Paulo Hartung, otimista com a economia verde (parte II)

Foto: Gladstone Campos

 

Primeira parte, veja — aqui

Confira segunda parte da entrevista

SNA: A interlocução nacional e internacional da entidade se dá com governos, colegiados técnicos, imprensa e muitos outros grupos. Com o é esse diálogo num momento em que, internamente, há forte polarização, e, no exterior, a percepção que se tem do Brasil ainda é distante da realidade?

O diálogo tem que ser constante, proativo e positivo. Quando entrei na Ibá, uma de minhas missões era aproximar o setor de árvores cultivadas de brasileiros e brasileiras. Aos poucos estamos nos tornando mais conhecidos e admirados. Se antes as pessoas conheciam somente o produto, hoje muitas sabem que o papel do livro no Brasil vem 100% de árvores plantadas para fins produtivos, que tem um processo absolutamente sustentável e um pós-uso adequado. Artigos, entrevistas, participação em debates, composição de fóruns dentro do parlamento, interlocução com autoridades, enfim, estamos realizando uma série de ações que visam posicionar o setor de árvores cultivadas onde ele tem potencialidade para estar. A comunicação só é forte quando acompanhada de atitudes concretas e fatos que a subsidiem. Hoje o setor deu alguns passos em sua comunicação e este avanço liderado pela Ibá influenciou positivamente as  empresas que passaram a seguir o mesmo caminho. Um exemplo concreto da efetividade deste diálogo permanente foi o início da pandemia. Logo que identificamos que muitos setores estavam fechando temporariamente as portas para manter o cuidado do isolamento, conversamos com as autoridades da época, demonstrando a essencialidade do serviço e responsabilidade com a saúde dos colaboradores. O pleito foi prontamente atendido e as empresas continuaram trabalhando e provendo itens fundamentais, como máscaras cirúrgicas, papel para receitas, embalagens de papel para delivery e e-commerce, papel higiênico entre uma série de outros. Também fortalecemos o trabalho internacional da Ibá. No início de minha jornada na Ibá, reforcei o corpo diretivo da entidade, trazendo o Embaixador José Carlos da Fonseca Jr., que entre outras atribuições, cuida das relações internacionais. Diplomata de carreira, serviu duas vezes a Embaixada brasileira em Washington, assim como em Ottawa, Maputo, Manila, Abu Dhabi e Santiago. Foi ainda Ministro-Conselheiro em Nova Délhi e Embaixador do Brasil em Myanmar. Também tem participado das Conferências do Clima desde a Rio-92. Enfim, uma experiência muito profunda. Hoje a Ibá possui assentos na FAO, por meio do Advisory Committee on Sustainable Forest-based Industries (ACSFI), fórum de discussões da ONU que engloba soluções baseadas nas florestas produtivas; no Comitê Diretor do The Forests Dialogue (TFD), plataforma internacional de diálogo entre sociedade civil e iniciativa privada do setor florestal; e no ICFPA (International Council os Forests and Paper Associations), entidade de celulose e papel em nível global. Também vale mencionar participação ativa nas Conferências do Clima, da Biodiversidade e Congresso Mundial Florestal.

SNA: O senhor percorreu longa e vitoriosa trajetória política. Acredita que as decisões dos agentes públicos, em anos recentes, estão mais atreladas ao clamor ideológico do que ao pragmatismo na busca de acordos? No agronegócio em especial, a guerra de narrativas consome um tempo precioso do debate produtivo?

Sob qualquer ângulo é perceptível que o Brasil tem evoluído nos últimos anos. Demos importantes passos para o País que precisam ser reconhecidos. Aumentamos nossas reservas internacionais ao longo dos anos, o que nos tirou de crises cambiais; realizamos a Reforma Trabalhista; endereçamos a Reforma da Previdência, que a França teve enormes dificuldades para fazê-lo; aprovamos o marco do saneamento, essencial para garantir segurança jurídica e um impulso para investimentos no segmento; instituímos a autonomia do Banco Central; e atualmente estamos caminhando com a Reforma Tributária. Estes são alguns exemplos de avanços realizados por diferentes governos que não possuem a mesma ideologia. O agro é fruto deste avanço. A Embrapa, que completa 50 anos em 2023, é mais um exemplo desta evolução e, inegavelmente, é um dos vetores que possibilitou crescimento agrícola sustentável no País, por meio de seus estudos e pesquisas. Ainda temos muitos desafios que precisamos superar, é bem verdade, como educação básica deficitária, desigualdade social vergonhosa, saúde que é insuficiente, infraestrutura muito aquém do necessário, entre outras fragilidades. Por isso, é preciso um olhar equilibrado. A polarização é uma realidade mundial e não uma especificidade do Brasil. E assim como outros fenômenos políticos, ela vem e passa. O importante é ter cautela para fazer uma travessia segura neste momento, de olho no futuro do País.

SNA: Em sua opinião, quais dos cultivos em que o Brasil, já como expoente, pode crescer ainda mais, respeitando a visão e os valores de uma entidade como a Ibá?

Importante contextualizar que devido a movimentos globais, como a emergência climática, tensão entre EUA x China, pandemia e guerra na Ucrânia, o mundo está complexo e com grandes demandas. Grandes potências estão em busca de países confiáveis, estáveis e sustentáveis que possam ser provedores de alimentos, de energia limpa, de fibras, metais, entre outros produtos e serviços. Neste cenário, o Brasil tem a possibilidade de avançar no comércio internacional. Somos um País em paz, sem guerras ou conflitos com outras nações, o que nos possibilita evoluir em diversas áreas com segurança e estabilidade. Temos nos mostrado um parceiro confiável, que tem companhias de diversos segmentos provedoras de soluções sustentáveis, como a WEG Motores, Raízen, Embraer, Randon e as empresas do setor de árvores cultivadas. Além disso, na área de energia, podemos nos posicionar como provedores de energia limpa ao mundo. Temos sol, vento e importante experiência com biomassa e potencial para liderar a produção de hidrogênio verde. A urgente transição energética global já está iniciando o movimento de aumento de demanda por metais nobres, como nióbio, cobre e níquel. São fundamentais para produção dos fios de transmissão, baterias ambientalmente mais adequadas, turbinas para geração de energia eólica, painéis solares, entre outros. Mais uma via para avanço nacional. Também podemos ser uma das soluções na questão da insegurança alimentar. Na década de 1950 éramos importadores de alimentos e hoje ajudamos a alimentar cerca de 10% da população global. Recentemente foi lançado o Plana Flor (Plano Estratégico para Implementação do Código Florestal), iniciativa da qual faço parte do Conselho Consultivo. No plano estão detalhados dados e caminhos para crescimento sustentável, utilizando terras de baixa produtividade, com mapa de locais com terras degradadas que possuem aptidão para conversão para a agricultura, extensões que podem abrigar silvicultura, assim como locais para restauro de APPs e RLs, com capacidade de geração de emprego e renda. O Brasil está entre os 10 países que possuem maior potencial de nesta era da economia verde, mas é preciso transformar esta chance em oportunidades.

Por Marcelo Sá. com equipe SNA

 

 

 

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