Palestra de Marcos Fava Neves* proferida em São Paulo, durante almoço comemorativo de fim de ano promovido pela Sociedade Rural Brasileira (SRB)
“Senhoras e senhores,
Confesso ter ficado muito honrado com o convite para fazer esta exposição no tradicional almoço de encerramento do ano (em sua nonagésima quinta edição) desta casa histórica do nosso país, a Sociedade Rural Brasileira. Aproveito este tempo para tocar em alguns assuntos de interesse aos produtores do Brasil. Divido a análise em 6 partes, começando pelo cenário macroeconômico e evoluindo para as questões estruturais do agronegócio.
1 – A macroeconomia sem alavancar o agronegócio em 2015
O ano de 2015 deve ser um dos anos mais difíceis dos últimos anos, face aos ajustes que precisam ser feitos e ao elevado grau de incertezas que temos pela frente. Acredito que:
– Mesmo com esforços do governo, teremos uma inflação persistente, ficando na casa de 6 a 7%;
– Teremos aumentos de preços administrados, com destaque para gasolina (CIDE visando arrecadação), diesel e energia, a depender da situação de preços do petróleo;
– Creio numa ligeira desvalorização cambial com o real permanecendo entre US$2,60 a US$2,80 em 2015 e passando a mais de US$3,00 em 2016/17;
– O País apresentará um crescimento quase nulo (0 a 0,5%) refletindo no ânimo das pessoas comuns, dos investidores, e este baixo crescimento deve perdurar por mais dois a três anos;
– Juros devem ficar mais elevados (Selic 12%) para combater a persistente inflação e face ao surpreendente crescimento econômico recente dos EUA, deve subir por lá, refletindo em crédito e na taxa de câmbio;
– Forte redução do gasto público (superávit de 1,5% a 2%) afetará investimentos, obras e a economia como um todo;
– Endividamento das famílias está elevado não tendo muita margem para ampliar crédito, afetando negativamente no consumo com maior austeridade no comportamento de compra;
– Mesmo com a indicação de uma equipe econômica “pró-mercado”, observa-se ainda baixa confiança dos empresários, também refletindo em investimentos;
– Teremos aumento do desemprego e da insegurança urbana e rural;
– Governabilidade ficou mais comprometida pelo resultado das eleições que fortaleceu a oposição.
– Observam-se crescentes movimentos sociais contra a má-gestão e a corrupção;
– Ainda não se sabe o tamanho da crise da corrupção na Petrobrás e o efeito “dominó nas estatais”, quando estas forem atingidas também, paralisando a gestão pública.
Estas questões todas colocadas impactarão o País e também a agricultura e os mercados de alimentos, tanto no consumo quanto nas pressões para redução de preços. Nestes casos, sempre sofrem mais os mercados de produtos mais supérfluos na alimentação. Os impactos específicos na agricultura são abordados na próxima sessão.
Ressalto que com ajustes adequados e dolorosos, o Brasil tem condições de retomar o crescimento, pois existem pontos positivos na macroeconomia, como o alto volume de reservas, o país apresenta condições importantes para atrair capitais internacionais para investimentos de longo prazo, como vem atraindo anualmente, afinal apresenta o sétimo maior mercado consumidor do mundo, com grande presença de recursos produtivos sub-explorados e valores consolidados como a democracia e instituições, tanto na área pública quanto privada. Portanto, apesar do momento e do estágio onde chegamos, não podemos perder a confiança e esperança em nossa economia.
2 – O complexo cenário em 2015 para a agricultura
A safra 14/15 será desafiadora, após anos de bonança em preços, a rentabilidade da produção de grãos deverá cair face principalmente a grandes safras no mundo, notadamente nos EUA, e expectativas também de bons plantios e produções nos países do Mercosul.
A CONAB estima uma safra de grãos entre 194.4 a 199.9 milhões de toneladas, podendo ser 0,1% menor que a safra 2013/14 até 2,7% maior no limite superior. Esta será produzida em uma área entre 56.6 a 58.1 milhões de hectares (2013/14 foi de 56.96 milhões de hectares) com produtividades esperadas ligeiramente acima das observadas em 2013/14.
Os dois principais produtos, milho e soja, devem ter bom desempenho, sendo a produção de soja esperada entre 89,3 milhões de toneladas e 91.7 milhões de toneladas, contra 86.1 milhões de toneladas na safra 2013/14. No caso do milho, a produção esperada fica entre 77.3 e 78.9 milhões de toneladas, contra 79.9 milhões de toneladas na safra 2013/14.
São esperados os seguintes fatos e impactos:
– Menores preços das principais commodities agrícolas quando comparados aos anos de bonança, mas acima dos preços de antes de 2007/2008. Devem ficar na parte mais baixa do novo patamar de preços;
– Maior flutuação das cotações, principalmente na soja e, mesmo com cotações médias mais baixas existirão oportunidades para fixação de preços em patamares interessantes em alguns momentos, prevalecendo a habilidade de comercialização. Produtores postergaram a comercialização e não fixaram preços no aguardo condições mais atrativas;
– Deve aumentar o risco de crédito ao distribuidor de insumos, tanto para revendas como para cooperativas, em alguns casos com solicitação de prorrogação de prazos de pagamentos. Isto pode fortalecer a prática de “barter”, pois proporciona hedge ao agricultor e reduz risco de recebimento. É um ano onde ganham maior importância as políticas de crédito conservadoras;
– Não são esperados grandes impactos negativos do clima;
– Em ano de menor rentabilidade, existe sempre a possibilidade do agricultor optar por soluções tecnológicas de menor custo. Fertilizantes e sementes são mais sensíveis à queda de rentabilidade do que os agroquímicos, e o maior impacto em vendas serão em máquinas e implementos, pois são a solução menos dolorosa nas decisões de postergar investimentos;
– Desafio maior de rentabilidade nas novas fronteiras agrícolas, com incremento de risco nas áreas de expansão, podendo elevar a participação de arrendamentos;
– Desvalorização do real em relação ao dólar gera riscos para insumos importados e necessidade de hedge, por outro lado compensação de preços por um real mais desvalorizado;
– Mesmo com este cenário mais complicado, acredito em expansão da área agrícola, pelos fundamentos favoráveis de médio e longo prazo de nossa agricultura. Áreas em expansão carregam favoravelmente o mercado de insumos continua em expansão, o desafio será a oferta de crédito;
– Momentos difíceis aceleram o processo de concentração e profissionalização do setor, pois produtores com melhor gerenciamentos e controles, consequentemente mais capitalizados, saem a frente nestes momentos;
– Logicamente, qualquer evento climático não esperado muda o quadro, como mudou em anos anteriores, afinal, lidar com a incerteza é inerente à agricultura.
Apesar de dificuldades previstas na safra 2014/15, existe uma preocupação que gostaria de levantar, mais estrutural, que pode atrapalhar a conquista de mercados pela agricultura brasileira: o aumento dos custos de se produzir no Brasil.
3 – O preocupante aumento dos custos de produção no Brasil
Apesar dos incríveis ganhos de eficiência e produtividade em muitos setores, do show na renda agrícola, que passou de R$ 257 bilhões em 2004 para provavelmente mais de R$ 450 bilhões em 2014, e do salto nas exportações, que passaram de US$ 20 bilhões em 2000 para praticamente US$ 100 bilhões, nestes últimos anos, a agricultura brasileira passou por algumas transformações que merecem destaque, entre elas, o considerável aumento de custos de produção nos últimos anos, principalmente devido às seguintes questões:
– Custo do trabalho (aumento de 100% em dólar em 10 anos) e das crescentes exigências e questões trabalhistas;
– Pessoas deixando de procurar trabalho afetando a disponibilidade e o custo da mão de obra (61 milhões em idade de trabalho não procuram emprego, não trabalham e não estudam no Brasil);
– Custos ligados aos aspectos ambientais, exigências e normas;
– Custos do crime, com roubos de cargas, de propriedades, necessidade crescente de seguros e segurança nas propriedades e fortalecimento do crime organizado no Brasil;
– Custos das operações logísticas, apesar de recentes privatizações, é o ponto que poderia ser mais facilmente resolvido, mas caminha muito aquém das possibilidades;
– Custos ligados aos tributos e principalmente, à complexidade tributária;
– Custos gerais da burocracia do Estado, do tempo gasto e dos excessos de procedimentos, tamanho excessivo e reduzida eficiência do governo;
– Custos crescentes e menor disponibilidade de capital, com elevação de juros e dificuldades de acesso ao crédito governamental;
– Custo “cambial”, com a excessiva valorização do real penalizando a atividade exportadora;
– Custo da corrupção nas empresas estatais e no governo, nos três níveis (federal, estadual e municipal), onerando o setor produtivo;
– Retorno da inflação;
– Falta de adequado entendimento do Judiciário sobre o funcionamento das cadeias produtivas e os recentes casos de intervenções inadequadas na citricultura e na cana;
– Perda de eficiência nas Agências Reguladoras, notadamente a lentidão nos processos de aprovação na ANVISA, dificultando acesso a produtos importantes tanto para plantio quanto para defesa da produção;
– Crescente custo ideológico, com movimentos contra a produção, contra as empresas e o lucro. Convido-os a lerem o artigo “A Ameaça Progressista”, disponível no site da SRB (http://www.srb.org.br/).
Estes fatos todos, que não são exclusivos à agricultura, fizeram com que a geração de renda no Brasil ficasse comprometida, o que se observa com o crescimento quase zero de nossa economia e a redução de 3% da atividade industrial, observada em 2014. Este comprometimento na geração de renda está comprometendo e vai comprometer a distribuição de renda em 2015.
É necessário o setor público e privado trabalharem fortemente para reduzir estes custos de produção visando tornar o país mais competitivo e os produtores, mais capazes de suportar períodos de menores preços e continuar conquistando espaço no mercado internacional, gerando dólares para impulsionar o crescimento do Brasil.
Caso isto não seja feito, o Brasil corre grandes riscos de não ser o vencedor no indiscutível aumento de consumo de alimentos que ocorrerá no mundo, que comento mais adiante. Feita esta análise do aumento dos custos de produção, a próxima sessão aborda mudanças estruturais nas cadeias produtivas do agronegócio, que transformam o rural de maneira definitiva.
4 – Mudanças estruturais da agricultura
Entre muitos países produtores, o Brasil é provavelmente o que mais de se adequa a análises dessas tendências e mudanças apresentadas a seguir. É o novo cenário da agricultura, interferindo cada vez mais na vida dos agricultores.
– Viveremos períodos de aumento da volatilidade de preços na agricultura do mundo;
– Novos riscos devido às mudanças climáticas;
– Crescentes interferências das políticas governamentais, sejam de impostos, acesso a mercados e outros tipos de controles;
– Portfólio tecnológico e acesso à tecnologia assumindo uma posição cada vez mais importante;
– Aumento na concentração dos produtores rurais (mais propriedades sendo gerenciadas por um número menor de produtores mais eficientes);
– Mudanças no comportamento do produtor, cada vez mais profissionalizado e informado aumentando constantemente o conhecimento técnico e mercadológico;
– Maior acesso à informação, a maioria destas de graça, sobre fornecimento de produtos e serviços e também sobre os preços praticados em diferentes regiões;
– Diversificação da agricultura para outras regiões e atividades, incluindo integração de grãos com produção de proteína animal, energia (biomassa) e atividades florestais;
– Aumento das necessidades de capital, com necessidade de desenvolver novas alternativas de suporte e crédito para atender as necessidades de capital de giro dos agricultores;
– Interferências e restrições sobre o uso da terra;
– Oportunidades para o trabalho urbano estão aumentando dificultando a mão de obra rural;
– Escassez de recursos necessários para a produção agrícola em muitas regiões, notadamente China e Índia;
– A necessidade de se aumentar a escala é um princípio básico para ganho de eficiência e redução de custos com necessidade de boa gestão da terra, ativos e custos;
– Mudança no balanço de poder na direção dos agricultores organizados;
– Agricultores estão se organizando em cada vez mais grupos de compra, cooperativas e centrais de cooperativas. Necessidade de boa gestão da terra, ativos e custos;
– Vários atributos de compra demandando diferentes abordagens para atender a diferentes perfis de agricultores e a combinação de atributos técnicos, relacionais e de preço estão se tornando cada vez mais importante ao se analisar o comportamento de compra dos agricultores;
– Aumento da exposição ao risco e da demanda por capital devido à oferta de produtos e serviços mais sofisticados no mercado;
– O uso da tecnologia irá permitir mudanças incríveis no futuro, a maioria relacionada à agricultura digital (“nas nuvens”);
– Grandes desafios no tocante à sucessão nas propriedades rurais, nas entidades de classe, associações, sindicatos e cooperativas, entre outros;
– Uma nova era de governança nas organizações (entidades de classe, associações, sindicatos e cooperativas).
Em se pensando nestas mudanças, fica evidente que a agricultura em 2025 será muito diferente do formato atual de se produzir. O importante disto tudo é que não faltarão oportunidades para se colocar os produtos dos países que produzirão de maneira eficiente, e o Brasil tem grandes chances de aumentar fortemente as exportações no cenário atual, e mais ainda se fizer as reformas estruturantes demandadas no item 3.
5 – O Brasil tem oportunidades imensas no curto, médio e longo prazo
Os direcionadores (drivers) de consumo são muito positivos para a agricultura, e podem ser resumidos nos seguintes:
– População chegará a 9 bilhões de pessoas em 2050, portanto necessitamos produzir para mais 2 bilhões;
– Existe intensa urbanização, estimada em cerca de 90 milhões de pessoas por ano, que impacta no hábito de consumo (mais proteína demandando mais grãos) e nas quantidades demandadas de produtos;
– Crescimento econômico mundial, principalmente nos países emergentes, que são os grandes mercados futuros de alimentos, impactando diretamente em suas necessidades de importações;
– Distribuição de renda na sociedade impacta positivamente o consumo e esta vem acontecendo, aliada ao crescimento econômico;
– Grandes programas governamentais de distribuição de alimentos e de renda à parcela mais miserável das populações impactam fortemente o consumo;
– Crescimento do mercado de alimentação para animais, sejam os produtores de proteína, como de recreação (mercado pet), com taxas elevadíssimas em muitos países;
– Onda BIO: mesmo com o preço do petróleo em baixa, o que traz ameaças, volta a crescer no mundo a conscientização do biocombustível, desde o etanol, biodiesel, bioquerosene, biogasolina, bio-pneu, bio-plástico, bio-eletricidade, todos demandando produção agrícola. Todo país que assina uma meta de uso de biocombustível misturado ao combustível fóssil abre uma oportunidade ao Brasil.
É um desafio avaliar quais países do mundo estão mostrando as maiores oportunidades em termos de crescimento no mercado de alimentos e quais as principais características comuns entre eles. Antes de apresentar suas características comuns, convido os à rápida viagem virtual em meio a alguns números surpreendentes que mostram a urbanização e mudança de consumo.
A Indonésia possui cerca de 252 milhões de habitantes e a rede de fast food KFC inaugurou sua primeira loja em 1979 sendo que em 2013 a rede já possuía 470 restaurantes no mesmo. Em 2011, a Indonésia possuía 5.900 restaurantes fast food e para 2017 é esperado que o país alcance cerca de 9.000 unidades. Com 175 milhões de habitantes, a Nigéria teve sua primeira loja da rede KFC em 2009, sendo que após 3 anos esse número saltou para 25. Na Nigéria, a indústria do fast food cresce mais de 10% ao ano.
O McDonald’s iniciou suas atividades na China em 1990. Hoje o país conta com 2.000 restaurantes sendo o terceiro maior mercado da companhia com US$2,8 bilhões em vendas em 2013. O Vietnã possui quase 100 milhões de habitantes e o fast food está crescendo 26% ao ano, triplicando os restaurantes em 5 anos. A rede KFC inaugurou seu primeiro restaurante em 2011 e atualmente possui 140 lojas que geram cerca de 4.000 empregos. O McDonald´s abriu sua primeira loja no Vietnã em 2014 e atendeu 20.000 consumidores nos dois primeiros dias. O Paquistão possui quase 200 milhões de habitantes e representa um mercado de U$S1 bilhão por ano com crescimento anual de 20%, para ficar em alguns exemplos.
Essa explosão no número de redes fast food ocorre pois essas companhias conquistaram a confiança dos consumidores contando com alta confiabilidade em suas cadeias de suprimento e demonstrando preocupações com questões relacionadas à saúde da população. Também é possível notar que ocorreu uma ocidentalização das novas gerações com o grande uso de dispositivos móveis. São pelo menos 12 os fatores que temos que observar para identificar os mercados de alimentos em expansão nos próximos anos e que merecem atenção por parte das empresas brasileiras e ações de construção de posições nestes mercados:
– Grandes populações (em quantidade de habitantes);
– Populações crescentes (taxa de crescimento da população);
– Elevada população jovem (com tendência de crescimento);
– Rápida urbanização (alto percentual de pessoas que ainda vivem na área rural e estão se mudando para as cidades);
– Geração de renda (crescimento do PIB);
– Distribuição de renda (crescimento da classe media);
– Possuem recursos com valor a serem exportados (petróleo/gás/minerais) gerando capacidade para pagar pelas importações de alimentos;
– Apresentam deficiência em recursos produtivos (baixa disponibilidade de terras, de água, ausência de outros recursos e capacidade para investir e receber investimentos estrangeiros diretos para a produção de alimentos);
– Leis que favorecem a importação de alimentos (abertura para importações, poucas barreiras como taxas de importação, cotas, barreiras sanitárias;
– Apresentam sensibilidade decrescente trazendo esforços reduzidos para a questão de segurança alimentar/produção local e apresentam estabilidade dos governos/ ambientes institucionais;
– Adoção de políticas favoráveis à mistura de biocombustíveis na gasolina;
– Disponibilidade de canais de distribuição para importação e sistemas logísticos factíveis. Apresentam atratividade para que varejistas internacionais levem alimentos a esses países utilizando recursos estratégicos globais (estratégias de “global sourcing”;
– Taxas de câmbio que favorecem a importação de alimentos (moedas locais valorizadas).
Como alguns exemplos, China, Índia, Indonésia, Vietnam, Paquistão, Nigéria, Angola, África do Sul e países agregados do Oriente Médio, entre muitos outros. Ainda veremos grandes surpresas nesses países, uma vez que os mesmos possuem muitos mercados de rua, alta informalidade nas cadeias alimentares e ausência de dados disponíveis. Passarão cada vez mais a serem grandes importadores. Essas são algumas características dos países que não podem deixar de constar nas estratégias de organizações mundiais de bens de consumo para os próximos anos, sendo grandes oportunidades para países exportadores de alimentos como o Brasil.
6 – Quem vencerá a disputa da oferta de alimentos aos crescentes mercados?
Os países e regiões vencedoras na oferta de alimentos para a crescente demanda são os que tiverem e manejarem bem os recursos necessários para se produzir, sejam os naturais (fontes de vantagem comparativa) como os inerentes à atividade humana (fontes de vantagem competitiva).
Aqui estão como uma lista de trabalho.
– Terra e solo (disponibilidade e preço);
– Água e clima (presença e custo);
– Fator trabalho, com disponibilidade de mão de obra produtiva, e qualidade da educação;
– Nutrientes (fertilizantes…) disponíveis e a preços competitivos;
– Tecnologia, pesquisa e desenvolvimento fortes gerando soluções aos problemas e produtividade;
– Informação disponível e conectividade (velocidade de transmissão de informações);
– Disponibilidade de capital: crédito ($) para investimentos e seguro de produção e renda;
– Instituições (leis) com credibilidade e confiança e em contínuo aprimoramento;
– Organizações (associações) eficientes e propositivas, bem gerenciadas;
– Eficiência de governos, promovendo investimentos, marcos regulatórios e privatizações;
– Energia – disponibilidade e competitividade de custos para os produtores;
– Capacidade de estocagem, malha eficiente de transporte e operações logísticas;
– Capacidade de gestão agrícola nas propriedades, evitando duplicidades e desperdícios;
– Capacidade de coordenação da cadeia produtiva (sistema agroindustrial) reduzindo custos de transação e promovendo ações conjuntas para desenvolvimento setorial;
– Comunicação adequada da atividade produtiva como geradora de valor na sociedade;
Estes são os recursos que precisam ser trabalhados para maior competitividade do agronegócio, via governo e cadeias produtivas integradas, e com isto aumentar a capacidade de geração de renda no Brasil, que possibilitará o governo continuar as ações de distribuição de renda.
Além da agenda de políticas e ações públicas, é fundamental a presença de um setor privado ativo, inovador. Portanto, no âmbito empresarial, sempre relacionado com o público, é necessário às empresas atuarem no modelo que chamo de CCCV (criação, captura e compartilhamento de valor), visando o tripé de ações estratégicas em diferenciação, custos e ações coletivas.
Em diferenciação destaco as importantes estratégias de CCCV ligadas à: construir uma abordagem de relacionamento integrado e oferta de soluções ao comprador; fortalecer sempre a pesquisa e a inovação, construir estratégias de fidelização, inovando em produtos/serviços, imagem e marca, soluções de embalagens, canais e força de vendas, serviços e finalmente, ter como foco oferecer performance para o comprador. Buscar sempre a sustentabilidade e as certificações de excelência.
Em custos destaco as importantes estratégias de CCCV ligadas à: explorar com competência atividade central da empresa (o core business); melhor uso de todos os ativos e recursos de organização; estratégia de produção em escala; qualidade, segurança e custos de insumos; eficiência em trabalho (simplicidade); contínuo redesenho das operações; estímulo de competição entre fornecedores; arquitetura financeira criativa (fontes de $$); reduzir o poder de barganha dos vendedores; busca dos melhores momentos de compras; contratos estáveis buscando reduzir custos de transação; uso intensivo de inovações tecnológicas redutoras de custos e gestão “celular” dos custos de produção.
Finalmente, em ações coletivas, destaco as importantes estratégias de CCCV ligadas à: ações coletivas horizontais (empresas da mesma indústria) e verticais (da mesma cadeia produtiva), ações com empresas não relacionadas; fortalecer as associações setoriais e entidades de representação, participar de cooperativas, criar a fortalecer consórcios e alianças estratégicas, entre outras formas de trabalho cooperativo. Melhorar a cadeia de suprimentos via montagem de centrais de compras, ações conjuntas em produtos/marcas/embalagens e serviços, canais de distribuição e vendas, comunicação, precificação, entre outras. É uma área onde o agro brasileiro tem muito a melhorar.
Estas seriam então as contrapartidas, ou as estratégias do setor privado para um agronegócio brasileiro cada vez mais competitivo.
Conclusão
Apesar de um 2015 muito difícil, acredito que com ações adequadas nos ambientes públicos e privados para redução dos custos de produção no Brasil e melhoria na utilização de recursos, listados no item anterior, temos condições de continuar avançando sustentavelmente em direção à mais produção e mais exportações. O agronegócio não é a única, mas sem dúvida é a maior chance aberta à sociedade brasileira para inserção mundial nos próximos 30 anos, promovendo com isto o desenvolvimento econômico, social e ambiental de nossa sociedade.
O próximo passo é olhar como fazer isto, à partir desta lista e trabalhar fortemente em um plano estratégico com claros objetivos, adequadas estratégias e arrojados indicadores a serem alcançados. Desejo a todos um feliz natal, com muito diálogo e congraçamento, e um 2015 com muita saúde e trabalho, que serão necessários para enfrentar a situação que teremos pela frente. Também desejo a todos grandes realizações no âmbito pessoal no ano que se inicia. Obrigado à Sociedade Rural Brasileira por este inesquecível convite.
* Marcos Fava Neves é professor titular de Planejamento e Estratégia na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, Campus de Ribeirão Preto e coordenador científico da Markestrat. Contato: favaneves@gmail.com