Setor produtivo de maçã alerta para riscos de importações do mercado chinês

“A abertura do mercado para a importação de maçã da China seria um desastre para a produção brasileira, haja vista que o país detém mais de 50% da produção mundial dessa fruta”, argumenta o diretor executivo da Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM) Moisés Lopes de Albuquerque. Foto: Divulgação
“A abertura do mercado para a importação de maçã da China seria um desastre para a produção brasileira, haja vista que o país detém mais de 50% da produção mundial dessa fruta”, argumenta o diretor executivo da Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM) Moisés Lopes de Albuquerque. Foto: Divulgação

O setor produtivo está apreensivo com o risco de importação de maçãs da China em decorrência de problemas mercadológicos e, principalmente, fitossanitários – o país é o maior produtor da fruta e responde por metade da oferta mundial.

“O Brasil ainda não importa maçãs da China, mas uma possível abertura deste mercado poderia representar um risco muito grande para o País”, avalia o diretor-executivo da Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM), Moisés Lopes de Albuquerque.

Segundo estudo realizado pela ABPM, cerca de 130 espécies de pragas que ocorrem na China, mas que não existem no Brasil, são passíveis de serem introduzidas por meio de maçãs e/ou peras chinesas. “O país asiático convive com pragas que já foram erradicadas no Brasil, além de praticar preços baixos em virtude de subsídios aos produtores e do baixo custo da mão-de-obra.”

No começo deste mês, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado Federal realizou em São Joaquim, SC, uma sessão com a presença de produtores de maçã, especialistas, técnicos e representantes do governo para debater aspectos da produção, exportação e importação da fruta. “O interesse da China em exportar maçãs (e peras) para o Brasil, motivo de preocupação dos produtores brasileiros, dominou as discussões”, conta o presidente da ABPM.

“A abertura do mercado para a importação de maçã da China seria um desastre para a produção brasileira, haja vista que o país detém mais de 50% da produção mundial dessa fruta, ou, para ficar melhor entendido, se somarmos a produção de toda a fruticultura brasileira chegaremos a um número semelhante ao que a China produz apenas de maçãs”, calcula Albuquerque.

Segundo Albuquerque, a maçã é uma cultura altamente dependente de mão-de-obra, que representa cerca de 60% dos custos brasileiros: “O custo de mão-de-obra no Brasil é muito superior ao chinês; além disso, nos aspectos fitossanitários, temos mais de 100 pragas exóticas ao Brasil e que estão presentes na produção chinesa de maçãs e também de peras”.

 

RESÍDUOS DE PESTICIDAS

De acordo com Albuquerque, os resíduos de pesticidas também são ameaças: “A autoridades brasileiras são negligentes, e não se trata apenas da China, da maçã, mas dos alimentos frescos em geral que entram no País com resíduos de agroquímicos não registrados no Brasil, e, portanto, que não passaram pela avaliação, particularmente, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”.

Ele lembra, no entanto, que sempre que exportam os produtores brasileiros, por exemplo, são obrigados a seguir as normas do país de destino, ao passo que a legislação brasileira não é respeitada pelos produtores estrangeiros que exportam para o Brasil, bem como pelos importadores.

O executivo também cobra que, especificamente no caso das importações, os requisitos fitossanitários estabelecidos garantam ampla proteção ao sistema produtivo brasileiro, com riscos mínimos.

“As inspeções realizadas pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa), nos pontos de entrada, devem partir de uma amostragem representativa de toda a carga, e as interceptações de pragas devem ser tratadas com o devido rigor”, reivindica.

Quanto aos resíduos de pesticidas não autorizados no Brasil, e presentes em alimentos importados, ele faz um alerta: “As autoridades precisam estabelecer um sistema de monitoramento específico para esses alimentos e aplicar sanções aos países exportadores e também aos importadores que não seguirem a legislação brasileira.”

Mesmo com essas ressalvas, Albuquerque destaca um aspecto positivo da vigilância sanitária brasileira. “Entendemos que o Brasil está relativamente bem servido em relação à legislação dedicada à sanidade; o que precisaria melhorar é a frequência, o rigor das fiscalizações e a severidade das sanções oriundas das mesmas”, sintetiza.

 

SEGURANÇA SANITÁRIA

Diretora da Oxya Agro e Biociências e diretora-presidente da Associação Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços em Defesa Agropecuária (Andagro), Regina Lúcia Sugayama informa que, além das preocupações citadas anteriormente, são necessários outros cuidados para garantir a segurança sanitária desses alimentos.

Regina conta que foi contratada uma empresa especialista em análise de risco de pragas (ARP), que levantou 132 organismos patógenos e exóticos ao Brasil, que podem ser transmitidos pelo fruto, e que estão presentes no sistema de produção de maçãs e de peras da China.

“Em relação às importações de maçãs e peras, do ponto de vista fitossanitário, o setor está preocupado pelo fato de existirem pelo menos 132 espécies de pragas (insetos, fungos, ácaros, procariontes, etc.) de importância quarentenária que ocorrem na China e não foram encontrados relatos de ocorrência no Brasil. Além disso, em alguma fase do seu ciclo de vida, estão associados ou são passíveis de serem transportados pelo fruto”, explica.

 

Diretora da Oxya, Regina Lúcia Sugayama foi contratada uma empresa especialista em análise de risco de pragas (ARP) que levantou 132 organismos patógenos e exóticos ao Brasil, que podem ser transmitidos pelo fruto, e que estão presentes no sistema de produção de maçãs e de peras da China. Foto: Divulgação
Diretora da Oxya, Regina Lúcia Sugayama foi contratada uma empresa especialista em análise de risco de pragas (ARP) que levantou 132 organismos patógenos e exóticos ao Brasil, que podem ser transmitidos pelo fruto, e que estão presentes no sistema de produção de maçãs e de peras da China.
Foto: Divulgação

Na opinião de Regina, algumas medidas precisam ser tomadas para minimizar esses problemas, caso as importações venham a acontecer. “A primeira medida, e que será realizada pelo Mapa, é a análise de risco de pragas para identificar os perigos e estabelecer os requisitos fitossanitários, ou seja, aquilo que a China deverá fazer para mitigar os riscos identificados e exportar com segurança para o Brasil”, explica a diretora da Oxya.

Dentre as medidas de proteção ela cita o tratamento quarentenário (para exportar mangas para os EUA, o Brasil é obrigado a fazer um tratamento hidrotérmico, caso os frutos sejam oriundos de pomares com população de elevada de mosca-das-frutas elevada) e alguma restrição quanto ao trânsito interno das frutas importadas. “Só deve autorizar a entrada da fruta chinesa longe das regiões de produção (o Brasil já faz isso, por exemplo, para produtos do Equador), além de realizar uma análise laboratorial antes de a fruta sair da China ou antes de entrar no Brasil”, sugere.

 

VIGILÂNCIA

“A segunda medida para evitar a entrada de pragas e doenças é a vigilância internacional, ou seja, o trabalho fundamental que os auditores fiscais do Mapa fazem em portos, aeroportos e postos de fronteiras internacionais, que consiste na inspeção das cargas e conferência documental para constatar se tudo o que foi acordado entre o Brasil e a China em termos de medidas fitossanitárias na ARP foi cumprido”, esclarece.

Conforme Regina, na inspeção, que é uma análise visual, o fiscal pode encontrar pragas ou indícios da presença de pragas que não foram detectadas durante o embarque da carga. “Caso isso ocorra, a carga pode ser impedida de ser internalizada”, observa a diretora da Oxya.

Mesmo com a adoção de todas essas medidas, Regina lembra que não adianta apenas ter ARP e vigilância, se na hora que em a praga for detectada não tiver um plano de contingência para ser colocado em operação imediatamente.

“O cancro-europeu, por exemplo, foi detectado pela primeira vez em 2002, em uma propriedade em Vacaria (RS), e o Mapa só reconheceu a presença da praga no Brasil mais de 10 anos depois e só agora está elaborando um plano de contingência. De que adianta, se agora 90% das propriedades em Vacaria, que é uma das principais cidades produtoras, já estão afetadas? Se não tivermos resposta rápida, vamos continuar perdendo a guerra contra as pragas”, alerta.

 

PRODUÇÃO

De 2010 a 2015, a média anual de produção de maçãs no Brasil alcançou 1,175 mil toneladas, e na maior parte deste período, de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o País esteve entre os dez maiores produtores mundiais.

“Neste período, nossa média anual de exportações foi de 67 mil toneladas. Além disso, por volta de 297 mil toneladas da fruta foram enviadas para a indústria de processamento (para a fabricação de sucos, desidratados, geleias, entre outros) não integrando, portanto, o mercado de frutas frescas”, comenta Albuquerque.

No período, a média anual de importações de maçãs frescas pelo Brasil foi de 86 mil toneladas; portanto, a média anual de 2010 a 2015 foi de 811 mil t (maçã nacional) + 86 mil toneladas (maçã importada), totalizando 897 mil toneladas.

“Cerca de 90% do mercado brasileiro é abastecido pela produção nacional; somos quase autossuficientes”, ressalta Albuquerque, lembrando que a maior participação da maçã importada foi registrada em 2014, e não chegou à 13%, mas em 2015 já retrocedeu aos patamares de 8%. “A presença da maçã importada no Brasil representa uma fração determinada sempre pelo tamanho da safra brasileira e pelos aspectos de câmbio”, arremata o diretor da ABPM.

 

DESTAQUE

De acordo com Regina, a produção da maçã no Brasil ganhou destaque nos últimos 20 anos, com o reforço da pesquisa e do financiamento de estudos por parte do governo e de empresas privadas.

“Dentre as frutas que o Brasil exporta, a maçã é que tem maior alcance internacional chegando a 44 países no mundo. Estima-se que 5% da produção da fruta produzida no Brasil é exportada”, calcula. “Vale lembrar que o Brasil, que tem tradição de frutas tropicais, está ocupando um nicho mundial importante, que é o de frutas subtropicais e temperadas.”

Segundo Albuquerque, no fim da década de 70, nove em cada dez maçãs eram importadas e comercializadas a preços altos. Hoje, essa relação mudou, ou seja, nove em dez maçãs são nacionais e encontradas a preços acessíveis no mercado. “A maçã é a terceira fruta mais consumida no Brasil, atrás somente da laranja e da banana”, relata.

 

CADEIA PRODUTIVA

A principal preocupação da cadeia produtiva da maçã é em relação à economia dos estados do Sul, grandes produtores da fruta no País. Somente Santa Catarina responde pela metade da safra brasileira de maçã e 75% dos produtores do País.

Segundo a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc), cerca de 1.700 produtores colhem 650 mil toneladas por ano, movimentando mais de R$ 2,3 bilhões de reais e sustentando 40 mil empregos durante a colheita.

 

Por equipe SNA/SP

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