Levar a pesquisa desenvolvida em laboratórios para o campo tem sido uma tarefa constante de especialistas brasileiros e estrangeiros, com o objetivo de oferecer acesso, aos produtores rurais, às inovações tecnológicas que envolvem toda a cadeia do agronegócio. O projeto “Ranicultura em Rede”, comandado pela Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ), não foge à regra.
Mais de 300 comerciantes, consumidores, fornecedores, pesquisadores, produtores, técnicos de extensão rural interessados na ranicultura participam ativamente das ações do grupo. De acordo com o responsável pelo trabalho, André Yves Cribb, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, o programa é composto por um grupo que funciona sob a forma de lista de discussão online. Seus 306 membros estão espalhados, em sua grande maioria, por todo o território nacional.
“Alguns deles se encontram em outros países, especificamente em Chile, México, Peru e Portugal. Neste sentido, é um grupo que funciona à distância, graças aos recursos da tecnologia de informação e comunicação”, destaca Cribb.
Por meio do grupo online, são realizadas discussões e compartilhamentos de ideias, informações e experiências sobre a ranicultura.
“Os temas abordados se referem a todos os aspectos da cadeia, como o fornecimento de insumos, a implantação de ranários, a produção de rãs, o processamento da carne, comercialização de produtos e derivados delas. A entrada, bem como a permanência no grupo, é gratuita”, ressalta o pesquisador.
Para avaliar as próprias ações e os resultados dos trabalhos desenvolvidos pela internet, o Comitê Gestor se reúne uma vez por ano. É formado pelo líder do projeto, responsáveis pelos planos de ação, pelos representantes do projeto nos Estados envolvidos e por integrantes do setor produtivo.
“A presença de integrantes do setor produtivo no Comitê Gestor é um grande diferencial dos nossos projetos voltados para a criação e consolidação da rede de interação e aprendizagem para a transferência de tecnologia na cadeia ranícola.”
Segundo Cribb, as reuniões do Comitê Gestor são realizadas para avaliar o andamento das atividades programadas. Como consequências das avaliações, são formuladas recomendações para a gestão administrativa e técnica dos projetos.
INSCRIÇÃO NO GRUPO
O pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos informa que, após a inscrição, cada membro do grupo pode entrar em contato com os demais integrantes, recebendo as mensagens trocadas por todos.
“Ele pode emitir suas dúvidas, solicitar esclarecimentos e formular seus comentários. Junto com cada inscrito, existe um amplo leque de pessoas dinamizando debates sobre os desafios da cadeia.”
Cribb lembra que a ideia de criar o grupo decorreu da constatação de que, na cadeia ranícola brasileira, a entrada e a permanência de empreendimentos familiares, bem como a ampliação de seus investimentos, são inibidas pela baixa disponibilidade de informações tecnológicas, gerenciais, mercadológicas e socioeconômicas.
“Tal inibição tem sido vista como um dos principais fatores do desequilíbrio mercadológico da cadeia ranícola, cuja demanda potencial por produtos e derivados de rãs é aproximadamente três vezes maior do que sua oferta real. Entretanto, a cadeia ranícola nacional tem fortes potencialidades naturais e tecnológicas para reduzir ou eliminar esse desequilíbrio.”
Nesta perspectiva e em razão de seu reduzido custo de produção, ressalta Cribb, “a atividade ranícola se apresenta como uma atraente alternativa de negócios para empreendedores familiares e agricultores excluídos que, no entanto, precisam amplamente de informações de fácil acesso”.
HISTÓRICO
O grupo Ranicultura em Rede nasceu em 2010, após um workshop realizado sobre o projeto de “Avaliação e Transferência da Tecnologia de Processamento da Carne de Dorso de Rã”, executado entre 2009 e 2012 e liderado por André Yves Cribb, pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
Para alcançar os objetivos estabelecidos para este projeto, foi formada uma equipe composta por pesquisadores e analistas de aproximadamente dez organizações de pesquisa científica, assistência técnica e extensão rural.
Atualmente, esta mesma equipe, reforçada por pesquisadores e analistas de outras organizações, está conduzindo há quase três anos outro projeto – “Construção de uma rede de interação e aprendizagem para a transferência de tecnologia na cadeia ranícola brasileira” -, que como principal objetivo consolidar o Ranicultura em Rede.
“Uma das ações já realizadas por este segundo projeto foi a criação de um website capaz de facilitar a interação e aprendizagem entre os diferentes atores da cadeia ranícola”, informa Cribb.
APROVEITAMENTO DO PRODUTO
Cribb salienta que, no Brasil em geral e notadamente na região Sudeste, a cadeia produtiva da rã tem sido afetada por um problema relacionado ao aproveitamento do produto. A carne, parte da rã mais utilizada na alimentação humana, vem da carcaça, que equivale a aproximadamente 52% do peso vivo do animal.
Ele detalha que a carcaça é constituída das coxas e do dorso, sendo que este último, que inclui os braços, representa 47,3% da carcaça, dos quais 87% são músculos. Entretanto, o consumo é essencialmente das coxas.
“A coxa de rã apresenta alto valor comercial. O mesmo não ocorre com o dorso que representa quase metade do peso da carcaça e recebe em média 10% do preço pago para a coxa. No mercado consumidor, o dorso é objeto de baixa procura por conter quantidade relativamente grande de ossos e cartilagem.”
Segundo Cribb, a tecnologia de aproveitamento e valorização da carne de dorso de rã está baseada na desossa mecânica do dorso (para a produção da salsicha e do patê) e na desossa manual do dorso (para a conserva).
“A desossa mecânica se refere aos procedimentos da CMS (Carne Mecanicamente Separada), utilizada para extrair a carne do dorso de rã. No processo de obtenção dos produtos, a carne recebe tratamentos específicos.”
ALIMENTOS FEITOS COM CARNE DE RÃ
Patês, salsichas e conservas de carne de rã foram desenvolvidos em 2006, graças à iniciativa da Embrapa Agroindústria de Alimentos com o intuito de colaborar com o aproveitamento e valorização da carne de dorso de rã.
“Esse trabalho foi feito em parceria com o Centro de Tecnologia de Alimentos e Bebidas, do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), com financiamento do Projeto de Apoio ao Desenvolvimento de Tecnologia Agropecuária para o Brasil (Prodetab)”, conta o pesquisador.
Os produtos (patês, salsichas e conservas de carne de rã), obtidos a partir da tecnologia de aproveitamento e valorização da carne de dorso de rã, “foram satisfatoriamente validados por meio de testes sensoriais em laboratórios”.
“Para o patê, foram avaliados os atributos de esterilidade comercial, espalhabilidade, umidade, cremosidade, aroma e sabor. No caso da salsicha, foram testados os atributos de aroma característico, maciez, borrachento, umidade e sabor característico. Quanto à conserva, foram observados os atributos de aparência da carne de rã, cor do molho, aroma da carne de rã, consistência do molho da carne de rã, textura da carne de rã, sabor, intenção de compra por consumidores”, pontua Cribb.
MERCADO CONSUMIDOR
O produto da rã mais aceito e valorizado comercialmente é a carne, de acordo com o pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
“Por isso, a atenção dos atores da cadeia ranícola está mais voltada para este produto. Observa-se que outras partes da rã podem ser economicamente aproveitadas, entre elas a pele, a gordura visceral, o fígado e as tripas.”
Cribb ainda destaca que a pele da rã tem sido usada para o tratamento de queimaduras e para a obtenção de couro na confecção de sapatos, cintos, enfeites, bolsas, casacos, entre outros itens de vestuário.
“A gordura visceral, em razão de sua alta riqueza em ômega-3, pode ser usada para a fabricação de produtos cosméticos. O fígado é utilizado para fazer patê bastante nutritivo. As tripas servem para elaborar fios cirúrgicos que não precisam ser retirados graças a sua absorção pelo organismo humano.”
Conforme Cribb, estes subprodutos são de grande valor econômico. “Seu aproveitamento pode ser bastante interessante para investidores e empreendedores, devido à possibilidade de bom retorno financeiro com sua venda.”
CAPACITAÇÃO
Para disseminar os conhecimentos da cadeira ranícola, o pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos garante que são feitos dois tipos de atividades: capacitação de técnicos extensionistas e treinamento de gerentes e operários de empreendimentos do segmento.
“O acesso aos dois tipos de eventos também é gratuito. Nos últimos três anos, nós realizamos um curso de capacitação e uma oficina de treinamento em cada um dos quatro estados da região Sudeste do Brasil Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo. Como resultados desses eventos, foram capacitados 48 extensionistas multiplicadores e treinados 126 produtores.”
Para mais informações sobre o projeto, acesse www.embrapa.mediasystems.com.br/projeto.
Por equipe SNA/RJ