardo Nunes.
Novato em grãos, o Pará aderiu à cultura há cerca de dez anos, na esteira da demanda global crescente e da rentabilidade mais alta em relação à pecuária. Dados da Secretaria de Agricultura mostram que entre 2000 e 2012 o Estado passou de 2,2 mil hectares para 119,6 mil hectares plantados com soja – uma guinada de 5.580%. Segundo a Conab, a safra paraense de soja prevista para 2015/16 deverá atingir 336,3 mil hectares, gerando pouco mais de 1 milhão de toneladas. Só para comparação, o Mato Grosso terá pouco mais de 9 milhões de hectares e 28 milhões de toneladas nesta safra.
“Temos limitações de relevo e solo, então não vamos além disso [5 milhões de toneladas]. Mas a rentabilidade da soja é maior que a do boi, e isso tem estimulado a atividade”, diz Vanderlei Ataídes, presidente da Aprosoja Pará, “e os novos canais de logística têm dado velocidade à expansão agrícola”.
Para tentar impulsionar o setor, a gestão de Simão Jatene (PSDB) tem se valido de medidas tributárias para desonerar a produção. Há três meses, lançou um “Pacto pela Produção e Emprego” e isentou do pagamento de ICMS o frete pelas hidrovias do Capim-Guamá e Tocantins, que escoarão parte da produção do Estado até o porto de Vila do Conde, e o diferencial de alíquota de ICMS para máquinas e insumos agrícolas.
Mais recentemente, anunciou planos de lançar um edital para o que seria a primeira ferrovia estadual, a Fepasa, como outra opção de modal para atender não só os grãos, mas também minérios.
As medidas somam-se aos investimentos milionários da iniciativa privada na hidrovia do Tapajós, por onde serão transportados até 20 milhões de toneladas de grãos ao ano pós-2020. No Tocantins, a expectativa é de que o governo federal consiga licitar o derrocamento do Pedral de Lourenço, hoje um impeditivo para a navegação contínua pelo rio amazônico.
Em tese, diz o ambientalista Beto Veríssimo, o caminho está correto. O Estado tenta transformar-se de “corredor para o grão do Mato Grosso” em desenvolvedor de suas próprias cadeias produtivas e verticalização. “Do ponto de vista de desenho econômico, não vejo problema. Desde que se garantam salvaguardas, já que a sojicultura precisa de compromissos amarrados”, diz o pesquisador do Imazon, organização de Belém que faz monitoramento mensal do desmatamento da Amazônia, independente dos dados oficiais.
Até agora, o espraiamento da soja se deu em áreas antropizadas nos três pólos de produção – Paragominas, Santana do Araguaia e Santarém. Os dois primeiros figuraram entre grandes desmatamentos do Estado, a ponto de serem incluídos na “lista negra” do IBAMA. Ambos já saíram da lista. Santarém foi palco de turbulência nos anos 2000, com temores de que a chegada da Cargill ao porto encorajasse o plantio na região.
“Apesar de desmates pontuais nesses pólos, um protocolo de grãos e o avanço do CAR, o cadastro ambiental rural, são ferramentas com as quais o governo tenta promover o desenvolvimento sustentável”, disse Teresa Moreira, especialista em governança da The Nature Conservancy (TNC).
O desafio está no eixo Tapajós, para onde são planejados hidrelétricas e portos fluviais. A economia ali ainda é baseada na grilagem. Gigantesca e distante, a área de influência do novo corredor logístico é também onde as manchas do desmatamento mais saltam aos olhos nas imagens de satélite.
Fonte: Valor Econômico