Este ano, no centenário da seca de 1915, que matou milhares de pessoas e animais, arrasou plantações e cidades inteiras no sertão do Nordeste brasileiro, a Embrapa avança no desenvolvendo das primeiras cultivares de feijão-caupi tolerantes à estiagem. Dez linhagens do tipo grão sempre-verde, submetidas ao estresse hídrico, no Piauí, apresentaram uma produtividade em torno de 2 toneladas por hectare. Em média, cultivares que já estão no mercado têm produtividade de 1.1 tonelada por hectare.
A pesquisa é inédita no mundo. E a partir do segundo semestre deste ano, até 2016, as 10 melhores linhagens identificadas até agora serão testadas em diferentes ambientes dos estados do Piauí, Ceará, Pernambuco e Bahia, que têm poucas chuvas ao longo do ano. A equipe de pesquisadores prevê que até 2017, pelo menos duas cultivares de feijão-caupi tolerantes à seca chegarão ao mercado brasileiro, como resultado desse trabalho da Embrapa.
A maior produtividade dessas linhagens aconteceu nos meses de agosto e setembro de 2014, período historicamente de falta de chuvas e intenso calor em Teresina e no restante do Nordeste, com temperaturas chegando a 40 graus. A excelente produtividade ocorreu quando os genótipos de feijão-caupi receberam apenas 190 milímetros de água, “um pouco a mais da metade da lâmina de irrigação que a espécie requer para as condições de solo e clima do semiárido. É um resultado fantástico”, comemorou Edson Bastos, pesquisador da Embrapa Meio-Norte (PI).
Para conduzir um experimento nessa linha de pesquisa e impor déficit hídrico, segundo o pesquisador, a irrigação é suspensa um pouco antes do florescimento das plantas, em torno de 35 dias após o plantio. A partir desse período, de acordo com Bastos, o teor de água no solo é monitorado pelo equipamento Diviner, que mede a umidade do solo a cada dez centímetros até uma profundidade de um metro. As leituras são feitas todo dia, e “quando a água do solo fica em torno de 20% da disponibilidade às plantas, volta-se a irrigar parcialmente”.
Esforço para reduzir o problema do sertão
“Nosso objetivo é resolver o problema do pequeno agricultor, que com a seca praticamente não produz feijão nem mesmo para comer”, diz o geneticista Kaesel Damasceno, pesquisador da Embrapa Meio-Norte e coordenador do estudo. O esforço para reverter o problema de milhões de agricultores começou a ganhar vida em 2010, com o cruzamento de linhagens do acervo do banco de germoplasma de feijão-caupi da Embrapa Meio-Norte. Do cruzamento de seis parentais, foram geradas 30 populações que passaram a ser avaliadas sob forte estresse hídrico.
O pesquisador revela que, das 30 populações, foram avaliadas 1.152 plantas, “das quais, após duas gerações de seleção, surgiram 42 linhagens, das quais dez se destacaram com uma produtividade de grãos acima da média”. Essa produtividade, segundo o Damasceno, anima a equipe a aprofundar os estudos para desenvolver mais cultivares tolerantes à seca e que “possa dar soluções tecnológicas para os agricultores do semiárido e também da região dos cerrados, onde há falta de chuvas em alguns pontos”. O CNPq é parceiro da Embrapa na pesquisa.
Historicamente, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a média anual de chuvas no Nordeste e no Norte de Minas Gerais, região do polígono das secas, é de 550 milímetros, com distribuição irregular. A informação está na escala das Normais Climatológicas do Brasil, que é a referência para os estudos da Organização Meteorológica Mundial, com dados de 414 estações meteorológicas de superfície.
O polígono das secas abrange oito estados nordestinos – o Maranhão é a exceção. A área tem 1.108.434,82 metros quadrados e corresponde a 1.348 municípios. As secas são classificadas em hidrológicas, agrícolas e efetivas. A hidrológica é caraterizada por uma pequena, mas bem distribuída precipitação que dão suporte à agricultura de subsistência e às pastagens.
Já a seca agrícola, conhecida como seca-verde, acontece quando há chuvas em abundância, mas são mal distribuídas em termos de tempo e espaço. A seca efetiva é caracterizada quando há baixa precipitação e má distribuição de chuvas, o que torna difícil a alimentação das populações e dos animais. Os estados que têm maior percentual de área no semiárido são: Ceará – 91,98%; Rio Grande do Norte – 91,69%; Paraíba – 89,65%.
Foco nas exportações
O Programa Nacional de Melhoramento Genético do Feijão-Caupi, liderado pela Embrapa Meio-Norte, já selecionou 26 linhas do tipo fradinho, que hoje é importado do Peru para abastecer o mercado brasileiro. Kaesel Damasceno prevê que em 2016 serão selecionadas as melhores linhagens para registro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e, em seguida, lançadas as cultivares comerciais. Ele garante que essas linhagens se destacam pela alta qualidade dos grãos, no formato e tamanho, além do porte ereto, que facilita o manejo da cultura. Outro trabalho em execução é o pré-melhoramento de linhagens para o manejo de pragas e doenças.
O pesquisador anuncia também para daqui a três anos o lançamento de novas cultivares de feijão-caupi do tipo sempre-verde, que produzam plantas de porte ereto e com alto desempenho produtivo. O sempre-verde é o preferido no Nordeste brasileiro. Mas hoje o mercado ainda é limitado, já que não dispõe de novas cultivares que apresentem, além do tegumento sempre-verde, plantas de porte ereto. A carência de cultivares com esse perfil, segundo Damasceno, não anima os produtores dos cerrados, que adotam tecnologias avançadas, a investir nesse tipo de grão de feijão-caupi.
Rico em proteínas, ferro, zinco e fibras, o feijão-caupi é a base alimentar da população do Nordeste brasileiro, principalmente do semiárido. Gerando emprego e renda, a produção ganha espaço também no Norte, com destaque para o Estado do Pará, e alcança a melhor performance no Centro-Oeste. E é no Estado do Mato Grosso que ele reina absoluto avançando ano após ano, sempre em primeiro lugar na produção. Em 2014, segundo o IBGE, a produção brasileira de feijão-caupi foi de 303.600 toneladas. Na safra de 2013, foram produzidas 280.300 toneladas.
Também em 2014, o feijão-caupi ocupou um lugar de destaque na pauta de exportações de produtos agrícolas do Brasil. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, saíram do País quase 53 milhões de toneladas com destino à Europa e países da Ásia e Oriente Médio. Índia, Egito, Turquia e Vietnã foram os países que mais compraram o produto brasileiro. O País faturou nada menos do que US$ 33.2 milhões. Mato Grosso foi o Estado que mais exportou: 48.4 milhões de toneladas. De janeiro a fevereiro deste ano, o Brasil já exportou para oito países 873.600 toneladas de feijão-caupi, segundo a Secretaria de Comércio Exterior.
Fonte: Embrapa